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Uma Exposição do Salmo 22, por C. H. Spurgeon

Salmo 22. Este Salmo é dirigido, “Para o músico-mor sobre Aijelete-Hás-Saar” — ou, como a margem apresenta, “Posterior ao da manhã” — “Salmo de Davi”. Ele começa nas profundezas da tristeza do Mestre, quando este grande e amargo clamor escapou de seus lábios:

1a. Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste? Cada palavra é enfática. “Deus Meu, Deus Meu, por que Me desamparaste?”, “Todos os outros podem abandonar-Me, e Eu não preciso estar perturbado com a ausência deles, mas “por que Me abandonaste?”, “Por que Me desamparaste? “Eu entendo porque Tu Me abates, porque Eu sou o Pastor predestinado para ser ferido pelo rebanho, mas “por que Me desamparaste?”, “Por que Tu Me desamparaste? Seu Unigênito, Seu Filho Bem-Amado, ‘por que Tu Me desamparaste?’”.

1b. Por que te alongas do meu auxílio e das palavras do meu bramido? “Por que eu não inspiro o Seu amor, nenhum gozo de Tua Presença, nenhuns sussurros de Seu coração? Eu fiquei sozinho, totalmente deixado, abandonado na cruz, deixado em Minha mais terrível necessidade”. Os filhos adotados de Deus não costumam falar assim. Tal lamento não tem muitas vezes vindo mesmo dos mártires da fé, pois, como regra geral, eles tiveram a Deus com eles na hora da mais profunda agonia. Mas ali estava Aquele que era muito maior do que eles, que teve que suportar o sofrimento ainda de onde foram dispensados, o Único perfeito foi abandonado por Deus! Você sabe que era porque Ele estava em nosso lugar que o Salvador teve essa preeminência no sofrimento e tristeza.

2. Deus meu, eu clamo de dia, e tu não me ouves; de noite, e não tenho sossego. Pense sobre que fardo foi sobre a alma do Bem-Amado oração não respondida. Você já sentiu um fardo assim? Então, você não está sozinho nessa experiência, pois Aquele que é infinitamente melhor do que você considerou sobre suas orações diárias e suas orações noturnas que, momentaneamente, não foram atendidas.

3. Porém tu és santo, tu que habitas entre os louvores de Israel. Siga o exemplo do seu Senhor, pobre alma perturbada. Não veja nenhuma falha em seu Deus, embora Ele te desampare. Chame-O santo, mesmo que Ele deva deixá-lo. E quando Ele parecer não ouvir suas orações, ainda assim não esqueça dos Seus louvores.

4-6. Em ti confiaram nossos pais; confiaram, e tu os livraste. A ti clamaram e escaparam; em ti confiaram, e não foram confundidos. Mas eu sou verme, e não homem, opróbrio dos homens e desprezado do povo. Pense em nosso Senhor Divino assumindo assim o lugar mais baixo, tornando-se, por assim dizer, algo menos do que homem, apenas este pequeno verme carmesim, que tem apenas uma vida feita de sangue. Cristo compara-se a ele enquanto diz, “Eu sou um verme, e não homem”.

7-8. Todos os que me veem zombam de mim, estendem os lábios e meneiam a cabeça, dizendo: Confiou no Senhor, que o livre; livre-o, pois nele tem prazer. Oh, estas foram palavras cruéis e cortantes! Como uma navalha afiada, eles cortaram o coração de nosso Divino Mestre, enquanto Ele ouvia os seus inimigos exultantes mesmo sobre sua fé, como se tivesse chegado a nada, pois agora Jeová, Ele mesmo, O havia abandonado e O deixou morrer sozinho sobre o madeiro!

