[Carta Circular da ARBCA • 2004]
Queridos irmãos,
“O Legítimo Incentivo De Jovens Homens Qualificados Em Nossas Igrejas Para Estudarem E Se Prepararem Para O Ministério Do Evangelho”, era o título original que me foi dado para esta carta circular. Como você pode ver, eu escolhi um título diferente, mas igualmente puritano. Minha intenção não é obscurecer o assunto em mãos, mas, sim, elucidar o fato de que este discurso está preocupado com o resultado prático da chamada externa para o ministério da Palavra. Deixe-me explicar.
Ao longo das Escrituras o ministro da Palavra é descrito em termos elevados. Ele é um servo de Cristo e despenseiro dos mistérios de Deus (1 Coríntios 4:1), um tesouro (2 Coríntios 4:7), um embaixador de Cristo (2 Coríntios 5:20; cf. Romanos 10:14-17), e um dom de Cristo assunto ao Céu (Efésios 4:8-15). No entanto, como todos os textos confirmariam, a importância do ministro está ligada às suas funções Divinamente designadas na economia da graça, especificamente a pregação da Palavra e a administração das Ordenanças, sendo que ambos são feitos eficazes para nossa salvação pelo Espírito de Deus1. Paulo, por exemplo, exorta Timóteo: “Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina. Persevera nestas coisas; porque, fazendo isto, te salvarás, tanto a ti mesmo como aos que te ouvem” (1 Timóteo 4:16). Pastores são concedidos à Igreja por sua Cabeça e Rei, Jesus Cristo, para o bem dela e para a glória de Deus, e assim, nós confessamos juntamente com Calvino que “nem a luz e calor do sol, nem comida e bebida, são tão necessários para alimentar e sustentar a vida presente como o ofício apostólico e pastoral é necessário para preservar a igreja na terra”2.
Porque o ministério do Evangelho é um tal chamado alto e santo, e ordenado por Deus para tais fins elevados e santos, como Confessionais Batistas Reformados devemos estar ativamente engajados em ver o surgimento de mais ministros dentro das nossas igrejas. A injunção de Paulo em 2 Timóteo 2:2 deve ser entendida como a nossa responsabilidade. “E o que de mim, entre muitas testemunhas, ouviste, confia-o a homens fiéis, que sejam idôneos para também ensinarem os outros”. Este texto, de acordo com Presbiteriano do século XIX, Samuel Miller, expressa “o dever imprescindível da Igreja de Cristo, em todas as eras, de tomar medidas, para a promoção de um ministério capaz e fiel”3.
Nosso objetivo presente, então, não é descrever a natureza da chamada externa para o ministério em si, mas, sim, delinear as medidas concretas que a igreja deve tomar para cumprir o seu dever de cultivar dentro de seu meio hábeis ministros da nova aliança. Devemos encorajar homens qualificados para continuar o ministério do Evangelho, e a questão com a qual estamos preocupados é, como Miller enfatizou, “quais são os meios que a igreja é obrigada adotar, para a promoção de um ministério capaz e fiel?”4. Ao meu ver nossos compromissos bíblicos e confessionais chamam nossa atenção para três responsabilidades interrelacionadas que compõem a substância do dever da igreja de cultivar ministros da Palavra.
Primeiro, a igreja deve estar ativa em identificar e selecionar homens qualificados para a obra do ministério. A chamada para o ministério é uma prerrogativa soberana de Deus. Cristo dá a alguns homens a determinação para servi-lO no ministério pelo Seu Espírito, imprimindo na consciência do indivíduo o sincero desejo de se empenhar nesta boa obra (2 Timóteo 2:3-7; 1 Timóteo 3:1). No entanto, Deus, em Sua boa e sábia providência, faz uso de meios para realizar Seus propósitos soberanos (cf. CFB 5:3). Portanto, cada igreja local tem a responsabilidade de reconhecer aqueles dentro de sua comunidade que são “capacitados e dotados pelo Espírito Santo pelo Espírito Santo” (CFB 26:9), ou, para usar a terminologia Paulo, homens fiéis, que sejam idôneos (2 Timóteo 2:2). Necessariamente, então, nem todos são chamados ao ministério. Isto pode parecer óbvio, mas porque a maioria do evangelicalismo contemporâneo adotou o erro do ponto de vista em que todos são membros ministros, este é um lembrete importante. No entanto, aqueles a quem a igreja chama para o ministério devem possuir certas qualificações essenciais.
