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Uma Exposição de Hebreus 13:20-21, por A. W. Pink

[Capítulo 3 do livro A Guide to Fervent Prayer • Editado]

 

“Ora, o Deus de paz, que pelo sangue da aliança eterna tornou a trazer dos mortos a nosso Senhor Jesus Cristo, grande pastor das ovelhas, vos aperfeiçoe em toda a boa obra, para fazerdes a sua vontade, operando em vós o que perante ele é agradável por Cristo Jesus, ao qual seja glória para todo o sempre. Amém.” (Hebreus 13:20-21) 

 

“Ora, o Deus de paz… vos aperfeiçoe em toda a boa obra, para fazerdes a sua vontade, operando em vós o que perante ele é agradável por Cristo Jesus”. Como indicado anteriormente, existe uma ligação muito estreita entre esse versículo e o anterior. Aqui temos a petição que o apóstolo ofereceu, em nome dos santos Hebreus, ao passo que o conteúdo do versículo anterior deve ser considerado como o argumento sobre o qual ele baseou seu pedido. Exatamente quão apropriado, poderoso e comovente fundamento era, prontamente será visto. O apelo é feito ao “Deus da paz”. Como Aquele que estava reconciliado com o Seu povo, Ele é suplicado para conceder esta bênção (cf. Romanos 5:10). Além disso, uma vez que Deus havia trazido novamente nosso Senhor Jesus dentre os mortos, este era um fundamento muito adequado sobre o qual Ele vivificaria os Seus eleitos espiritualmente mortos, por meio da regeneração, os resgataria quando eles vagueavam, e completaria a Sua obra da graça neles. Foi na qualidade de “o grande Pastor das ovelhas” que Nosso Senhor Jesus foi ressuscitado por Seu gracioso Pai da prisão da sepultura, a fim de que Ele seja capaz, como Alguém que vive para sempre, de cuidar do rebanho. O nosso grande Pastor está atualmente suprindo todas as necessidades de cada uma de Suas ovelhas por meio de Sua intercessão em nosso favor (Romanos 8:34; Hebreus 7:25). Por este meio eficaz, Ele agora está dispensando dons aos homens, especialmente aqueles dons que promovem a salvação de pecadores como nós (Efésios 4:8). Além disso, a mesma Aliança eterna que prometeu a ressurreição de Cristo, também garantiu a glorificação do Seu povo. Assim, o apóstolo invoca a Deus Pai, para aperfeiçoá-los de acordo com esse compromisso.

 

Uma Oração por Santidade e Fecundidade

 

“Ora, o Deus de paz… vos aperfeiçoe em toda a boa obra, para fazerdes a sua vontade”. Substancialmente, este pedido é por santificação prática e frutificação do povo de Deus. Enquanto a Aliança eterna foi adequadamente denominada “pacto da redenção”, devemos cuidadosamente ter em mente que Ele foi designado para proteger a santidade de Seus beneficiários. Fazemos bem em refletir sobre o clamor profético que fez Zacarias, cheio do Espirito Santo, que o “Bendito o Senhor Deus de Israel… [deveria] lembrar-se da sua santa aliança… De conceder-nos que, libertados da mão de nossos inimigos [espirituais], o serviríamos sem temor [servil], em santidade e justiça perante ele, todos os dias da nossa vida” (Lucas 1:68, 72, 74-75). E, embora isso tenha também sido apropriadamente designado “aliança da graça”, ainda assim nós também devemos lembrar que o apóstolo Paulo disse: “Porque a graça salvadora de Deus se há manifestado a todos os homens [Gentios, bem como aos Judeus], ensinando-nos que, renunciando à impiedade e às concupiscências mundanas, vivamos neste presente século sóbria, e justa, e piamente, aguardando a bem-aventurada esperança…” (Tito 2:11-13). O grande objetivo da Aliança eterna, como de todas as obras Divinas, era a glória de Deus e o bem de Seu povo. Isso foi designado não apenas como uma demonstração da generosidade Divina, mas também como para proteger e promover as reivindicações da santidade Divina. Deus não entra naquele pacto com Cristo, a fim de anular a responsabilidade humana, nem o Filho cumpre os seus termos, de modo a tornar desnecessária uma vida de obediência para os Seus remidos.

