A Razão pela qual a Distinção Interna/Externa Não e Válida para Justificar o Batismo de Bebês

O Debate Credobatista/Pedobatista

Os reformados pedobatistas consideram que o batismo de bebês é justificado, entre outras coisas, pela distinção interna/externa do Pacto da Graça. Isso quer dizer que é possível fazer parte do povo do pacto apenas de maneira externa, sem se beneficiar da graça interna. Nascer de pais crentes confere certo privilégio e daria direito ao batismo. Os pedobatistas não dizem que seus bebês são salvos, mas que eles fazem parte do pacto, pelo menos exteriormente, e que devem receber o sinal da entrada no pacto (o batismo), mesmo que eles não professem a fé.

Mesmo que se aceitasse a distinção interna/externa (o que eu rejeito), a prática do pedobatismo não é efetivamente justificada. O batismo poderia ainda exigir uma profissão de fé em um pacto que incluísse uma realidade externa que não salvasse e uma realidade interna que salvasse. Dessa maneira, poderia haver uma profissão externa de fé sem regeneração interna e uma profissão externa com regeneração interna, mas, em ambos os casos, uma profissão de fé credível como condição para receber o batismo. Portanto, a distinção interna/externa, mesmo se fosse aceitável, não implicaria necessariamente em um batismo sem confissão.

Certos pedobatistas aceitam esse ponto, contudo eles ainda consideram que a distinção interna/externa é suficiente para justificar o pedobatismo (sem exigir uma confissão necessariamente). O que eu quero demonstrar neste artigo é que não somente a distinção interna/externa não precisa do pedobatismo como não pode justificá-lo. Aí está a razão pela qual eu não acredito que essa distinção é válida para batizar bebês sob o pretexto de que eles são filhos de crentes, logo que as Escrituras não conferem nenhum status na Nova Aliança sobre a base da descendência natural.

A Diferença entre o que é Terreno e o que Celeste

A distinção interna/externa do Pacto da Graça repousa sobre o fato de que o povo da Antiga Aliança era misto (Romanos 9:6-8). Em um mesmo povo havia salvos e não salvos, porém um só povo de Deus. A pergunta que se precisa fazer é: por que o povo da Antiga Aliança era misto? A resposta pedobatista é de que dentro do Pacto da Graça há essa dualidade interna/externa que fazia com que existissem tanto israelitas segundo a carne somente como israelitas segundo o Espírito. Essa explicação requer necessariamente que a Antiga Aliança seja vista como sendo, ela mesma, o Pacto da Graça e essa equação levantou diversos problemas para os presbiterianos (Teonomia, Visão Federal, Nova Perspectiva em Paulo, Patriarchy movement, a controvérsia com Norman Shepherd e a rejeição da incondicionalidade do Pacto da Graça). Eu reconheço que a maioria dos presbiterianos têm evitado esses desvios, mas acredito que eles são relativamente coerentes à abordagem pedobatista…

Há, em minha humilde opinião, uma maneira bem mais simples e bem menos comprometedora de explicar a coexistência das realidades terrena/celeste; segundo a carne/segundo o Espírito e a mistura do povo nos tempos do Antigo Testamento. Eis a explicação: no momento em que havia uma salvação terrena (Êxodo, Conquista, Reinado, Templo, sacrifícios, etc.) era revelada a salvação celestial. Essas duas realidades não eram dois níveis de um mesmo pacto, mas duas alianças (Gálatas 4:21-31): a Antiga e a Nova (a Nova estando apenas sob forma de promessa enquanto a Antiga estava em vigor). A posteridade física de Abraão estava debaixo apenas do Antigo Pacto, mas todos os seus descendentes espirituais estão, como o próprio Abraão, sob o benefício da Nova Aliança.

Distinguir entre a Antiga e a Nova Aliança

A distinção óbvia que a Bíblia faz entre essas duas alianças nos obriga igualmente a distinguir de forma clara entre as prefigurações terrenas e as realidades celestiais (como Paulo faz em Colossenses 2:17, por exemplo). Nós não devemos confundir os dois (terreno/celeste) como se fossem duas partes de um mesmo pacto. Essas duas alianças possuem naturezas diferentes (uma é terrestre, outra é celeste) e não são estabelecidas com a mesma promessa nem com o mesmo mediador (Hebreus 8:5-6). Somente a Nova Aliança oferece as realidades celestiais, apenas ela tem Cristo por mediador e todos os que foram salvos na história o foram pela Nova Aliança (Hebreus 9:15 diz que é em virtude da Nova Aliança que a herança eterna foi concedida a todos os que foram chamados por Deus desde a fundação do mundo). A Nova Aliança começou a ser eficaz antes mesmo de ser uma aliança, quando era ainda uma promessa.