O pastor prospectivo deve ser um homem (1 Timóteo 2:12; cf. 2 Timóteo 2:2), que sustenta uma vida irrepreensível no lar, na igreja e diante do mundo (1 Timóteo 3:2, 4, 7; Tito 1:6). Ele também deve ser um homem de caráter e conduta comprovadamente piedosos (1 Timóteo 3:6). Além disso, ele deve possuir a capacidade de ensinar (1 Timóteo 3:2; cf. 1 Timóteo 4:13-16; 2 Timóteo 2: 2; 4:2) e a capacidade de governar (1 Timóteo 3:4-5), ambos os quais exigem uma compreensão clara de um compromisso honesto em relação ao sistema de verdade estabelecido nas Escrituras (Tito 1:9). A igreja tem a responsabilidade de identificar e selecionar homens qualificados, ou seja, homens que possuem essas graças e dons, ou a piedade e a capacidade exigida para o ministério. “A igreja”, de acordo com Miller, “está equipada com o olho vigilante, para procurar e selecionar cuidadosamente, dentre os jovens de seu seio, aqueles que são dotados de piedade e de talentos, sempre que ela puder encontrar essas qualificações juntas”5.
Como, então, é possível identificar os homens possuidores de graça e dons? Que medidas concretas a igreja deve tomar fim de selecionar os homens de piedade e capacidade? Responder a este tipo de pergunta, ao que parece, é análogo a determinar se a profissão [de fé] de um pecador que diz ter fé em Cristo é uma profissão digna de crédito. Em ambas as circunstâncias, a igreja não é capaz de perscrutar a alma, mas, sim, discerne, com o melhor de sua capacidade, a presença de uma realidade espiritual interior, por meio de evidências externas. No caso da chamada para o ministério tal evidência consiste principalmente nos dons que o Espírito Santo concede a homens para a pregação do Evangelho, que é “a principal obra do ministério da igreja, o fundamento de todos os outros deveres…”6. John Owen, em seu mui refinado trato dos dons espirituais, assinala três dons necessários.
O primeiro dom é a sabedoria, conhecimento ou compreensão dos mistérios do Evangelho. Isso, certamente, requer a fé salvífica no Evangelho, mas Owen tem em vista “a compreensão do escopo e do propósito das Escrituras… uma familiaridade com os sistemas de determinadas verdades doutrinárias… uma visão distinta sobre as fontes e curso do mistério do amor, graça e vontade de Deus em Cristo” que capacita os ministros “a darem a conhecer o modo de vida, de fé e obediência, para os outros, e para instruí-los em todo o seu dever para com Deus e o homem”7. O Evangelho é “a sabedoria de Deus, oculta em mistério” (1 Coríntios 2:7), um mistério revelado em Cristo (Romanos 16:25-27; Efésios 3:1-7), e como despenseiros dos mistérios de Deus (1 Coríntios 4:1) os ministros devem “tornarem-se tão sábios e entendidos naquele mistério, de modo que eles sejam capazes de declará-los aos outros…”8.
O segundo dom é a capacidade de manejar bem a Palavra de Deus (2 Timóteo 2:15). A pregação requer a habilidade de interpretar e aplicar as Escrituras, com a consciência das várias necessidades presentes na congregação. Assim, para o ministro cumprir este dever corretamente, ele deve ter uma compreensão: (1) do estado e condição da congregação, (2) da maneira pela qual a graça de Deus opera sobre as mentes e sobre os corações dos homens, (3) da natureza da tentação, bem como os obstáculos comuns à fé e à obediência, e (4) da natureza das doenças espirituais e seus remédios adequados9.
Por fim, Owen menciona o dom da palavra, ou a abertura da boca com ousadia para dar a conhecer os mistérios do Evangelho (Efésios 5:19). Não simplesmente uma natural habili-dade retórica, mas a elocução consiste: (1) na liberdade e desenvoltura na proclamação da verdade, (2) na ousadia e santa confiança mesmo em frente oposição de dificuldades ou obstáculos, (3) na pregação “com a gravidade e solidez do discurso que é devido aos que anunciam a Palavra de Deus”, e (4) na autoridade que acompanha a correta pregação da Palavra de Deus10.
