Grande parte da humanidade ocidental encontra-se no meio de uma grave crise de identidade. Cada ideologia transitória tem tentado redefinir os fundamentos vitais e basilares de uma civilização saudável no que diz respeito à sua crença e comportamento. Muitos vivem ignorando quem somos, de onde viemos, como chegamos aqui e o que devemos priorizar na vida. Daí que muitos de nós vivem vidas destituídas de qualquer sentido pessoal ou propósito que valha a pena; qualquer senso de objetividade verdadeiro é jogado na lixeira como algo antiquado.
Analisar o que a Bíblia diz sobre a criação é algo necessário
A Confissão de Fé Batista de 1689 está enraizada em um princípio de reforma biblicista que sustenta as Sagradas Escrituras como fonte primária de conhecimento e o guia definitivo para a crença e comportamento corretos desde o início da existência humana. Portanto, após afirmar as verdades sobre as Sagradas Escrituras, a identidade de Deus, e os decretos divinos, não deve ser surpresa que “A Criação” seja abordada logo em seguida na Confissão de 1689.
Uma área que é tão frequentemente intocada por muitas igrejas (batistas ou não) devido à sua natureza aparentemente “hot-topic”,[1] a criação e o que acreditamos sobre as nossas origens é de importância primordial. Não se pode ser verdadeiramente cristão, muito menos batista, e ignorar o que a Bíblia diz sobre a criação.
A Confissão Batista de 1689 afirma o relato bíblico de quando a criação aconteceu: “No princípio”. É fácil ignorar que essas palavras, derivadas diretamente de Gênesis 1:1, afirmam nossa crença que a criação em que agora habitamos não foi precedida por nenhuma outra como alguns afirmam, nem é infinitamente antiga como outros especulam. Houve um início real quando o universo foi criado. Além disso, houve uma escala de tempo revelada na qual Deus criou o universo: “no espaço de seis dias”. Não devemos estar incertos de que a Confissão Batista de 1689 acredita que o relato da criação do Gênesis é uma história, não uma alegoria, que é literal, não simbólico. Nunca é demais enfatizar essa verdade. Com poucas excepções, a crença em um período literal de criação de seis dias, tal como descrito no Gênesis 1-2, foi aceita tanto pelos crentes tanto antes como depois de Cristo
A Confissão Batista de 1689 afirma o registo bíblico de como a criação aconteceu: “Aprouve a Deus, o Pai, o Filho e o Espírito Santo criar ou fazer o mundo”. Todo o ser complementar, coordenado, coexistente, coeternal, coigual e cooperativo de Deus está envolvido na criação dos céus e da Terra. É a partir de Gênesis 1:1 que encontramos o Deus trino, Elohim no hebraico, apontando para uma pluralidade na unidade. Isso é repetido em Gênesis 1:26 quando Elohim usa pronomes plurais: “Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança”. O processo de criação afirmado pela Confissão de 1689, que levou seis dias e foi governado pela palavra e pela vontade de Deus, exclui qualquer noção de evolução teísta sobre a teoria dos mais de 13 bilhões de anos teóricos afirmados por muitos. Deus dá a ordem, e a criação passar a existir simplesmente pela palavra do seu poder divino.
Os evolucionistas teístas não têm qualquer problema em reconhecer que houve um princípio quando Deus participou no ato da criatividade. O debate é sobre a ideia de Deus ter criado todo o universo em seis dias. Antes de as controvérsias sobre o evolucionismo se intensificarem, a Confissão de 1689 reconhece qual criação aconteceu: “o mundo e todas as coisas nele, sejam visíveis ou invisíveis… e tudo muito bom Após Deus haver feito todas as outras criaturas, ele criou o homem, macho e fêmea, com almas racionais e imortais…”.
Deus criou o um universo dotado de maturidade. Adão e Eva não foram criados como bebês, cuja idade pudesse ser calculada até ao primeiro dia. Nem o primeiro diz foi como o período de infância da Terra. O universo foi criado com uma idade aparente de maturidade, e todas as coisas nele, sejam visíveis ou invisíveis foram criadas como “muito boas”. Calcular a idade da Terra até ao ponto da infância é, portanto, um esforço infrutífero que subverte uma parte muito importante do poderoso processo criativo de Deus. Além de Deus criou a humanidade dotada de maturidade e responsabilidade, e a encarregou de desempenhar o principal papel na manutenção e domínio da criação de Deus.