9-10. Mas tu és o que me tiraste do ventre; fizeste-me confiar, estando aos seios de minha mãe. Sobre ti fui lançado desde a madre; tu és o meu Deus desde o ventre de minha mãe. Às vezes, também podemos derivar grande conforto dessa verdade de Deus, a qual o nosso Salvador se refere aqui. Quando não podemos nos ajudar no menor grau, o Senhor preservou-nos, logo, não será que Ele mais uma vez nos ajudará quando estamos no nosso pior? Você, que chegou à sua segunda infância pode refletir com gratidão e esperança sobre a maneira como Deus cuidou de você em sua primeira infância. Naquela ocasião, você certamente era totalmente dependente dEle, mas você se saiu bem e assim você se sairá se cada sentido lhe faltar, se o poder do movimento lhe for tirado, e o poder da visão, e o poder da audição, contudo o Senhor, Quem te abençoou, quando você havia acabado de nascer, ainda preservará você até o fim. Você se lembra de como o Senhor estabelece esta verdade em Isaías 46:4 “E até à velhice eu serei o mesmo, e ainda até às cãs eu vos carregarei; eu vos fiz, e eu vos levarei, e eu vos trarei, e vos livrarei [Isaías 46:4]”. Nosso Salvador, tendo Se consolado, assim, prostrou-se em oração novamente.

11-12. Não te alongues de mim, pois a angústia está perto, e não há quem ajude. Muitos touros me cercaram; fortes touros de Basã me rodearam. Estes eram os Fariseus, os príncipes dos sacerdotes e os fortes soldados romanos que cercaram nosso Salvador quando Ele estava na cruz.

13-14. Abriram contra mim suas bocas, como um leão que despedaça e que ruge. Como água me derramei, e todos os meus ossos se desconjuntaram; o meu coração é como cera, derreteu-se no meio das minhas entranhas. Você não pode ver o seu Salvador pendurado no madeiro maldito, cada partícula dEle, por assim dizer, soltou de Sua Pessoa pela febre alta em todo o seu Ser e a angústia e depressão profunda do Seu espírito?

15a. A minha força se secou como um caco, e a língua se me pega ao paladar. Tal era a intensidade de Sua angústia que a febre dentro dEle transformou sua boca em um forno e Sua língua estava tão seca que mal podia se mexer.

15b. e me puseste no pó da morte. Como se todo o Seu corpo estivesse preparado para voltar aos seus elementos primários. Ele sente em Si mesmo a sentença pronunciada sobre o primeiro Adão, “Tu és pó, e ao pó tornarás”.

16a. Pois me rodearam cães; o ajuntamento de malfeitores me cercou. Estas foram as pessoas comuns, a plebe, a multidão que se aglomerava ao redor, latindo para Ele como uma matilha de cães famintos.

16b. traspassaram-me as mãos e os pés. Esta pequena frase mostra que este Salmo deve estar relacionado com o Senhor Jesus. Verdadeiramente Davi O vê na visão! Isso aconteceu não a Davi, o ter suas mãos e pés perfurados, mas esta foi a porção do Mestre e Senhor de Davi. Ele poderia, de fato, dizer: “Traspassaram minhas mãos e meus pés”.

17. Poderia contar todos os meus ossos; eles veem e me contemplam. Ele está abatido pelo Seu jejum e toda a agonia que Ele suportou. E seus ossos parecem romper Sua pele devido à flagelação cruel a que tinha sido submetido.

18-19. Repartem entre si as minhas vestes, e lançam sortes sobre a minha roupa. Mas tu, Senhor, não te alongues de mim. Força minha, apressa-te em socorrer-me. Ou seja, El — nome que deu a Deus no primeiro verso — “Ó Minha Única Força”.

19-21. Mas tu, Senhor, não te alongues de mim. Força minha, apressa-te em socorrer-me. Livra a minha alma da espada, e a minha predileta da força do cão. Salva-me da boca do leão; sim, ouviste-me, das pontas dos bois selvagens. Já reparou no feixe de luz brilhando através da escuridão: “Ouviste-Me”? Talvez tenha sido nesse momento que o sol novamente resplandeceu, em qualquer caso, é claro que a luz perdida havia retornado ao nosso Senhor sofredor, pois o resto deste solilóquio Divino está cheio de conforto e confiança.