Embora esses dons deverão ser cultivados e aumentados ao longo de uma vida de ministério fiel (cf. 1 Timóteo 4: 14-15; 2 Timóteo 1:6), e serão evidentes, em maior ou menor medida, antes tanto do treinamento formal e do ministério ativo, a discussão de Owen fornece a base para determinar as medidas concretas que a igreja pode tomar para identificar e selecionar os homens com tais dons, porquanto esses dons, se presentes, serão evidentes para a igreja. Com isto em mente, permita-me oferecer algumas sugestões práticas para o propósito de identificação e seleção de homens qualificados.
A primeira e mais importante medida necessária da Igreja é a oração fervorosa, tanto em privado como em público. Se a chamada para o ministério, e as habilidades necessárias para o ministério, são dons do soberano Senhor da Igreja, então devemos orar para que Deus conceda essas coisas para os homens em nossas igrejas. O próprio Senhor Jesus disse aos seus discípulos: “A seara é realmente grande, mas poucos os ceifeiros. Rogai, pois, ao Senhor da seara, que mande ceifeiros para a sua seara” (Mateus 9:37-38). Se nós devemos identificar aqueles que são qualificados para ser ministros da Palavra de Deus, então, o próprio Deus deve levantar para Si homens fiéis e capazes, e da mesma forma nos concederá a graça e sabedoria para examinar se um homem possui as qualificações necessárias.
Também é importante que a Igreja discirna a vontade de um jovem homem para negar a si mesmo e servir a Cristo e à Sua Igreja. Ele está disposto a ajudar a igreja, tomando sobre si mesmo a mais humilde das tarefas? Além disso, ele pretende atrair a atenção por conta de seu serviço, ou ele simplesmente serve sem cuidado ou preocupação de ser reconhecido? Por si só, cada Cristão deve ser marcado por esses traços de caráter piedoso; contudo, a combinação desses tipos de graças com os dons espirituais necessários pode servir como evidência de uma chamada para o ministério. Além disso, a igreja, tanto seus membros quanto seus oficiais, deveriam envolver jovens em conversas particulares sobre os mistérios do Evangelho. Verdadeiros homens de piedade e de capacidade vão ser humildes, e em graus variáveis podem ser reticentes a publicar as suas aspirações para o ministério. Miller escreve: “A piedade é humilde e se recolhe; e talentos, especialmente do tipo melhor apropriado para o grande trabalho do ministério, são modestos e discretos. Eles exigem, pelo menos, em muitos casos, ser buscados, incentivados e trazidos à tona. E como, e por quem, isso pode ser feito? Os filhos da igreja são, se é que posso me expressar assim, propriedade da igreja. Ela tem o direito aos serviços do melhor deles”11. Tenha certeza de que é um erro grave empurrar homens não qualificados para o ministério. Mas, se o Espírito de Deus dá um extenso conhecimento da verdade bíblica sobre aqueles que Ele tem separado para o ministério, então, esta é uma excelente forma de identificar se um homem possui tal conhecimento, e é capaz de articular e aplicar a verdade para o povo de Deus. A maneira mais formal de decifrar a presença de uma compreensão intelectual do sistema de teologia pode ser estabelecer uma propedêutica limitada (i.e., pré-seminário) em um programa de leitura12. Isto pode incluir reuniões periódicas em que um ou mais dos anciãos seria capaz de examinar a capacidade do homem de compreender e comunicar a verdade Divina.