 

Cristo concordou não apenas em propiciar a Deus, mas a regenerar os Seus eleitos. Cristo se comprometeu não somente a atender todas as exigências da Lei em lugar deles, mas também a escrevê-la no coração deles e entronizá-la em suas afeições. Cristo comprometeu-se não apenas para tirar o pecado de diante de Deus, mas em torná-lo odioso e abominável aos Seus santos. Antes da fundação do mundo, Cristo se comprometeu não somente a satisfazer as exigências da justiça Divina, mas a santificar a Sua semente, enviando o Seu Espírito em suas almas para adequá-las à Sua imagem e incliná-las a seguir o exemplo que Ele os deixaria. Tem sido pouquíssimo insistido, nos últimos tempos, por aqueles que têm escrito ou pregado sobre o Pacto da Graça, que Cristo engajou-se não somente pela dívida de Seu povo, mas pelo dever deles também; que Ele faria uma aquisição da graça para eles, incluindo uma provisão completa para dar-lhes um novo coração e um novo espírito, para conduzi-los a conhecer o Senhor, para colocar Seu temor em seus corações e para torná-los obedientes à Sua vontade. Ele também se envolveu com a segurança deles, a saber, que, se eles abandonassem a Sua Lei e não andassem em Seus juízos, Ele visitaria as suas transgressões com a vara (Salmos 89:30-36); que se eles se desviassem e se afastassem dEle, Ele certamente os restauraria.

 

Paulo Volta à Profecia Messiânica em Oração

 

“Vos aperfeiçoe… para fazerdes a sua vontade”. Foi com o conteúdo da Aliança em seus olhos que o apóstolo elevou esta petição. Nos capítulos anteriores foi demonstrado que a profecia do Antigo Testamento apresenta o Messias prometido como o Fiador de uma aliança de paz e como o “Pastor” de Seu povo. Resta agora ser demonstrado que Ele estava ali retratado como um pastor que aperfeiçoaria as Suas ovelhas em santidade e boas obras. “E meu servo Davi será rei sobre eles, e todos eles terão um só pastor” (Ezequiel 37:24). Aqui o SENHOR anuncia que aquele Messias, a grandiosa semente de Davi, deve, em dias vindouros unificar o Israel de Deus como seu Rei e os regerá, a todos e sem rival. No mesmo versículo Ele declara ainda: “e andarão nos meus juízos e guardarão os meus estatutos, e os observarão”. Assim, depois de ter confessado a Deus como “o Deus da paz”, que libertou o Nosso Senhor Jesus do domínio da morte “através do sangue da eterna aliança”, Paulo faz solicitação que Ele opere em Suas ovelhas “o que perante ele é agradável por Cristo Jesus”. Pois, ainda que Deus prometeu fazer isso, Ele declara: “Ainda por isso serei solicitado pela casa de Israel” (Ezequiel 36:37). É sempre o dever sagrado do povo da aliança de Deus orar pelo cumprimento de Suas promessas (como testemunham as várias petições da Oração do Senhor). Vemos, então, que esta oração abrangente, ditada pelo Espírito, não é apenas um epítome do conteúdo de toda esta epístola, mas também um resumo das profecias Messiânicas.