É Possível Estar Inserido na Nova Aliança Sem Ser Salvo?

O ponto importante é que a Nova Aliança não comporta um elemento externo no qual se poderia participar sem ser salvo. Entretanto, o Novo Testamento bem fala de pessoas que professam a fé sem, contudo, possuírem a salvação (Mateus 7:21; João 15:2; Romanos 11:19-22; Hebreus 6:4-8). No entanto, jamais essas pessoas são apresentadas como sendo membros da Nova Aliança, mas sempre como falsos crentes.

Os não salvos da Antiga Aliança eram vistos como povo de Deus e permaneciam na aliança, pois não era a função desse pacto administrar as realidades celestiais. Era então possível, sob a Antiga Aliança, ser o povo de Deus sem ter a vida eterna, porque Israel era o povo de Deus para a vida em Canaã. Jamais as Escrituras apresentam não salvos em relação à Nova Aliança que não estão sob sua condenação e que seriam chamados povo de Deus. Contudo, os não salvos da Antiga Aliança não estavam necessariamente sob a condenação da Antiga Aliança e eram povo de Deus. Como os não salvos da Antiga Aliança podiam ser povo de Deus sem serem salvos enquanto os “não salvos da Nova Aliança” nunca são apresentados como povo de Deus, mas tão logo como apóstatas, falsos irmãos, ramos sem frutos, ímpios disfarçados e aqueles para quem o fogo eterno está reservado? Porque a Nova Aliança administras as realidades celestiais; ela condena todos os que dela não fizeram parte e salva eternamente todos os que dela participam. Não existe meio-termo na Nova Aliança.

(Não havia meio-termo na Antiga Aliança, ou se estava nela ou não se estava. Entretanto, os que foram salvos o foram em virtude da Nova Aliança prometida e os que pereceram pereceram em virtude do antigo Pacto das Obras em Adão. Mas essas duas categorias de pessoas podem encontrar-se no interior da Antiga Aliança, pois ela administrava as realidades tipológicas terrenas, o que não é o caso da Nova Aliança. Por isso a Nova Aliança contém apenas uma categoria de pessoa: crentes regenerados.).

A salvação, em qualquer pacto, sempre é acompanhada do julgamento: as águas do dilúvio transportam a arca e afogam o mundo; a travessia do mar Vermelho liberta os israelitas e aniquila os egípcios etc. A Nova Aliança salva os que têm fé, mas ela é uma condenação para os incrédulos que pertencem a Satã (a cruz era também o julgamento do mundo e do Diabo João 12:31 e segundo Romanos 2:16 o Evangelho inclui igualmente o julgamento dos perdidos, cf. também Atos 10:42; 17:31; 2 Timóteo 4:1 e 1 Pedro 4:5-6). Os incrédulos que se aproximam da Nova Aliança não se encontram simplesmente na administração visível e externa dela, mas estão sob sua condenação. Os que ousam tocar no corpo e no sangue do Senhor sem discernimento comem e bebem um julgamento contra eles mesmos (1 Coríntios 11:29-30). Todas a advertências do Novo Testamento concernentes à presença de incrédulos entre os verdadeiros santos não servem para justificar a distinção interna/externa, mas a distinção verdadeiros/falsos. Nenhum falso crente pode entrar na Nova Aliança, se eles fazem parte da igreja visível, eles não fazem parte da Nova Aliança apenas por causa disso, pois não é mais possível fazer parte do povo de Deus sem ser salvo (Jeremias 31:34). Eles estão fora do pacto de acordo com o que o apóstolo João declara: “Saíram de nós, mas não eram de nós; porque, se fossem de nós, ficariam conosco; mas isto é para que se manifestasse que não são todos de nós” (1 João 2:9).

Aqueles que se infiltram não são dos nossos. Nós não devemos ter medo de batizar falsos crentes, nós os batizaremos seguramente de acordo com a Bíblia. Porém, de um lado, os falsos crentes não fazem parte do pacto apesar de seu batismo, eles estão colhendo a condenação do pacto. Por outro lado, nós os batizamos unicamente se eles professam a fé (já que a fé é a única porta de entrada nessa aliança). Nós não precisamos de um scanner do Espírito Santo para averiguar se a pessoa é regenerada, somente de uma profissão de fé creditável (os batistas não exigem mais do que a Bíblia exige, mas também eles não exigem menos).

