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Nós Deveríamos Pregar a Cristo em Cada Sermão?, por Fred Malone

A pregação fiel é expositiva, o que significa que ela explica um texto bíblico em seu contexto e aplica o texto aos ouvintes. Houve vezes, entretanto, quando eu ouvi pregações expositivas que faziam pouca ou nenhuma menção do Senhor Jesus Cristo (infelizmente, eu mesmo já fiz isso). Se um incrédulo estivesse sentado entre os ouvintes, ele não teria ouvido o suficiente do Evangelho para ser salvo. Além disso, os santos não teriam ouvido o suficiente de Cristo para movê-los a viver e obedecer por amor a Ele. As Escrituras ensinam que todo sermão expositivo deve ser centrado em Cristo.

 

A verdadeira pregação não é:

 

1. Um sermão expositivo, mesmo extraído de um texto do Novo Testamento, mas que não menciona Cristo, exceto em um apelo evangelístico no final.

2. Um sermão cheio de ilustrações e humor, enquanto apenas nominal e ocasionalmente menciona um texto ou o próprio Jesus Cristo.

3. Uma “série prática” sobre o casamento, sobre a alegria, etc., sem explicar como a pessoa e a obra de Jesus Cristo se aplicam ao casamento, à alegria, etc.

4. Um comentário corriqueiro sobre uma passagem da Escritura sem a pregação de Cristo, porque Ele não foi mencionado explicitamente no texto.

 

Nenhuma das medidas acima correspondem à exigência da pregação Bíblica. As Escrituras nos dão instruções claras sobre como pregar. Considere o seguinte:

 

1. Nosso Senhor Jesus Cristo e Seus Apóstolos, praticaram a pregação centrada em Cristo.

 

Cada palavra que nosso senhor proferiu em última análise foi sobre sua própria pessoa e trabalho como nosso Profeta, Sacerdote e Rei, mesmo quando Ele expôs textos do Antigo Testamento, os quais, nem sempre O mencionavam explicitamente. Os apóstolos de Cristo seguiam Seu exemplo em suas pregações. Todo sermão evangelístico em Atos e em cada epístola estava centrado em Jesus Cristo. As epístolas foram lidas às igrejas em sua totalidade, incluindo as partes sobre Cristo e o Evangelho. Em cada aplicação das epístolas, há sempre uma referência a Cristo, Sua pessoa e Sua obra. Não estou dizendo que o nome de Jesus Cristo foi mencionado em cada texto ensinado pelos apóstolos. O que estou dizendo é que Cristo foi o fundamento e o alvo na proclamação de cada palavra de Deus.

 

2. A Bíblia mandava pregar a Cristo aos incrédulos e aos crentes.

 

Primeiro, está claro que os apóstolos pregaram Jesus Cristo como Senhor e Salvador aos incrédulos (Atos 5:42, 8:35, 11:20). Jesus era o centro de sua mensagem. A primeira vez que Paulo foi a Corinto para pregar o Evangelho aos não convertidos, ele disse: “Porque nada me propus saber entre vós, senão a Jesus Cristo, e este crucificado” (1 Coríntios 2:2). Jesus Cristo era a substância da pregação evangelística de Paulo em Corinto. Pedro também pregou Cristo no dia de Pentecostes, bem como nas outras mensagens evangelísticas de Atos (Atos 2:10, 17).

 

Segundo, os Apóstolos pregavam Cristo aos crentes. Os Apóstolos constantemente ataram suas repreensões, exortações e instruções doutrinais à pessoa e obra de Cristo, passado, presente e futuro. É impossível ler as epístolas sem ver que a pessoa e a obra de Jesus Cristo são o ponto central da salvação e da santificação. Para os Colossenses, Paulo descreveu sua pregação e ensinamento aos Cristãos assim: “A quem anunciamos, admoestando a todo o homem, e ensinando a todo o homem em toda a sabedoria; para que apresentemos todo o homem perfeito em Jesus Cristo” (Colossenses 1:28). É preciso pouca pesquisa para ver como Paulo conectou suas exortações aos Cristãos coríntios à pessoa e à obra de Cristo por eles. Por exemplo, quando advertiu contra o adultério, Paulo disse: “Ou não sabeis que o vosso corpo é o templo do Espírito Santo, que habita em vós, proveniente de Deus, e que não sois de vós mesmos? Porque fostes comprados por bom preço; glorificai, pois, a Deus no vosso corpo” (1 Coríntios 6:19-20). Paulo baseou sua advertência contra o adultério na obra de Cristo. O próprio Cristo era a substância da pregação apostólica, tanto para os não convertidos como para os convertidos. A Bíblia ordena a pregação centrada em Cristo tanto para incrédulos como para crentes.