 

A Fé em um Deus Reconciliado Produz Desejos por Sua Glória

 

“Vos aperfeiçoe em toda a boa obra, para fazerdes a Sua vontade”. Tal petição como essa pode ser corretamente oferecida enquanto alguém contempla a Deus como “o Deus de paz”. A fé deve considerá-lO primeiro como reconciliado conosco antes que haja qualquer verdadeiro desejo de glorificá-lO Enquanto houver algum horror sensível ao pensamento de Deus, qualquer temor servil produzido pela menção de Seu nome, não podemos servi-lO, nem fazer o que é agradável aos Seus olhos. “Sem fé é impossível agradar a Deus” (Hebreus 11:6), e a fé é completamente oposta ao terror. Precisamos primeiro ter certeza de que Deus não é um inimigo, mas nosso Amigo, antes que a gratidão de amor possam nos levar a correr no caminho de Seus mandamentos. Essa garantia só pode vir até nós ao percebermos que Cristo retirou os nossos pecados e satisfez cada reivindicação da lei de Deus contra nós. “Sendo, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo” (Romanos 5:1). Cristo fez a paz perfeita e eterna “pelo sangue da sua cruz” (Colossenses 1:20), em consequência disso, Deus fez com aqueles que se rendem ao jugo de Cristo e confiança em Seu sacrifício uma “aliança eterna, que em tudo será bem ordenado e guardado” (2 Samuel 23:5). Isso deve ser apreendido pela fé antes que haja uma busca confiante dEle, ou de graça necessária para buscá-lO.

 

De outro ângulo, podemos perceber a adequação desta petição ser dirigida ao “Deus da paz”, para que Ele agora nos aperfeiçoe em toda boa obra para fazer a Sua vontade. Pois, fazer a vontade de Deus é mui essencial para o nosso deleite de Sua paz, de uma forma prática. “Muita paz têm os que amam a tua lei” (Salmos 119:165), pois os caminhos de Sabedoria “são caminhos de delícias, e todas as suas veredas de paz” (Provérbios 3:17). Por isso, é absolutamente inútil esperar tranquilidade de coração, se abandonarmos os caminhos da sabedoria por aqueles de autossatisfação. Certamente, não pode haver paz de consciência enquanto qualquer pecado conhecido é entretido por nós. O caminho para a paz é o caminho da santidade. “E a todos quantos andarem conforme esta regra, paz e misericórdia sobre eles…” (Gálatas 6:16). A não ser que nós realmente resolvamos e nos esforcemos para fazer aquelas coisas que são agradáveis aos olhos de Deus, haverá um estado de turbulência e agitação dentro de nós, em vez de paz. Há um significado espiritual mais profundo do que normalmente é percebido naquele título “Príncipe da paz”, que pertence ao Filho encarnado. Ele poderia dizer: “eu faço sempre o que lhe agrada” (João 8:29), e, portanto, uma calma imperturbável era a Sua porção. Que ênfase havia ali naquelas palavras: “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou” (João 14:27)!

 

Paulo Ora pelo Fortalecimento dos Santos em Seus Deveres

 

“Vos aperfeiçoe em toda a boa obra, para fazerdes a Sua vontade”. Esta petição coloca diante de nós, por evidente implicação, o lado humano das coisas. Essas coisas pelas quais o apóstolo Paulo fez solicitação em nome dos santos estavam relacionadas com aqueles deveres que eles eram obrigados a realizar, mas para a cumprimento deles, a assistência Divina é imperativa. A Aliança eterna previu a entrada do pecado, e assim fez provisão não somente para retirá-lo, mas também para o estabelecimento da justiça eterna. Essa justiça é a perfeita obediência de Cristo, pela qual a Lei Divina foi honrada e engrandecida. Essa perfeita justiça de Cristo é imputada a todos os que creem, mas ninguém crê nEle salvificamente até que o Seu Espírito implante um princípio de justiça em suas almas (Efésios 4:24). E essa nova natureza ou princípio de justiça se evidencia pela realização de boas obras (Efésios 2:10). Não temos o direito de falar do Senhor Jesus como “O Senhor nossa justiça”, a menos que sejamos praticantes pessoais da justiça (1 João 2:29). A Aliança eterna, de modo algum deixa de lado a necessidade de obediência por parte daqueles que participam de seus benefícios, mas fornece motivos comoventes e poderosos para mover-nos a isso! A fé salvadora opera pelo amor (Gálatas 5:6), e visa agradar o seu Objeto.

