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Um Guia para o Estudo Bíblico

“Procura apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade.”
(2 Timóteo 2:15)

Introdução

Para um verdadeiro filho de Deus, nada é mais precioso do que o Livro Inspirado. Ele é como uma mina com todo tipo de metais e pedras preciosas, revestidos de ouro e de prata. Aquilo que é mais necessário para os propósitos comuns da vida encontram-se na superfície. Essas são as verdades simples do Evangelho, que são essenciais para a salvação. Mas abaixo delas estão o ferro, o latão e o cobre — as verdades sólidas, as doutrinas e os princípios práticos que forçam os poderes da mente a se desenvolverem, mas que dão força e consistência ao caráter cristão. Além disso, porém, há um tesouro inesgotável de pedras preciosas e a observação de cada uma delas conduz à descoberta de novas joias de brilho inigualável e de beleza surpreendente.

A Bíblia é a escritura das esperanças do cristão, o título de sua herança. Ele é um viajante numa terra desconhecida? Esse livro contém a descrição do país ao qual ele está destinado, e serve com um mapa do caminho, no qual todas as intersecções e as rotas estão identificadas. Ele é um marinheiro no turbulento oceano da vida? Esse livro é o seu mapa e a sua bússola. Aqui ele encontra todos os bancos de areia e recifes distintamente sinalizados, bem como monumentos posicionados em muitos lugares perigosos, nos quais outros naufragaram.

Portanto, vendo que temos tamanho tesouro em nossas mãos, não é motivo de surpresa que sejamos orientados a buscar as coisas preciosas que ele contém, ou que os cristãos amem meditar em suas páginas sagradas. Assim diz o salmista: “Lâmpada para os meus pés é tua palavra, e luz para o meu caminho” (Salmos 119:105). A Palavra de Deus é como uma lanterna que lança luz em nosso caminho para guiar os nossos passos enquanto caminhamos em meio às trevas da noite. O cristão sincero, portanto, examinará a Palavra de Deus para conhecer a sua vontade com mais entusiasmo do que ele procuraria por tesouros de ouro e prata escondidos. Ele resolverá aplicar-se de coração a esse trabalho. Depois de apresentar a lei, Moisés disse: “Aplicai o vosso coração a todas as palavras que hoje testifico entre vós” (Deuteronômio 32:46). Para que alguém guarde um determinado objeto em seu coração ele deve antes o amar e desejar, o que o leva a uma firme resolução para se esforçar para obter aquele objeto. Esse deve ser o sentimento que deve estar continuamente em nossos corações com relação ao conhecimento da vontade de Deus, tal como ele é revelado na Palavra dele. E, à medida em que obtemos esse conhecimento, devemos imitar o salmista, que disse: “Escondi a tua palavra no meu coração, para eu não pecar contra ti” (Salmos 119:11). O objetivo do salmista ao guardar a Palavra de Deus em seu coração era saber como guiar a sua conduta de modo a não pecar contra Deus. Assim também nós devemos guardar a Palavra de Deus em nossos corações e pela mesma razão. Devemos estudá-la como o guia para as nossas vidas. Sempre que abrirmos o livro abençoado, esta deve ser a pergunta do nosso coração: “Senhor, que queres que eu faça”.[1] Vamos nos aproximar da Palavra com esse espírito de obediência semelhante ao de uma criança, e assim não falharemos em aprender a vontade de Deus.

Mas quando tivermos aprendido na Palavra de Deus qual é o nosso dever, o próximo passo é colocá-lo em prática sem demora. Primeiramente, deve haver um desejo sincero em conhecer o dever atual, e em seguida, uma determinação firme e constante de cumpri-lo imediatamente. A pressão da obrigação repousa sobre o tempo presente; e, quando temos certeza de algo que devemos fazer naquele instante, a espera de um momento sequer é pecado.

Após essas considerações iniciais, eu proponho algumas instruções para a leitura e o estudo produtivos das Sagradas Escrituras.