 

3. A Bíblia mandava pregar a Cristo em cada sermão de cada texto.

 

Em Gênesis 3:15, Jesus Cristo é declarado o centro da revelação de Deus para o homem. Adão representou toda a sua posteridade e caiu em pecado, quebrando o Pacto de Obras[1], que exigiu obediência perfeita para a vida. Mas Jesus Cristo, o último Adão, é o único mediador entre Deus e o homem. Cristo satisfez a justa ira de Deus no Pacto da Redenção e fez o que Adão não fez. Jesus Cristo é o único Salvador e Senhor de todos os que creem nEle. O Antigo Testamento registra o desdobramento da promessa de redenção em Cristo, encontrada em Gênesis 3:15. E o Novo Testamento revela como Cristo veio para cumprir aquela primeira promessa em Gênesis 3:15. A própria estrutura da Bíblia nos fornece um mandato teológico para pregar a Cristo em todas as Escrituras porque tanto o Antigo Testamento quanto o Novo Testamento são teologicamente centrados em Jesus Cristo.

 

Os pregadores no Antigo Testamento não pregavam da maneira que costumamos. Eles não tiraram um texto do Novo Testamento, analisaram, expuseram e aplicaram-no. O que eles pregaram? Eles pregavam a grande mensagem que lhes fora confiada, o grande corpo do verdadeiro Evangelho, toda a doutrina da salvação revelada de Gênesis ao Apocalipse. Meu argumento é que isto é o que devemos fazer sempre, embora o façamos através de exposições individuais de textos particulares. Esta é a relação entre teologia e pregação.

 

Portanto, queridos irmãos, vocês estão pregando o senhor Jesus Cristo em cada sermão expositivo? Poderia um incrédulo ser salvo através de sua exposição? Pode um crente ouvir o suficiente de Cristo para ser movido a amá-lO mais e a obedecer-Lhe pela fé que opera pelo amor? Que Deus nos ajude a proclamá-lO!

 

Por que Devemos pregar a Cristo em Cada Sermão?

 

A pergunta é: “Devemos pregar a Cristo em cada sermão?”. Minha Resposta é: “Sim”. Agora, devemos perguntar: “Por que devemos pregar a Cristo em cada sermão?”. Há dois pensamentos que eu daria em resposta a isso: (1) Hermenêutica Bíblica e o (2) Exemplo Bíblico.

 

A hermenêutica bíblica exige que preguemos a Cristo em cada Sermão.

 

A ascensão histórica da hermenêutica literal-gramatical-histórica na história da interpretação tem sido algo muito bom. Há concordância geral entre os professores evangélicos de que a Bíblia deve ser considerada literalmente (a menos que use metáfora, tipologia, alegoria, parábola, etc.), gramaticalmente (usando as linguagens originais para exegese) e historicamente (lidando com o contexto histórico do texto). Como parte desse método, também incluímos a ideia de “Escritura interpretando Escritura”. Essa é a base analisar um texto e, em seguida, expô-lo no sermão. Este método destina-se a evitar a eisegese num texto para ser fiel à Palavra específica de Deus. Às vezes, esse método é usado para justificar não pregar a Cristo em cada sermão se Ele não é mencionado especificamente no texto, especialmente ao expor um texto do Antigo Testamento.

 

No entanto, a exegese histórica-gramatical não representa a totalidade do método hermenêutico utilizado pelos intérpretes Reformados. A hermenêutica Reformada adota a exegese gramatical-histórica-teológica. A adição da exegese teológica para cada texto é as vezes chamada de “analogia da fé”. Isso significa que a exegese de cada texto deve olhar para o contexto teológico completo em que reside; ou seja, o lugar na história bíblica, o contexto pactual em que está localizada e a sua relação com a teologia geral da Escritura. Isso significa que a teologia total da Escritura, que é centrada em Cristo, deve ser incluída na exegese plena do texto. Isto não é eisegeses. É uma exegese teológica.

 

Deixe-me acrescentar que esse elemento teológico na hermenêutica não é o exatamente a mesma coisa que “a Escritura interpreta as Escrituras”. Um exegeta pode usar referências cruzadas ou estudo de palavras de um texto, comparando Escritura com Escritura e ainda assim perder a teologia geral da Escritura na exegese. A analogia da fé, ao interpretar o texto, leva em conta todo o conselho de Deus, a fé que uma vez por todas foi entregue aos santos. Por exemplo, ao pregar em um texto do Antigo Testamento, pode-se usar o método literal-gramatical-histórico incluindo a Escritura interpretando as Escrituras em referências cruzadas e estudos de palavras, expondo o texto fielmente em seu significado original no Antigo Testamento. No entanto, nosso Senhor explicou que Ele veio para cumprir a Lei e os Profetas (Mateus 5:17). Explicar o texto do Antigo Testamento e expor seu significado contextual original sem levar em conta como nosso Senhor o cumpriu em Sua pessoa e em Sua obra é o mesmo que ignorar a interpretação teológica completa do texto. Assim, pode-se expor com precisão o texto do Antigo Testamento e seu significado no contexto sem seu pleno significado teológico à luz da conclusão de toda revelação de acordo com a analogia da fé.