 

Quanto mais as nossas orações são reguladas pelo ensinamento da Sagrada Escritura mais elas serão marcadas por essas duas qualidades: os preceitos Divinos serão transformados em petições; e o caráter e promessas Divinos serão usados como nossos argumentos. Quando o salmista, no curso de suas meditações sobre a Lei de Deus, declarou: “Tu ordenaste os teus mandamentos, para que diligentemente os observássemos”, ele era, ao mesmo tempo, consciente de seu fracasso e disse: “Quem dera que os meus caminhos fossem dirigidos a observar os teus mandamentos”! (Salmos 119:4-5). Mas Ele fez mais do que apenas lamentar os obstáculos do pecado interior; ele clamou: “Ensina-me, ó Senhor, o caminho dos teus estatutos… Faze-me andar na vereda dos teus mandamentos, porque nela tenho prazer” (Salmos 119:33-35). Assim também, quando buscou a confirmação de sua casa perante o Senhor, Davi se alegou na promessa Divina: “Agora, pois, ó Senhor Deus, esta palavra que falaste acerca de teu servo e acerca da sua casa, confirma-a para sempre, e faze como tens falado” (2 Samuel 7:25; veja também 1 Reis 8:25-26; 2 Crônicas 6:17). À medida que nos tornamos mais familiarizados com a Palavra de Deus e descobrimos os detalhes do elevado padrão de conduta que é posto diante de nós ali, devemos ser mais precisos e diligentes na busca de graça para realizar nossos diversos deveres; e à medida que nos familiarizamos melhor com o “Pai das misericórdias” (2 Coríntios 1:3) e Suas “grandíssimas e preciosas promessas” (2 Pedro 1:4), nós iremos mais confiantes a Deus buscando por estes suprimentos.

 

Uma Oração por Restauração do Vigor Espiritual

 

“Vos aperfeiçoe em toda a boa obra”. A palavra grega original aqui traduzida perfeitamente é katartiz?, que James Strong define como completar perfeitamente, ou seja, para reparar (literal ou figurativamente), ajustar (veja o Nº 2.675 no Dicionário Grego de Concordância Exaustiva, de Strong). Compare isso com a palavra teleio? usada em Hebreus 2:10; 10:1, 14; 11:40, que de acordo com Strong significa completar (literalmente), realizar, ou (figurativamente) consumar em caráter (veja o Nº 5.048 no Dicionário Grego de Strong). A palavra em nosso texto, katartiz?, é usada para descrever a atividade exercida por Tiago e João, filhos de Zebedeu, quando Cristo os chamou: eles estavam “consertando as redes” (Mateus 4:21). Em Gálatas 6:1, o apóstolo Paulo emprega esta palavra por meio de exortação: “Irmãos, se algum homem chegar a ser surpreendido nalguma ofensa, vós, que sois espirituais, encaminhai o tal com espírito de mansidão…”. Era, portanto, mais adequado que este termo fosse aplicado para o caso dos Cristãos Hebreus, que depois de crerem no Evangelho, se confrontaram com tal grande e prolongada oposição dos Judeus, de forma geral, que vacilaram e estavam em necessidade real de serem advertidos contra a apostasia (Hebreus 4:1; 6:11-12; 10:23, etc.). Como dito no início de nossa exposição, esta oração reúne não somente toda a instrução doutrinal, mas também as exortações dos capítulos anteriores. Os Hebreus haviam vacilado e falhado (Hebreus 12:12), e o apóstolo aqui ora por sua restauração. Os léxicos (como Liddell e Scott, p. 910) nos dizem que katartiz?, aqui traduzido “aperfeiçoe”, literalmente faz referência ao reajuste de um osso deslocado. E não é muitas vezes assim com o Cristão? Uma triste queda quebra a sua comunhão com Deus, e ninguém, senão a mão do Divino Médico pode reparar os danos causados. Assim, esta oração é adequada para todos nós, que Deus retifique cada capacidade de nosso ser para fazer a Sua vontade e nos corrija para o Seu serviço cada vez que necessitarmos disso.