I. Leia em um Lugar Tranquilo

Leia a Bíblia em seu quarto ou em circunstâncias que nas quais você está livre de interrupções, quer pela conversa de outras pessoas ou pela distração de outros objetos. Não tente preencher pequenos intervalos aleatórios de tempo com a leitura da Palavra de Deus. Deixe essas oportunidades para uma leitura mais leve. Ler as Escrituras é conversar com Deus, que fala conosco quando lemos sua Santa Palavra. O seu olhar onisciente sonda os nossos corações e ele sabe se estamos apenas praticando em um ritual vazio. Se lermos a sua Palavra tão descuidadamente a ponto de não entendermos o seu significado e não bebermos do seu espírito, nós tratamos a Deus com o desprezo que não gostaríamos de ser tratados por um amigo nosso. Portanto, jamais nos aproximemos da Palavra de Deus senão com sentimentos de reverência e santo temor.

II. Prepare o Seu Coração e a Sua Mente

Vá à Palavra de Deus após ter preparado o seu coração. Se fôssemos visitar alguém de grande importância, cujo favor e estima gostaríamos de obter, deveríamos ter cuidado para que cada detalhe a nosso respeito fosse ajustado da maneira mais apropriada. Que seja assim também com as nossas mentes quando vamos conversar com Deus. Eliminemos todos os pensamentos mundanos e nos esforcemos para garantir um estado de espírito manso, santo e terno, para que as verdades nas quais estamos meditando possam afetar apropriadamente os nossos corações.

III. Busque a Ajuda do Espírito Santo

Cristo prometeu aos seus discípulos que, quando o Espírito Santo viesse, Ele “os guiaria a toda a verdade” (João 16:13). Sem a influência iluminadora dele, não somos capazes de entender a Palavra de Deus. E sem as suas influências graciosas, não teremos a disposição para obedecê-la. Assim, temos abundantemente encorajamento para buscar a ajuda desse Instrutor divino. Cristo nos assegura que Deus está mais disposto a dar o seu Espírito Santo àqueles que lhe pedem, do que pais humanos estariam a dar coisas boas aos seus filhos (Mateus 7:11). Antes de abrir a Palavra de Deus, portanto, devemos orar para que ele nos mostre a verdade, os nossos deveres e para que ele incline os nossos corações para a obediência, e também para que, à medida em que avançamos, ele mantenha os nossos corações silenciosamente elevados a Deus com o mesmo objetivo.

IV. Leia Aplicando o Texto à sua Vida Pessoal

Sempre que você descobrir alguma verdade, pergunte que relação ela tem com o seu dever atual. Se ela estiver relacionada a interesses espirituais, compare-a com o estado do seu próprio coração. Se estiver relacionada ao espírito e à conduta dos cristãos, em seus relacionamentos uns com os outros ou com o mundo, compare-a à sua própria conduta. Se estiver ligada a algum dever objetivo, pergunte se você já o desempenhou. E, sempre que você se achar falho, empenhe-se em exercitar o arrependimento e a buscar o perdão por meio do sangue de Cristo, com a graça que o capacita a corrigir o que está errado.

V. Leia as Escrituras Regularmente

Uma medida diária de revigoramento é tão necessária para a alma quanto para o corpo. A Palavra de Deus é o pão da vida eterna, “o alimento da alma”. Alimente-se, então, da Palavra constantemente para que a sua alma não passe fome. Escolha, para esse propósito, aqueles momentos em que você estará menos sujeito a interrupções — quando você pode se recolher e se desligar do mundo, quando você é capaz de controlar melhor os poderes de sua mente. Não há um momento mais adequado e recomendado para isso do que o período da manhã, quando a mente está clara, fresca, despreocupada e pronta para ser influenciada. Também é apropriado consultar a Palavra de Deus no final do dia. Mas isso depende muito do estado do corpo. Se você estiver exausto e sem vigor depois das obrigações do dia, eu recomendaria utilizar somente o período da manhã. Contudo, de modo algum limite-se a esses momentos específicos. Sempre que a natureza da sua ocupação permitir que você se recolha por um intervalo de tempo suficiente, você pode beber à vontade dessa fonte inesgotável de água da vida.