Em um certo sentido, os pais Cristãos em nossas assembleias potencialmente desempenham um papel na identificação de jovens que receberam dons ministeriais. Como pais piedosos devem inculcar reverência para com o ministério público da Palavra e catequizar seus filhos, eles têm a capacidade (e privilégio único) de observar em primeira mão ou não se um jovem ama e compreende a verdade do Evangelho. Paulo parece indicar que isso era algo da experiência de Timóteo (2 Timóteo 1:5; 3:14-16). Um exemplo histórico notável da influência da filiação piedosa é Herman Witsius, um pastor Reformado holandês do século XVII e teólogo. Recordando a providência do Senhor em sua chamada para o ministério e nomeação como professor de teologia em Franeker, Witsius comentou: “Meus pais piedosos me dedicaram à igreja em minha infância e tive o cuidado de ter a minha mente imbuída de tais instruções doutrinárias e práticas à medida que foram projetadas para me transformar em alguém que não traria nenhuma desonra para a casa de Deus. No entanto, ambos os seus desejos humildes e meu próprio foram cumpridos quando, não sem extraírem algum benefício das minhas ministrações, eles me ouviram falar sobre as coisas de Deus, mas com pouca pompa e a uma pequena assembleia”13. Não podemos esperar que isso seja verdade em todos os casos, nem devemos separar esta consideração do seu contexto eclesiástico adequado. Ao mesmo tempo, no entanto, é preciso reconhecer o papel potencial que pais piedosos desempenham no sentido de incentivar os jovens a considerar o ofício pastoral.
Para este fim, a igreja deve também dar oportunidades a homens jovens que são qualifica-dos para evidenciar perante a igreja um conhecimento do Evangelho, sua capacidade de interpretar corretamente e aplicar a Palavra de Deus, e ousadia no discurso. A aplicação específica deste princípio varia necessariamente de congregação para congregação, mas a igreja deve encontrar maneiras de fornecer ocasiões em que um candidato ministerial pode demonstrar à igreja que ele é tanto piedoso quanto capaz. Por exemplo, chamar os jovens para orar, pois a igreja pode facilmente avaliar a oração pública. Se a sua igreja realiza serviços para uma casa de repouso ou similar, você pode ser capaz de dar oportunidades a homens jovens para ensinar nessas circunstâncias. Depois de algum tempo, a igreja pode convidar o candidato para liderar um culto de adoração no Dia do Senhor, e, eventualmente, você pode convidá-lo para pregar, especialmente se ele está participando de seminário e tem necessidade de completar as horas de estágio necessárias. Nesta fase, pode haver igrejas irmãs em sua área com necessidade de serem providas no púlpito, e eles também podem ser capazes de identificar a presença dessas graças e dons, e assim dar a sua recomendação conscientemente.
Certamente estas considerações não são exaustivas, mas elas demonstram que para a igreja identificar e selecionar jovens qualificados para o ministério do Evangelho, estes homens devem ser colocados diante da igreja, e as suas graças e dons devem ser feitos evidentes para a igreja.
Em segundo lugar, a igreja deve estar ativa na assistência e formação de homens qualificados para a obra do ministério. Tendo os jovens qualificados sido identificados e selecionados para o ministério, a igreja é obrigada a ensiná-los para o bem dela mesma (2 Timóteo 2:2). Nós, como uma associação de igrejas, temos a obrigação de instruir os homens qualificados, a fim de fornecer-lhes todos os recursos necessários para o desempenho das suas funções ministeriais. Qualquer coisa menos do que isso, demonstra desdém para com a igreja de Cristo. Educação ministerial, portanto, é um aspecto vital do cultivo de fiéis e capazes ministros da Palavra.
Na tentativa de cumprir essa responsabilidade de treinamento ministerial, é importante ter em mente que a nossa concepção da natureza e da necessidade de educação ministerial está ligada à nossa compreensão do caráter e das funções do ministério. B. B. Warfield estava correto em apontar: “A baixa opinião sobre as funções do ministério naturalmente levará a uma baixa concepção da formação necessária para ele”14. Nós já vimos que tanto o Novo Testamento quanto a nossa Confissão esposam uma visão bastante elevada do ministério e de seu, Divinamente ordenado, significado. Consequentemente, o nosso compromisso com a Palavra de Deus e com nossa subscrição da Segunda Confissão de Fé Batista de Londres nos deixam sem outras opções; temos de entreter o maior respeito possível para com a educação teológica. Certamente, se acreditamos que a principal função do ministro da Palavra é proclamar todo o conselho de Deus, como foi revelado no Seu Filho unigênito, para o bem da redenção de homens, mulheres, meninos e meninas atola-dos na miséria e culpa do pecado, então temos nossa consciência obrigada a fornecer o tipo de treinamento ministerial que provê jovens qualificados com um amplo conhecimento de todo o conselho de Deus, e também prepará-los para aplicar todo o conselho de Deus, à medida que o Senhor redime Seus filhos. Assim, é necessário que tomemos várias medidas práticas.