Ao explorarmos a substância da criação de Deus, encontramos — assim como os signatários iniciais de 1689 — a razão pela qual a criação aconteceu: “Ele fez isto para a manifestação da glória do seu eterno poder, sabedoria e bondade”. Deus nos criou com corpo e alma e nos “tornou aptos à vida para Deus… tendo sido feitos segundo a imagem de Deus, em conhecimento, retidão e verdadeira santidade”. Deus criou a humanidade “tendo a lei de Deus escrita em seus corações, e poder para cumpri-la. Além dessa lei escrita em seus corações, eles receberam a ordem de não comer da árvore do conhecimento do bem e do mal; de forma que enquanto obedeceram a este preceito eles foram felizes em sua comunhão com Deus e tiveram domínio sobre as criaturas”.
Dito de forma simples, a criação aconteceu para exaltar a glória de Deus, e a humanidade foi criada para ser receber e se beneficiar dessa glória ao viver de modo que representasse e refletisse a suprema bondade de Deus.
A Confissão hoje
Corroborar a Confissão de 1689 em sua afirmação do ensino bíblico sobre a criação é de extrema importância prática. Se nos enganarmos sobre o tema da Criação, falharemos em entender a nossa humanidade e as responsabilidades que a envolvem. Não podemos compreender verdadeiramente o nosso próprio propósito e identidade, muito menos o padrão linear da história humana, a menos que comecemos “no princípio”. Muitas coisas forma impressas diretamente em nossas consciências como resultado direto da obra criadora de Deus. Cremos no lugar especial ocupado pela humanidade por causa da criação. A humanidade tem uma identidade única por ser portadora da imagem de Deus, o que implica na responsabilização das nossas consciências perante Deus. Acreditamos nas características únicas, diferentes e complementares das personalidades e dos papéis que homens e mulheres possuem enquanto homens e como mulheres — essas distinções são determinadas pelo sexo com que nasceram em virtude da criação. Os cristãos acreditam no casamento entre um homem e uma mulher devido à criação. Acreditamos na bondade do sexo dentro do contexto do casamento heterossexual apenas devido à criação. Acreditamos na bênção da procriação e na consequente responsabilidade paternal tanto da mãe como do pai devido à criação. Acreditamos que a natureza complementar da união e da relação homem/mulher é vital, saudável e melhor para os filhos devido à criação. Acreditamos na lei e na ordem com base no bem e no mal na sociedade devido à criação. Temos semanas de sete dias, incluindo um dia de descanso por causa do padrão que Deus estabeleceu na criação.
Embora todas estas sejam partes essenciais de quem somos para refletir o plano do nosso Deus Criador revelado na história de Gênesis 1-2, a compreensão da redenção em si não pode ser obtida de uma forma histórica significativa fora da aceitação do relato bíblico. A genealogia lucana de Jesus (Lucas 3:23-28) traça a linhagem de Jesus de volta a Adão. Será que isso é uma invenção? Paulo diz que o pecado e a morte entraram no mundo através de um só homem — Adão (Romanos 5:12; 1 Coríntios 15:21) e que Cristo veio como um segundo Adão para nos dar a vida. Se não podemos confiar na realidade do primeiro Adão, como podemos confiar na redenção do segundo? Se a história relativa à queda de Adão e Eva da bondade de Deus na criação e o subsequente efeito no universo não é verdade, então de onde veio o pecado e a morte?
A Confissão está certa e afirma o ponto fundamental da fé sobre o qual tudo o resto se fundamenta. Como diz Hebreus 11:3: “Pela fé entendemos que foi o universo criado pela palavra de Deus, de maneira que o que é visível”. Além disso, nunca compreenderemos quem Deus é ou quem ele nos criou para sermos.
Regan King
15 de maio de 2021
[1] Nota de tradução: Hot-topic, tema controverso de discussão; algo sobre o qual as pessoas têm muitas opiniões diferentes.