VI. Estude as Escrituras de Maneira Sistemática

Se você ler aleatoriamente, um pouquinho aqui e um pouquinho ali, o seu entendimento da verdade divina será parcial e limitado. Esse método pode ser usado sem problemas para a leitura estritamente devocional, mas somente quando um outro período é separado para a busca de uma compreensão abrangente e acurada de toda a Bíblia. As Sagradas Escrituras são como um prato de comidas saborosas. Existe nela quase toda variedade de estilo e conteúdo. Tem história, biografia, textos argumentativos e didáticos, além de poesia. Embora esses vários tipos de textos estejam presentes em um vários de livros, escritos por autores diferentes em épocas diferentes sem que houvessem houvesse feito um acordo prévio, há uma unidade extraordinária e uma harmonia perfeita que permeiam toda a obra. Cada detalhe, desde o começo, aponta para o glorioso plano de redenção revelado no Evangelho. Ainda que, à primeira vista, possamos sentir a falta de um arranjo sistemático da verdade de Deus, uma dedicação cuidadosa ao estudo revelará a sabedoria divina na passagem em questão. Temos aqui os princípios do sistema de governo divino exibidos através de exemplos vivos, o que nos dá uma visão mais clara e uma impressão mais vívida deles do que poderíamos obter pelo estudo de um sistema abstrato. Ao estudar a bíblia de modo sistemático e integral, as seguintes sugestões podem ser úteis:

1. Observe o Contexto Mais Amplo

Mantenha diante de sua mente o propósito principal das Escrituras, que é convencer o homem da sua condição perdida e arruinada, tornar conhecido o caminho para a salvação e persuadi-lo a aceitá-la.

2. Busque Entender a Intenção do Autor

Faça do seu objetivo constante determinar qual é a intenção clara e óbvia do autor, porque essa é a mente do Espírito. Para auxiliá-lo nessa tarefa, considere os seguintes pontos:

(1.) Esforce-se para se familiarizar com as características do estilo de cada autor. Embora as Escrituras tenham sido ditadas pelo Espírito Santo, isso foi feito de modo que cada autor utilizou um estilo e uma maneira peculiares a ele mesmo. Isso não invalida a evidência de sua origem divina, mas demonstra a sabedoria do Espírito. Se toda a Bíblia tivesse sido escrita em um estilo uniforme, isso daria aos adversários um forte argumento contra a sua autenticidade. A falta dessa uniformidade produz uma evidência irrefutável de que a Bíblia não pode ter sido a obra de um único impostor. Além disso, uma a presença do mesmo estilo tornaria a leitura de um livro tão grande como a Bíblia entediante e desagradável, mas a rica variedade apresentada pelos vários autores desse livro bendito auxilia a nossa fraqueza e torna a sua leitura agradável e prazerosa.

(2.) Investigue a personalidade, a situação e a função do autor; o período, o lugar e a ocasião de sua composição; e os indivíduos para quem a mensagem se destinava primeiramente. Isso possibilitará que você entenda suas referências às circunstâncias e costumes específicos, e enxergue a aplicação prática dos princípios que o autor promove.

(3.) Considere o escopo principal do livro, ou qual a intenção, propósito ou objetivo do autor ao escrevê-lo. Observe também o plano ou método geral que ele segue. Isso permitirá que você descubra suas ideias principais, quer seja uma obra argumentativa, histórica ou instruções específicas da providência de Deus.

(4.) Onde a linguagem for difícil de entender, preste atenção cuidadosa ao contexto e então você normalmente encontrará uma explicação da intenção do autor. Mas se esse não for o caso, avalie se a expressão difícil é uma peculiaridade do estilo do autor. Se for, preste atenção ao lugar onde ele a utiliza em um contexto diferente, e veja qual o significado que ele atribui a ela ali. Se isso ainda não resolver, então examine passagens em outras partes das Escrituras que tratam do mesmo assunto e compare-as com a passagem que está sendo considerada no momento. Isso normalmente esclarecerá as passagens mais difíceis de entender. Mas se ainda estiver em dúvida, você pode encontrar ajuda consultando obras de comentaristas que mostram familiaridade com os detalhes que eu acabei de mencionar. Com um conhecimento das línguas nas quais as Escrituras foram escritas, os autores desses comentários podem ter sido capazes de remover a dificuldade. Entretanto, ao ler comentários, tenha sempre em mente que eles foram produzidos por homens falíveis, cujas opiniões não devem ser julgadas como se estivessem no mesmo nível das Escrituras. Entretanto, você pode se beneficiar do conhecimento deles, sem implicitamente se submeter às opiniões deles. Você será obrigado a fazer isso porque, em muitos pontos, eles divergem de opinião.