Este ponto de vista da necessidade e da função da formação ministerial requer que a igreja forneça uma educação teológica abrangente. Mais uma vez, Warfield nos lembra: “O que exatamente deve ser ensinado em um seminário teológico será determinado por nossa concepção do ministério para o exercício das funções para as quais aquele oferece preparação”15. Se, em outras palavras, a função do ministério fosse terapêutica, recomendaríamos uma educação que consiste em tudo o que é relevante para a disciplina de terapia. Como, no entanto, “o negócio do ministro é aplicar o evangelho salvador de homens perdidos para a sua salvação do pecado”, devemos insistir em uma educação que visa fornecer um conhecimento profundo do Evangelho “em todos os seus detalhes, e em todo o seu poder”16. Para ser completa, então, a educação ministerial deve incluir o tratamento detalhado de cada uma das quatro disciplinas teológicas, pois: (1) teologia exegética e bíblica combina com a explicação da Palavra de Deus, (2) teologia sistemática implica a organização e a confirmação da verdade da Palavra de Deus, (3) teologia histórica fornece uma demonstração e ilustração da interpretação da igreja (ou má interpretação) das Escrituras, e (4) por fim, a teologia prática envolve a aplicação das três disciplinas anteriores para a vida da igreja e a adoração a Deus. Com a intenção de oferecer este tipo de educação teológica rigorosa e robusta, a ARBCA fundou o Institute of Reformed Baptist Studies [IRBS: Instituto de Estudos Batistas Reformados] para trabalhar em conjunto com o Westminster Seminary in California [WSC: Seminário Westminster na Califórnia].
Consequentemente, então, nossas igrejas deveriam incentivar os homens qualificados a cursarem este tipo de educação teológica, especificamente no IRBS e WSC. Witsius declarou que “ninguém ensina bem, a menos que, primeiramente, ele tenha aprendido bem”17. Parece que isto está implícito quando Paulo comissionou seu emissário apostólico, Timó-teo, para ensinar a homens fiéis o que ele havia aprendido com o apóstolo (2 Timóteo 2:2). Entretanto, isso significa que o IRBS oferece a melhor preparação educacional para o ministério? Para as igrejas ARBCA, sim, a menos que isso seja providencialmente impedido. Permitam-me responder a várias acusações em potencial.
“Isso não usurpa o lugar da igreja local na formação ministerial?”. Posto que não existe espaço suficiente para lidar adequadamente com esta objeção, é importante lembrar que Paulo trata Timóteo em 2 Timóteo 2:2 como seu representante apostólico; Timóteo não é o pastor de uma igreja local. Este dever pertence, então, à igreja, não ao pastor de uma igreja local específica. Assim, o treinamento ministerial é uma função apropriada de uma associação de igrejas como a nossa.
“Esta mentalidade não é estreita?”. Nem um pouco. Para nós, coletivamente, como uma associação de igrejas de boa mente, determinamos que o IRBS é atualmente a melhor maneira possível no qual nós podemos fornecer uma educação teológica para potenciais ministros.
“Os programas de ensino à distância e o tipo de programas de leitura autodidatas, não são meios adequados de preparação para o ministério?”. Paulo não pensou assim. Em 2 Timóteo 2:2, ele diz a Timóteo para ensinar as coisas que ouviu. O verbo ἤκουσας, exige a instrução do tipo face a face. Assim como a fé vem pelo ouvir da Palavra pregada (Romanos 10:17), aqueles que estudam para o ministério devem aprender por audiência. Nós todos concordamos que os ministérios de vídeos e literatura teológica têm o seu lugar na vida Cristã, mas não são substitutos para a pregação. Da mesma forma, a leitura é importante, mas não pode substituir a instrução verbal na formação dos futuros ministros. Além disso, os programas de ensino à distância e de leitura são muitas vezes preferidos no lugar de um seminário tradicional porque supostamente levam em consideração várias limitações de tempo, e pelo fato do estudante poder atender a maioria dos requisitos do programa em seu próprio tempo, em seu próprio ritmo. Mas ser um aluno do seminário de três a quatro anos não apenas concede ao aluno o privilégio de aprender com pastores experientes e estudiosos, que são especialistas em seus respectivos campos, mas também permite um período sem precedentes de reflexão consistente e constante sobre a Palavra de Deus.