Observe quão abrangente é esta oração: “Vos aperfeiçoe em toda a boa obra”. Ela inclui, como Gouge apontou, “todos os frutos de santidade em relação a Deus, e de justiça em relação ao homem”. Nenhuma reserva nos é permitida pela regra extensa que Deus colocou diante de nós, somos obrigados a amá-lO com todo o nosso ser, ser santificados em todo o nosso espírito, alma e corpo, e crescermos em Cristo em todas as coisas (Deuteronômio 6:5; Lucas 10:27; Efésios 4:15; 1 Tessalonicenses 5:23). Nada menos do que a perfeição em “toda boa obra” é o padrão pelo qual devemos almejar. A perfeição absoluta não é possível nesta vida, mas a perfeição da sinceridade é exigida de nós; um esforço honesto e verdadeiro empenho para agradar a Deus. A mortificação dos nossos desejos, a submissão a Deus sob tribulações, e o desempenho de obediência imparcial e universal são sempre o nosso dever sagrado. De nós mesmos somos totalmente incapazes de cumprir os nossos deveres, e, portanto, devemos orar continuamente pelo suprimento de graça, para que possamos realizá-las. Não apenas somos dependentes de Deus para o início de toda a boa obra, mas também para a continuidade e progresso da mesma. Imitemos a Paulo, que disse: “Não que já a tenha alcançado, ou que seja perfeito; mas prossigo para alcançar aquilo para o que fui também preso por Cristo Jesus. Irmãos, quanto a mim, não julgo que o haja alcançado; mas uma coisa faço, e é que, esquecendo-me das coisas que atrás ficam, e avançando para as que estão diante de mim, Prossigo para o alvo, pelo prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus” (Filipenses 3:12-14).

 

O Conhecimento Divinamente Revelado Requer Obediência

 

“Vos aperfeiçoe em toda a boa obra, para fazerdes a sua vontade”. Que Ele, que já vos familiarizou totalmente com a Sua mente, agora efetivamente vos incline para a realização da mesma, mesmo a uma continuação de atenção solícita aos seus deveres como povo redimido, até o fim. Não é suficiente que saibamos a Sua vontade; devemos fazê-la (Lucas 6:46; João 13:17), e quanto mais a fizermos, melhor a entenderemos (João 7:17) e provaremos a excelência dela (Romanos 12:2). Essa vontade de Deus que devemos nos exercitar para realizar não é a vontade secreta de Deus, mas a Sua vontade revelada ou perceptiva, ou seja, aquelas leis e estatutos, nos quais Deus requer nossa completa obediência (Deuteronômio 29:29). A vontade revelada de Deus deve ser a única regra de nossas ações. Há muitas coisas feitas por Cristãos professos que, apesar de admiradas por eles e aplaudidas pelos seus companheiros, não são nada mais do que “culto da vontade”, e uma sequência de “preceitos e doutrinas dos homens” (Colossenses 2:20-23). Os Judeus acrescentaram suas próprias tradições à Lei Divina, instituindo jejuns e festas de sua própria invenção. Os iludidos papistas, com suas austeridades corporais, devoções idólatras e recompensas empobrecidas, são culpados da mesma coisa. Nem estão alguns Protestantes, com suas privações autoconcedidas e exercícios supersticiosos, livres desse mal Romanista.