22a. Então declararei o teu nome aos meus irmãos. Seu primeiro pensamento, mesmo em Sua agonia na cruz, estava sobre eles. E Ele parecia dizer: “Quando Eu tiver ressuscitado dos mortos, vou dizer-lhes tudo sobre este tempo de provação. E através dos séculos vindouros, direi ao Meu povo como Tu me ajudaste — o maior de todos os sofredores — e isto vai ajudá-los, também. Permaneci por um tempo, e ainda assim eu não estava, finalmente, abandonado. Eu chorei, ‘Lama sabactâni’, e ainda assim Eu triunfei, mesmo assim, e assim será com eles. Eles devem fazer o que Eu fiz, confiar e vencer”.

22b. louvar-te-ei no meio da congregação. E você sabe que Ele o fez. Ele ficou no meio do Seu povo e lhes disse o que Deus tinha feito! E, espiritualmente, Ele está no meio de nós, neste momento, e Ele leva nossos cânticos de louvor ao Senhor.

23-24. Vós, que temeis ao Senhor, louvai-o; todos vós, semente de Jacó, glorificai-o; e temei-o todos vós, semente de Israel. Porque não desprezou nem abominou a aflição do aflito, nem escondeu dele o seu rosto; antes, quando ele clamou, o ouviu. Que mudança de nota! Se os homens pudessem nos ouvir falar quando estamos nas profundezas da tristeza, eles poderiam concluir que Deus nos havia abandonado. Mas quando saímos, mais uma vez, quão rapidamente comemos nossas palavras e em quanto tempo nós começamos a contar a bondade do Senhor! Então, nós nos levantamos com alegre força, “Dai graças ao Senhor, porque Ele é bom, porque a sua misericórdia dura para sempre”.

25. O meu louvor será de ti na grande congregação; pagarei os meus votos perante os que o temem. Cristo ainda louva a Deus na grande congregação. No meu caminho para o serviço desta noite, visitei para ver um dos nossos queridos irmãos, que está muito doente, e eu fui muito refrescado com uma doce coisa que ele disse: “Quando todos chegarmos ao Céu, vamos nos sentir muito em casa, pois, saiba, senhor, temos adorado em uma grande congregação por todos estes anos”. E assim faremos. Há algo mais emocionante e refrescante em ir com a multidão para guardar o santo dia, quantos mais, melhor! Mas qual será a alegria no Céu, onde o número dos redimidos não pode ser contado, e todos devem estar continuamente louvando a Deus? Esta foi uma das alegrias que foram colocadas diante de Cristo, pela qual “Ele suportou a cruz, desprezando a vergonha”.

26a. Os mansos comerão e se fartarão. Mesmo no tempo de Sua grande agonia, nosso Senhor estava pensando em vocês às ocultas, Seus pequeninos que pensam de si mesmos que nada valem. Cristo diz que Ele foi encontrar pão para vocês, porque Ele nos dá a Sua carne a comer, essa carne que é carne, de fato.

26b. Louvarão ao Senhor os que o buscam; o vosso coração viverá eternamente. Ele morreu para que todos os que confiam nEle vivessem para sempre. Oh, quão docemente Ele morre, com o pensamento de sua bem-aventurança eterna em Sua mente!

27. Todos os limites da terra se lembrarão, e se converterão ao Senhor; e todas as famílias das nações adorarão perante a tua face. Ele vê o resultado de Sua morte. Ele contempla o fruto das dores de Sua alma e Seu coração se alegra dentro dEle!

28-30. Porque o reino é do Senhor, e ele domina entre as nações. Todos os que na terra são gordos comerão e adorarão, e todos os que descem ao pó se prostrarão perante ele; e nenhum poderá reter viva a sua alma. Uma semente o servirá; será declarada ao Senhor a cada geração. Chegarão e anunciarão a sua justiça ao povo que nascer, porquanto ele o fez. O Salmo realmente termina com quase o último grito de nosso Senhor na cruz: “Está consumado”. Assim, todo o Salmo é uma janela através da qual podemos ver o mais íntimo do coração de Cristo, quando Ele estava sendo moído na cruz.