3. Não se Apresse

Não imponha a si mesmo uma certa quantidade de leitura para os momentos que você costuma dedicar ao estudo da Bíblia. Isso pode levá-lo a fazer o estudo com pressa, sem entender o significado do que lê ou e sem beber do seu espírito. É melhor estudar um versículo com profundidade, do que ler meia dúzia de capítulos descuidadamente. A nutrição recebida do alimento depende menos da quantidade em que ele é ingerido do que do fato de ele ser digerido completamente. O mesmo acontece com a mente: uma ideia clara é melhor que uma dúzia de ideias confusas. Há a possiblidade de a mente, assim como o estômago, ser sobrecarregada com comida não digerida. Medite em cada passagem que você lê até que adquira uma visão clara e completa da verdade que ela ensina. Fixe a sua mente e o seu coração nela, assim como a abelha pousa sobre a flor e não a deixa até que tenha extraído o néctar que ela contém.

4. Leia Toda a Bíblia Sistematicamente

Ao estudar toda a Bíblia sistematicamente, conectando as suas partes, você ganhará uma perspectiva mais ampla do seu conteúdo, e compreenderá mais nitidamente a sua unidade de propósito. Mas eu não gostaria que você se limitasse à leitura regular e sistemática da Bíblia. Algumas porções das partes históricas não exigem tanto estudo quanto as partes mais argumentativas e doutrinárias; e algumas partes da Palavra de Deus são mais devocionais que outras e são, portanto, mais adequadas para o uso prático diário.

Um plano muito bom é ler o Antigo e o Novo Testamentos sistematicamente, uma porção de cada um todos os dias. Se você começar em Gênesis, Jó e Mateus, leia um capítulo por dia de cada um, e leia três Salmos no Dia do Senhor, então você lerá toda a Bíblia em um ano e terá todos os dias uma boa variedade de leitura. Além disso, os livros mais devocionais e práticos deveriam ser lidos frequentemente. Os Salmos fornecem uma grande variedade de experiências cristãs e você pode recorrer a eles com proveito e conforto em todas as circunstâncias. Esse é o único livro da Bíblia que não precisa ser lido de maneira sistemática. Os Salmos são independentes uns dos outros, não possuem necessariamente uma conexão.

Os outros livros foram, em sua maioria, originalmente escritos como um sermão ou uma carta. Para facilitar, eles foram divididos posteriormente em capítulos e versículos. Se você ler um único capítulo, você perde a conexão com o todo; assim como você não teria uma visão completa do assunto abordado pelo autor de um sermão, se lesse apenas uma página ou duas. Portanto, eu recomendaria que, além da sua leitura diária do Antigo e Novo Testamento, você tenha um plano de estudo rigoroso e acurado de alguns desses livros mais difíceis e ricos. Mas se você frequenta a escola bíblica dominical, seja como professor ou como aluno, as lições ali estudadas serão suficientes para este propósito.

Antes de começar o estudo de um livro, você deveria aproveitar a oportunidade para ler todo o livro de uma vez só, a fim de aprender o escopo e o propósito do autor. Você verá que essa prática é proveitosa sempre que tiver tempo de fazê-la. Para esse propósito, você deve estar especialmente interessado em revisar os livros que já estudou. Quanto mais minuciosamente eles foram estudados, mais intensamente você terá interesse em revisá-los. Você se beneficiará muito do uso de uma Bíblia com referências e de uma concordância. Ao examinar as passagens paralelas, à medida em que você avança, você verá como uma passagem das Escrituras explica a outra e como elas se harmonizam tão maravilhosamente.

5. Examine Alguns Assuntos com mais Profundidade

Ao ler as Escrituras, existem alguns assuntos que devem ser objeto de maiores questionamentos ou investigação, os quais você deveria ter em mente constantemente.

(1.) O que nessa passagem faz referência a Cristo? A menos que mantenha isso em mente, você perderá metade do interesse em muitas partes do Antigo Testamento, e vai parecer que grande parte dele quase não faz sentido. O Antigo Testamento está cheio de tipologia e profecias relacionadas a Cristo que, por si só, parecem sem vida, mas quando são compreendidas, então tornam-se extremamente belas e cheias de instruções.