“Operando em vós o que perante ele é agradável por Cristo Jesus”. Estas palavras confirmam exatamente o que foi dito acima: somente é aceitável a Deus, o que está em conformidade com a regra de que Ele nos deu. As palavras “perante ele” mostram que todas as nossas ações estão sob Sua atenção imediata e são pesadas por Ele. Ao comparar outras Escrituras, descobrimos que somente são aprazíveis a Ele as obras que Ele nos ordenou realizar e que são realizadas em Seu temor (Hebreus 12:28). Ele aceitará apenas aquelas que procedem do amor (2 Coríntios 5:14), e que são feitas com um olhar unicamente fixado em glorificá-lO (1 Coríntios 10:31). Nosso objetivo constante e esforço diligente não deve ser nada menos do que isto: “Para que possais [nós] andar dignamente diante do Senhor, agradando-lhe em tudo, frutificando em toda a boa obra” (Colossenses 1:10). No entanto, devemos receber capacitação Divina, a fim de fazer isso. Que duro golpe para a autossuficiência e glória do eu é esta pequena frase, “operando em vós”! Mesmo após a regeneração somos totalmente dependentes de Deus. Não obstante a vida, luz e liberdade que recebemos dEle, não temos força de nós mesmos para fazer o que Ele exige. Cada um tem de reconhecer, “Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum; e com efeito o querer está em mim, mas não consigo realizar o bem” (Romanos 7:18).

 

Aqui Há uma Verdade que Abate o Orgulho

 

Aqui, de fato, está uma verdade humilhante, mas a verdade é que os Cristãos são, em si mesmos, incapazes de cumprir o seu dever. Embora o amor de Deus tenha sido derramado em seus corações e um princípio de santidade (ou nova natureza) tenha sido comunicado a eles, ainda assim eles são incapazes de realizar o bem que ardentemente desejam fazer. Eles não somente ainda são mui ignorantes sobre vários dos requisitos da vontade revelada de Deus, mas o pecado que habita sempre se opõe e procura inclinar seus corações em direção contrária. Assim, é imperativo que diariamente busquemos a Deus por novos suprimentos de graça. Embora assegurados de que Deus certamente completará a Sua boa obra em nós (Filipenses 1:6), isso não torna desnecessário o nosso clamor a Ele “ao Deus que por mim [nós] tudo executa” (Salmos 57:2). O privilégio da oração também não nos dispensa da obrigação da obediência. Ao contrário, na oração devemos pedir-Lhe que nos vivifique para o cumprimento daqueles deveres que Ele requer. A bênção de acesso a Deus não é designada para nos dispensar do uso regular e diligente de todos os meios que Deus designou para a nossa santificação prática, mas se destina a suprir para nossa busca da bênção Divina sobre o uso de todos os meios de graça. Nosso dever é este: pedir a Deus para operar em nós “tanto o querer como o realizar, segundo a sua boa vontade” (Filipenses 2:13); para evitar que extingamos o Seu Espírito por indolência e desobediência, especialmente depois de ter orado por Suas doces influências (1 Tessalonicenses 5:19); e para usarmos a graça que Ele já nos concedeu.

“Operando em vós o que perante ele é agradável por Cristo Jesus”. Há uma dupla referência aqui: (1) a obra de Deus em nós; e (2) a Sua aceitação de nossas obras. É em virtude da mediação do Salvador que Deus opera; não há comunicação de graça para nós a partir do Deus da paz, a não ser por meio de e através de nosso Redentor. Tudo o que Deus faz por nós, é por amor de Cristo. Cada operação graciosa do Espírito Santo em nós é o fruto de uma obra meritório de Cristo, pois Ele adquiriu o Espírito para nós (Efésios 1:13-14; Tito 3:5-6) e atualmente está nos enviando o Espírito (João 15:26). Todas as bênçãos espirituais derramadas sobre nós são em consequência da intercessão de Cristo por nós. Cristo não é apenas a nossa vida (Colossenses 3:4) e nossa justiça (Jeremias 23:6), mas também a nossa força (Isaías 45:24). “E da sua plenitude todos nós recebemos, e graça sobre graça” (João 1:16). Os membros do Seu Corpo místico são completamente dependentes de sua cabeça (Efésios 4:15-16). Nossa frutificação vem por meio de termos comunhão com Cristo, pela nossa permanência nEle (João 15:5). É muito importante que tenhamos uma compreensão clara sobre esta verdade, se desejarmos dar ao Senhor Jesus o lugar que Lhe é devido em nossos pensamentos e afetos. A sabedoria de Deus tem coisas tão planejadas que cada pessoa da Trindade é exaltada na estima de Seu povo: o Pai como a fonte da graça, o Filho em Seu ofício de mediação como o canal através do qual toda a graça flui para nós, e o Espírito Santo, como o doador real disso.

