— Esta série de artigos foi postada inicialmente no blog Herança Batista Pactual e é reproduzida aqui com a permissão do autor. —
No primeiro artigo iniciamos a consideração sobre as convicções do puritano batista Benjamin Keach no que concerne à verdadeira piedade cristã.
Keach então registra que a piedade cristã genuína possui como essência e conteúdo a santa Palavra do Senhor, sendo assim, uma piedade verdadeira está alicerçada e preenchida por um credo que emerge das Sagradas Escrituras. Crer em proposições falsas acerca da pessoa e da obra de Deus consiste em possuir uma fé falsa e consequentemente uma piedade fingida.
Hoje veremos que para Keach a segunda marca de uma piedade genuína é a conformidade da vida à Santa Palavra de Deus. Deste modo, um verdadeiro crente não somente possui um conhecimento adequado do Senhor, mas ao conhecer a Deus e Sua vontade busca conformar-se à vontade revelada de Deus.
Como explica Keach:
Não é meramente seguir os princípios naturais da moralidade ou um conhecimento dogmático e teórico dos Evangelhos sagrados e seus preceitos, mas uma conformidade fiel aos princípios do Evangelho, cumprindo nossos deveres com a melhor predisposição para com Deus, bem como para com os homens, para que nossa consciência permaneça livre de ofensas a ambos (Atos 24:16).
Consiste em abandonar o pecado e odiá-lo como o pior mal e apegar-se a Deus de todo coração, valorizando-o acima de todas as coisas, desejando sujeitar-se ao princípio do amor divino, a todas as suas leis e comandos. É dizer com o salmista: “Quem eu tenho no céu senão a ti?” (Salmo 73:25) […].
Qualquer impressão inicial ou equivocada de que Keach possuía uma noção fria e intelectual de piedade é removida por completo aqui, muito para além disso, Keach demonstra uma firme certeza de que a genuína piedade não somente tem a Palavra de Deus como conteúdo, mas que esse relacionamento do crente para com a Palavra do Senhor é vivo.
Conhecer a Palavra é conhecer o Deus que Se revela, e quando essa contemplação do Senhor é real, conduzida pelo Espírito nos corações, tem como consequência inevitável o prazer em submeter-se ao Senhor e o ódio e repulsa por toda a maldade e pecado. Conformar-se à Palavra é honrar a Deus por entender que Ele é o bem supremo da alma.
Uma Ruptura com a Intelectualidade Morta
Uma das lições importantes que Keach nos comunica ao listar como marca da genuína piedade uma vida conformada a Palavra de Deus, é que Cristo quando nos salva redime não somente a nossa mente, mas também o nosso coração.
Atualmente existem inúmeros cristãos professos que têm reduzido a vida cristã ao acúmulo de informação. A ausência de piedade em tais homens é claramente verificada por meio de uma religião com reação lenta, passiva e permissiva para com comportamentos repulsivos diante da Palavra de Deus, como se pureza e vida cristã não possuíssem relação alguma.
Outro sintoma desse erro é a maneira como tais “teólogos” se comportam no campo de batalha da internet e das mídias sociais, agindo totalmente sem respeito por homens mais velhos que entregam a sua vida para servir o Evangelho, “lançando” ao inferno e proferindo palavras de maldição contra inegáveis filhos do Senhor, sob o pretexto de estarem defendendo a fé, quando, na verdade, agem de modo monstruoso para com pequenas discordâncias que em nada comprometem uma fé cristã genuína.
São escandalosos, desbocados, mimados e arrogantes. Não se verifica neles o quebrantamento e o temor de proferir as santas doutrinas, sendo eles mesmos reprovados por elas. Percebe-se que o senso de indignidade diante de Deus, a misericórdia do Evangelho e o amor pelos irmãos, estão ausentes. Sua postura é contraditória com aquilo que esbravejam crer.
Portanto, todo aquele que de fato conhece a Cristo deve portar-se como Ele andou, em santidade, piedade amor pelos irmãos (Efésios 5:1).
Um Serviço Alegre, Sincero e Submisso
Um outro ponto importante abordado por Benjamin Keach acerca da piedade é que a conformidade da vida à Palavra tem como fruto um serviço sincero e devoto ao Senhor. Ter o coração conformado a Deus é servi-lO com gratidão não como meio de barganhar com o Senhor algumas vantagens. Nesse sentido, Keach denuncia:
Há alguns que servem a Deus para poder usar Deus, mas o cristão autêntico anseia pela graça, não só que Deus o glorifique no céu, mas também que ele possa glorificar a Deus na terra. Ele exclama: “Senhor, dá-me um bom coração em vez de muitos bens”. Embora ele ame muitas coisas além de amar a Deus, ele não ama essas coisas mais do que ama a Deus. Este homem teme o pecado mais do que o sofrimento e, portanto, prefere sofrer do que pecar.
Em nossos dias, o número de igrejas que substitui a verdadeira piedade cristã por uma lista legalista de fazer e não fazer e por prescrições místicas é demasiadamente grande, e os objetivos de tais homens são expostos de maneira muito objetiva: receber de Deus bens, riquezas, bem-estar e a satisfação de todas as vontades que possam emergir do coração caído “para esbanjar em seus deleites” (Tiago 4:1).
Tais homens se portam como pagãos. Aqueles mesmos idólatras que apresentavam oferendas aos seus deuses buscando barganhar com eles dádivas, a fim de terem suas vontades satisfeitas, tentavam negociar qualquer coisa com seus deuses mortos e imorais.
Não é assim com o nosso Deus, pois Ele não precisa de nada. Não há nada digno que possamos usar para atrair a sua atenção para nós, para fazer-Lhe desejar-nos, e o verdadeiro cristão tem plena consciência disso. Servir a Deus não é um meio de barganha, mas a maior honra de sua vida, e isso consiste em abandonar o status de condenado pecador, escravo do pecado, do diabo e do mal, para agora tomar o Seu jugo e Seu fardo que é leve; é ser recebido, transformado e adotado; é caminhar conforme a vontade santa e pura do seu Senhor. Não há maior riqueza para a alma senão Deus. Em Cristo, o genuíno crente é verdadeiramente satisfeito e sabe que habitando nEle e gozando de Sua Graça, nada lhe faltará.
Concluímos, portanto, que a piedade genuína não somente possui como a sua essência a Palavra de Deus, mas que essa Palavra é viva e transforma o coração do pecador, conduzindo-o a amar o que Deus ama e a odiar o pecado e tudo o que Deus odeia, e a se regozijar em servir ao Seu Mestre.
O crente genuíno por compreender que seu Deus é santo e que a vontade dEle é pura, santa, justa, boa e agradável, nega a si mesmo e busca caminhar em conformidade com o seu Senhor.
Uma religião puramente intelectual ou interesseira, que não tem prazer na lei de Deus e nem ódio pelo pecado nada mais é do que uma falsa religião, uma piedade falsificada que não conhece de fato nem as Escrituras nem o poder de Deus e caminha em seu vão engano para a condenação e o afastamento perpétuo do Deus santo.
Que o Senhor nos livre de caminhar como tais homens, cegos e idólatras de seus próprios egos. Que Ele gere em nós uma genuína piedade que consiste em conhecer de maneira viva e verdadeira ao Senhor, tendo nossos corações conformados à Sua perfeita e soberana vontade revelada a nós.
Soli Deo Gloria.
•••
Continuaremos no próximo artigo falando sobre a forma exterior da piedade cristã.
As citações foram extraídas e traduzidas do artigo Descripción de La verdadera Piedad publicado no jornal Porta Voz de La Gratia nº 192.