“Mas a Califórnia não está muito longe de casa?”. Essa objeção é esvaziada de todo e qualquer peso, isto é assim comigo, à medida que lembro que um ministro deve possuir um espírito de abnegação e vontade de servir a Cristo onde quer que ele venha a ser chamado. Se o ministro estiver preparado para ir a qualquer lugar por causa do reino de Deus, então a Califórnia não é muito longe para receber treinamento ministerial. Este ponto de vista acerca da necessidade e da função da formação ministerial requer também que a igreja ofereça de bom grado qualquer ajuda que for necessária para proporcionar uma educação teológica. O teólogo Puritano, William Perkins, em seu importante livro The Art of Prophesying [A Arte de Profetizar], argumentou: “Bons ministros surgem na proporção de um para mil. Se, portanto, o seu número for aumentado, as instituições de formação devem ser bem cuidadas a fim de guardar o reino contra Satanás, o Anticristo é cuidadoso para erguer faculdades e provê-las com apoio financeiro, para que estas sejam seminários para sua sinagoga… Ele emprega meios enérgicos para semear o seu joio no coração dos jovens, para que estes possam, por sua vez, plantá-los nos corações das pessoas lá fora. Os oficiais Cristãos não deveriam ser tão cuidadosos, de fato, ainda mais zelosos, para aumentarem o número de bons ministros?”18. Enquanto a nossa eclesiologia envolve mudanças na referência de oficiais Cristãos para compreenderem a igreja, o ponto é bem considerado. Temos de continuar a financiar a IRBS e seus professores. No entanto, também temos de encontrar formas de dar assistência aos alunos que têm necessidade, como o princípio bíblico demonstra. Paulo argumenta em favor de um ministério remunerado em 1 Timóteo 5:17-18 (cf. CFB 26:10). Dar assistência financeira aos ministros potenciais parece não ser outra coisa senão uma implicação desse ensino. E a igreja não deve “considerar esta disposição um fardo, ou imaginar que, ao fazer isso, ela confere um favor. É tão claramente o seu dever, um dever que ela realmente deve ao seu Mestre e ela mesma, como a provisão normal que ela faz para a manutenção da Palavra e das Ordenanças. Ou melhor, é de se lamentar que ela não esteja acostumada a sempre considerar isto como uma parte essencial de sua provisão ordinária a manutenção dos meios de graça”19. Também há precedente histórico para tal prática. Na Assembleia Geral de 1689 os nossos antepassados Batistas Particulares determinaram a criação de um fundo de apoio à formação ministerial20. Devemos fazer o mesmo, especialmente a nível associativo. Igrejas individuais podem não ter os meios para ajudar a pagar os custos educacionais do aluno, mas como a nossa breve história demonstra há mais recursos disponíveis quando trabalhamos juntos.
Há uma palavra final sobre esta questão de treinamento ministerial. Nossas convicções exigem que nós encorajemos jovens qualificados a buscarem ensino de graduação apropriado como preparação para o seminário. A educação em artes liberais, bem abordada, é o estudo fundamental do livro da revelação natural, enquanto o seminário é o estudo concentrado no livro da revelação especial. Um diploma de bacharel é um pré-requisito necessário para a formação no seminário, e não como um mandato arbitrário da academia moderna, mas porque as Escrituras foram escritas em línguas antigas, têm sido aplicadas em períodos sucessivos de história, e precisam ser aplicadas à nossa era pós-moderna. Assim, um conhecimento rudimentar pelo menos nas línguas, história antiga e moderna, e várias escolas filosóficas de pensamento, pode revelar-se bastante útil na preparação para o estudo detalhado das Escrituras21.
Witsius estava correto quando ele declarou que “ninguém ensina bem, a menos que, primeiramente, ele tenha aprendido bem; ninguém aprende bem a não ser que ele aprenda a fim de ensinar”. É dever da igreja incentivar jovens qualificados a aprenderem bem, a fim de que eles possam ensinar bem. Isso requer claramente que a igreja seja ativa na assistência e formação de homens qualificados para a obra do ministério.