 

Infinitos Méritos de Cristo, o Fundamento de Aceitação por Deus de Nossas Obras e Orações

 

Mas, essas palavras “por Jesus Cristo”, também têm uma conexão mais imediata com a frase “o que perante ele é agradável”. Embora nossas obras sejam boas e sejam feitas em nós por Deus, elas ainda são imperfeitas, uma vez que são maculadas pelos instrumentos pelos quais são feitas, assim como a luz mais pura é escurecida pela sombra nublada ou empoeirada da lâmpada através da qual ela brilha. No entanto, apesar de nossas obras defeituosas, elas são aceitáveis a Deus, quando feitas em nome de Seu Filho. Nossos melhores desempenhos são defeituosos e ficam aquém da excelência daqueles requisitos que a santidade de Deus demanda, mas os seus defeitos são cobertos pelos méritos de Cristo. Nossas orações, também, são aceitáveis a Deus somente porque nosso grande Sumo Sacerdote adiciona a elas “muito incenso” e, em seguida, oferece-lhes sobre o altar de ouro diante do trono (Apocalipse 8:3). Nossos sacrifícios espirituais são “aceitáveis a Deus por Jesus Cristo” (1 Pedro 2:5). Deus somente pode ser “glorificado por meio de Jesus Cristo” (1 Pedro 4:11). Nós devemos, então, ao Mediador, não somente o perdão de nossos pecados e a santificação de nossas pessoas, mas também a aceitação de nossos imperfeitos adoração e serviço a Deus. Como Spurgeon disse apropriadamente em seus comentários sobre esta frase: “Que nadas e ninguéns nós somos! Nossa bondade não é em nada nossa”.

 

Uma Doxologia

 

“Ao qual seja glória para todo o sempre. Amém”. O apóstolo olhava para a glória de Deus. E como devemos glorificá-lo? Devemos glorificá-lO por uma caminhada obediente, fazendo Sua vontade, realizando as coisas que são agradáveis aos Seus olhos, e adorando-O. A construção de toda a sentença nos permite considerar esta atribuição de louvor como sendo oferecida, tanto ao “Deus da paz”, a quem a oração é dirigida, ou ao “Grande Pastor das ovelhas”, que é o antecedente mais próximo do pronome. Desde que a gramática permite a isso e a analogia da fé nos ensina a incluir tanto o Pai e o Filho em nossa adoração, então, que a glória seja atribuída a ambos. Que Deus seja louvado, pois Ele agora é “o Deus de paz”, porque Ele tornou a trazer dos mortos a nosso Senhor Jesus, porque Ele é fiel aos Seus compromissos na Aliança eterna, porque todos os suprimentos de graça são dEle, e por Ele aceita nossa pobre obediência “por meio de Jesus Cristo”. Igualmente adoremos o Mediador: porque Ele é “nosso Senhor Jesus”, que nos amou e Se entregou por nós; porque Ele é o “Grande Pastor das ovelhas”, cuidando e ministrando ao Seu rebanho; porque Ele ratificou a aliança com o Seu precioso sangue; e porque é por Seus méritos e intercessão que as nossas pessoas e os serviços são feitos “agradáveis” ao Altíssimo. “Amém”. Que seja assim! Faça com que os louvores ao Deus redentor e propício sejam entoados por toda a eternidade!