E Quanto ao Apóstata Santificado pelo Sangue da Aliança?

Em relação àquele apóstata de Hebreus 10:29 que, aparentemente, foi “santificado” pelo sangue do pacto. De um lado é possível que ele tenha sido santificado “exteriormente” como dizem os pedobatistas, mas ele jamais esteve dentro da Nova Aliança, pois aqui está o que acontece com os que têm sido realmente santificados pelo sangue (de acordo com o mesmo capítulo de Hebreus: “Na qual vontade temos sido santificados pela oblação do corpo de Jesus Cristo, feita uma vez” (10:10). E então novamente lemos: “Porque com uma só oblação aperfeiçoou para sempre os que são santificados” (Hebreus 10:14). É por essa razão que acredito que é preciso interpretar o versículo 29 da seguinte forma: “De que pior castigo pensam vocês que será julgado digno aquele que desprezou o Filho de Deus, que terá tido por profano o sangue da aliança, pela qual ela foi santificada, e que terá ultrajado o Espírito da graça?”. A aliança que é santificada e não o apóstata, pois todos os que são santificados pelo sangue de Cristo têm uma redenção eterna segundo os versículos 10 e 14. Vamos incluir também que o versículo 28 (que compara a condenação infligida pela Antiga Aliança e aquela aplicada pela Nova Aliança) prova o fato de que a Antiga Aliança era limitada às coisas terrenas enquanto a Nova Aliança administra apenas as realidades celestes. Nós não devemos confundir essas duas realidades (terrena/celeste) com um só pacto, mas diferenciá-las como dadas por dois pactos distintos: a Antiga e a Nova Aliança.

Aqueles que professam falsamente o nome do Filho de Deus e que desprezam Seu sangue são profanos, ímpios e apóstatas. É dessa maneira que vocês chamam os que estão na “administração externa” do Pacto da Graça? E quanto às crianças batizadas que se rebelam temporariamente? De acordo com Hebreus 6:4-5, os que caíram não se levantam mais. Eu acredito que os pedobatistas erram em utilizar essa categoria de pessoas para introduzir seus filhos não crentes no pacto, já que as Escrituras se referem exclusivamente aos apóstatas e jamais a não salvos que estariam na Nova Aliança. Sim, a igreja visível é mista, mas não por sua natureza ou por causa de um Pacto da Graça que incluiria regenerados e não regenerados. A igreja é mista apenas por falsas profissões de fé e pelas artimanhas de Satanás. A igreja é o povo de Deus, mas alguns que não lhe pertencem se infiltram nela, isso não nos impede de declarar todos os santos visíveis “povo de Senhor” na medida em que eles lhe obedecem. Nós não precisamos nos preocupar em demasia com falsos crentes na igreja visível, mas devemos, entretanto, guardar a porta de entrada, reservando o batismo para aqueles que professam a fé. As Escrituras não dão espaço algum para uma Nova Aliança mista, mas ela apresenta uma Nova Aliança que salva eficazmente os crentes e que condena eficazmente os incrédulos.

Eu Amo Meus Irmãos Pedobatistas

Acrescento no encerramento que, apesar dessa importante divergência de posição sobre as alianças e o ponto corolário do batismo, eu tenho um grande respeito pela Igreja Presbiteriana e me considero um pigmeu sobre os ombros de gigantes (para citar um membro da banca durante minha defesa). A comunhão com meus irmãos pedobatistas me é extremamente preciosa e eu pretendo servir ao Senhor ao lado deles o máximo que puder. Eu espero sinceramente que este artigo não indisponha ninguém e que contribua para um diálogo inteligente e respeitoso entre reformados de confissões distintas. A clareza doutrinária é importante para a unidade e as divergências expressas neste texto não são um obstáculo para nossa comunhão, mas contribuirão para que nos entendamos melhor mutuamente… e pode ser que gere alguns batistas ;).

 

Título original: Pourquoi la distinction interne/externe n’est pas valide pour justifier le baptême des bébés — Via: UnHerautDansLe.Net • Traduzido e publicado com permissão.
Tradução por Luciano Kennedy Vieira • Revisão por William Teixeira

 

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