(2.) A Bíblia contém a história da igreja. Esforce-se, então, para aprender sobre o estado da igreja no período a respeito do qual você está lendo. Desde o início, você verá um desenvolvimento gradual dos planos de misericórdia de Deus, e uma luz cada vez maior. Leve em consideração o período da igreja sobre o qual você está lendo e, a partir daí, você poderá julgar o grau de obrigação dos seus membros — pois essa obrigação vem crescendo gradualmente à medida que a mais luz vai sendo concedida desde a queda do homem até o dia de hoje, e continuará a brilhar cada vez mais até o fim dos tempos. Perceba também os vários declínios e avivamentos da religião, que ocorreram em cada período da igreja, e empenhe-se para aprender sobre suas causas e consequências. Por meio disso, você se familiarizará com o método de Deus de lidar com o seu povo. Você poderá extrair lições práticas de advertência e encorajamento para si mesmo.

(3.) Investigue que verdade doutrinária é ensinada, ilustrada ou aplicada na passagem que você está lendo, e qual princípio é identificado. Princípios importantes e profundos do governo divino e do dever prático estão normalmente implícitos em uma passagem histórica, que está relacionada a um evento relativamente sem importância. Faça do seu objetivo extrair esses princípios e colocá-los em prática. Desse modo, você expandirá diariamente o seu conhecimento do grande sistema da verdade de Deus.

(4.) Observe cada promessa e cada profecia. Considere a fidelidade de Deus em manter as suas promessas e cumprir as suas profecias. Isso terá a tendência de fortalecer a sua fé. À medida em que você prossegue, você achará proveitoso fazer anotações sobre esses muitos assuntos em particular. Ao fim de cada livro, revise as suas anotações e as resuma sob diferentes tópicos.

6. Estude Jesus

Leia os Evangelhos com grande cuidado, com o propósito de estudar o caráter do bendito Jesus. Medite em cada ação de sua vida e investigue as suas motivações. Dessa maneira, você se surpreenderá ao encontrar a natureza divina resplandecendo através da humanidade de Cristo em pequenos incidentes, que você leu outras veze, mas que passou desapercebido. Olhe para ele o tempo todo em seu verdadeiro caráter, como Mediador entre Deus e a humanidade. Observe os seus vários ofícios de Profeta, Sacerdote e Rei. Veja em qual desses papéis ele está atuando em momentos diferentes, e analise que ligação a ação específica que você está considerando tem com o papel dele como Mediador.

Perceba também as características específicas de personalidade que parecem evidentes em determinadas ações — tais como poder, força, coragem, dignidade, condescendência, humildade, amor, mansidão, piedade, compaixão, ternura, perdão etc. Faça anotações e, quando você tiver concluído a leitura, extraia algo delas, escrevendo uma descrição resumida e específica do seu caráter. Isso servirá grandemente de modelo para você. Através desse método, você verá também uma beleza peculiar em Cristo e o quanto ele é apto para a função que exerceu, o que você não teria descoberto de outro modo. Mas não faça esse processo uma única vez. Repita-o tantas vezes quanto puder, de forma consistente com o seu plano de estudo sistemático das Sagradas Escrituras. Você sempre encontrará algo novo e, a cada nova descoberta, você pode revisar suas anotações antigas.

7. História e Biografia

Ao ler as partes históricas e biográficas das Escrituras, observe o seguinte:

(1.) As histórias contidas na Bíblia são as histórias da providência de Deus. Perceba a sua mão em cada evento, e investigue que princípio ou lei do seu governo moral está sendo exemplificado, observando cuidadosamente a sua aplicação às nações, às comunidades e aos indivíduos.

(2.) Quando você ler a respeito de misericórdias e julgamentos específicos, procure a causa. Assim, você pode descobrir os princípios pelos quais Deus administra o seu governo santo, sábio e justo.

(3.) Em relação às biografias da Bíblia, estude as motivações e a conduta dos personagens descritos. Se eles não são convertidos, você aprenderá acerca das práticas da depravação humana e descobrirá a influência de um correto sentimento público religioso tem em restringir essa depravação. Se eles são homens bons, você verá em suas ações ilustrações vivas das grandes doutrinas da Bíblia. Esforce-se para aprender por quais meios eles alcançaram tais feitos na santidade, e empenhe-se para imitá-los. Se alguma de suas ações for má, busque a causa da sua falha. Se você a encontrar, então achará uma placa de sinalização e advertência, para que você não caia no mesmo abismo.