Em terceiro lugar, e, finalmente, a igreja deve ser ativa em recomendar, chamar e ordenar homens qualificados para o trabalho do ministério. De acordo com a nossa Confissão: “O caminho apontado por Cristo para o chamamento de qualquer pessoa, capacitada e dotada pelo Espírito Santo, para o ofício de bispo ou ancião em uma igreja, é que ele seja escolhido para isso pelo sufrágio comum da própria igreja e solenemente separado por jejum e oração, com a imposição das mãos do presbitério da igreja, se houver algum nela anteriormente constituído…” (CFB 26:9). A vocação e ordenação de um homem para o ministério do Evangelho é o culminar do dever da igreja para cultivar ministros da Palavra. As medidas para vocação e ordenação são claramente expostas nas Escrituras. A congregação, depois de analisar um homem em relação à presença das graças e dons necessários, vota sobre se deve ou não chamar o homem para servir a sua assembleia (cf. Atos 14:23). Após a aceitação do homem, os anciãos atuais da igreja impõem as mãos sobre ele, colocando-o formalmente separando para a obra do ministério (cf. 1 Timóteo 4:14). Mas como a igreja vem a conhecer o futuro ministro? Será que os nossos jovens por conta própria, após o seminário, dependentes de seus próprios meios, devem encontrar uma igreja em que eles possam servir?
A resposta a estas perguntas é encontrada na esquecida prática da recomendação ministerial, uma prática que quando bem compreendida e implementada pode ser uma grande ajuda para a nossa vida associativa. Paulo considerou Epafrodito e Tíquico como seus cooperadores no Evangelho, e assim foi capaz de recomendá-los para às igrejas em Filipos e Colossos, respectivamente (cf. Filemom 2:25; Colossenses 4:7). Enquanto o ministério apostólico de Paulo era único e para a era apostólica, a prática empregada por Paulo nes-sas duas ocasiões deve ser usada pela igreja em todas as épocas. No contexto em que estamos a discutir o chamado para o ministério, é preciso reconhecer que frequentar o seminário não abole os laços de um homem jovem em relação à igreja que o enviou. Ele deveria manter-se filiado à sua própria igreja, enquanto estivesse no seminário. Após a formatura, então, se a igreja do seminarista mantém a convicção de que este jovem possui as qualificações necessárias para o ministério, tal congregação pode recomendá-lo a uma igreja irmã em necessidade. Igrejas em que o aluno ministerial serviu como estagiário tam-bém podem executar essa função. Como o último passo neste processo, então, as igrejas devem recomendar, chamar e ordenar homens de evidente e capacidade para o ministério evangélico.
Conclusão. Se o nosso compromisso com a Fé Reformada significa alguma coisa, então vamos prontamente confessar que o nosso Deus Trino é soberano nesta questão de chamar os homens para o ministério. Nosso dever, no entanto, não é ficar ociosos. Pois pela soberana nomeação de Deus possuímos a responsabilidade de cultivar dentro de nossas igrejas ministros do Evangelho fiéis e capazes. Assim, devemos prestar atenção a esta exortação de Samuel Miller: “Sim, vocês que se chamam Cristãos! Se vocês amam a igreja à qual vocês professam pertencer; se vocês possuem uma única centelha do espírito de lealdade ao Seu Divino Cabeça e Senhor, ou melhor, se vocês não desejam que haja uma ‘fome da palavra da vida’ (Amós 8:11); se vocês desejam evitar que os mais pesados julgamentos espirituais venham sobre vocês, então, vão, e ajam, assim como falam, como amigos do reino do Redentor. Vamos em frente, dê a sua influência, a sua substância e suas orações, pois “ao socorro do Senhor com os valorosos” (Juízes 5:23).22
É minha oração sincera e honesta que esta discussão venha a ser frutífera em relação aos nossos esforços mútuos no Evangelho, e que, como resultado desta nossa aliança, Deus seja glorificado.
Na comunhão do Evangelho,
Stefan T. Lindblad.
Trinity Reformed Baptist Church (Kirkland, WA)