8. Poesia e Instrução

As partes poéticas e didáticas das Escrituras estão espalhadas por toda a Bíblia. Elas estão cheias de figuras de linguagem complexas. Isso se deve, provavelmente e em parte, à insuficiência da linguagem humana para expressar as ideias elevadas e sublimes apresentada às mentes dos autores pelo Espírito da verdade e, em parte, ao método de comunicar ideias que era comum na fase inicial ou de concepção da língua. Esforce-se para entender as figuras de linguagem utilizadas. Normalmente elas são tomadas de hábitos e costumes cotidianos, e de circunstâncias específicas às nações onde as Escrituras foram escritas. Você deve entender esses hábitos e circunstâncias, ou então não poderá ver a força das alusões.

Outras ideias são tomadas de circunstâncias peculiares a ocupações específicas da vida. Elas também devem ser estudadas rigorosamente para que possam ser entendidas. Mas quando as figuras de linguagem forem extraídas de coisas perfeitamente conhecidas, você não perceberá sua beleza surpreendente e o fato de serem perfeitamente adequadas para expressar a ideia do sagrado escritor até que as tenha estudado cuidadosamente e observado as circunstâncias em seus mínimos detalhes. Contudo, fique atento para que você não exagere essas figuras de tal maneira que elas o conduzam a interpretações bizarras e fantasiosas.

9. Os Profetas

Os livros dos profetas consistem em repreensões, exortações, advertências, ameaças, profecias e promessas. Através do estudo cuidadoso das circunstâncias e das características daqueles para quem eles foram escritos, você encontrará os princípios e as leis do governo de Deus estabelecidos, em sua aplicação às nações, às comunidades e aos indivíduos. Você pode extrair deles regras práticas de dever e também aprender como contemplar a mão de Deus em sua providência em diferentes épocas do mundo. As profecias contidas nesses livros são as mais difíceis de serem entendidas em toda a Bíblia. Ao lê-las, você:

(1.) Observará aquelas profecias cujo cumprimento é registrado na Bíblia, e examinará diligentemente o registro do seu cumprimento. Você verá o quão zeloso Deus é para cumprir cada “i” e cada “til” da sua Palavra.[2]

(2.) Existem outras profecias, cujo cumprimento é registrado na história secular; e outras que ainda vão ser cumpridas. Para entender estas últimas, será necessário ler a história antiga e moderna, em conexão com a explicação das profecias oferecidas por aqueles que fizeram delas o foco do seu estudo. A atenção a esse detalhe, na medida que suas circunstâncias permitirem, será útil para ampliar a sua visão do reino de Cristo. Mas cuidado! Não se torne demasiadamente fascinado com esses assuntos a ponto de negligenciar aqueles de natureza mais prática; e seja cauteloso, principalmente, quanto a se aprofundar muito em especulações com relação às coisas futuras.

10. Um Livro Completo

Você verá que é um investimento interessante e proveitoso ler ocasionalmente um determinado livro por inteiro, com o propósito de ver que perspectiva ele lança sobre alguma doutrina, dever, prática ou caráter cristãos. Por exemplo, leia todo o livro de Atos atento à doutrina da divindade de Cristo. Em seguida, leia novamente para ver que perspectiva ele lança sobre a questão dos avivamentos da religião. Faça o mesmo com outros livros e com outros assuntos. Desse modo, você se surpreenderá de vez em quando ao descobrir a quantidade de coisas que você não percebeu na sua leitura anterior.

As sugestões citadas anteriormente podem parecer intimidantes por causa do tempo e do estudo necessários para colocá-las em prática. Mas deve-se lembrar que o jovem cristão tem toda a sua vida diante dele e que o seu principal trabalho principal é obter conhecimento das coisas de Deus. Esses conselhos não são dados com a expectativa de que cada recomendação feita aqui será seguida em um único ano, mas com o objetivo de elaborar um exercício para toda a vida.

 


[1] Cf. Atos 9:6.

[2] Cf. Mateus 5:18.

 

Título original: A Guide to Bible Study — Via: Chapel Library • Tradução: Rodrigo Lima • Revisão: William Teixeira.