 

Pregar a Cristo em cada sermão é algo mais do que apenas pregar um texto em seu significado literal-gramatical-histórico, e depois ir para uma explicação desconexa do Evangelho. Em vez disso, pregar a Cristo em cada sermão é explicar como esse texto está conectado e cumprido teologicamente em Jesus Cristo, o centro teológico de Deus para o homem. Este método não rebaixa o Antigo Testamento como menos inspirado ou não tão importante quanto o Novo Testamento, essa suposição não é útil e nem precisa, pois, isso reconhece que todo texto do Antigo Testamento alcança seu pleno significado à medida que contribui para a revelação de Jesus Cristo em todas as Escrituras.

 

Mais uma coisa sobre o método teológico de interpretação: Ele reconhece que todos os homens nascem condenados sob a lei na Queda de Adão e que a partir de Gênesis 3:15, o resto da Escritura revela a vinda de Cristo sob a graça. Esta é a antiga teologia da Lei e do Evangelho que foi central para a redescoberta do Evangelho na Reforma. Toda a Escritura deve ser interpretada à luz da teologia da Lei e do Evangelho que revela Jesus Cristo ao homem. Isso permite que o expositor pregue o Evangelho em cada sermão legitimamente e sem eisegeses. Charles Bridges, em The Christian Ministry [O Ministro Cristão], disse:

 

A marca de um ministro “aprovado por Deus, um obreiro que não tem de que se envergonhar”, é que ele “maneja bem a palavra da verdade”. Isso implica uma aplicação direta e completa do Evangelho à massa de seus ouvintes não convertidos, combinado com um corpo de instruções espirituais para as várias classes de cristãos. Seu sistema será marcado pela simetria bíblica e pela abrangência. Ela abraçará toda a revelação de Deus, em suas instruções doutrinárias, privilégios experimentais e resultados práticos. Essa revelação é dividida em duas partes — a Lei e o Evangelho — tão essencialmente distintas entre si, embora tão intimamente ligadas, que um conhecimento preciso de nenhuma delas pode ser obtido com a outra.

 

O exemplo bíblico nos obriga a pregar a Cristo em cada sermão.

 

Vivemos agora sob a Nova Aliança de Jesus Cristo, a revelação completa de Deus para o homem. Recebemos a plena revelação de Deus na fé, uma vez por todas entregue aos santos. Nosso exemplo de pregação e ensino é agora exibido em como Cristo e seus apóstolos pregavam e ensinavam. Seu ensinamento acerca de Si mesmo, cada sermão em Atos aos incrédulos e cada epístola aos crentes são totalmente centrados em Cristo. Mesmo se tomarmos um texto de Cristo ou os escritos dos apóstolos que não mencionavam explicitamente o Senhor Jesus Cristo, eles devem ser explicados à luz de todo o seu ensinamento no contexto de Sua mensagem e toda a mensagem da epístola. Esses são nossos exemplos de pregação bíblica sob a Nova Aliança.

 

Para exemplos modernos de tal pregação, você só tem que olhar para o maior pregador do século XIX, Charles Spurgeon e para o maior pregador do século XX, Martyn Lloyd-Jones. Ambos seguiram o método gramatical-histórico-teológico da hermenêutica para pregar a Cristo em todas as Escrituras.

 

Como devemos pregar a Cristo em cada sermão?

 

Agora nós temos duas perguntas: “Devemos pregar a Cristo em cada sermão?” e “Por que devemos pregar a Cristo em cada sermão?”. Agora, devemos fazer outra pergunta: “Como devemos pregar a Cristo em cada sermão?”, em outras palavras, É possível pregar a Cristo em cada sermão com integridade hermenêutica? Eu acredito que é possível e necessário. Mas como se pode fazer isso? Aqui, proponho dois princípios seguidos por um exemplo.

 

1. Devemos lembrar que somos ministros da Nova Aliança.

 

Paulo ensinou que somos ministros da Nova Aliança (2 Coríntios 3:6). Isso significa que a Nova Aliança de Jesus Cristo governa todo o nosso ministério. Os ministros da Nova Aliança não são livres para serem neutros ao examinarem qualquer texto. Pensar que eles deveriam ser, é uma falácia da erudição bíblica. Nós devemos nos aproximar de qualquer texto como ministros da Nova Aliança.

 

A fé foi dada uma vez por todas aos santos em Cristo através da revelação da Nova Aliança. A revelação de Jesus feita pela Nova Aliança é o nosso contexto ministerial, histórico e bíblico-teológico. Jesus veio para cumprir a Lei e os Profetas e para estabelecer Sua Nova Aliança, a única aliança salvífica nas Escrituras. Desde que Adão quebrou a lei de Deus no Jardim do Éden, todo o Antigo Testamento procede da promessa do Evangelho de Gênesis 3:15 que apontava para a plena revelação de Jesus Cristo como a “semente da mulher” que destruiria “a serpente e sua semente”. O último Adão cumpriu a lei quebrada pelo primeiro Adão e a promessa do Evangelho de Gênesis 3:15 em sua Nova Aliança. Como ministro da Nova Aliança de Cristo, tudo o que ensinamos deve ser visto através dessa lente.

 

Parafraseando Agostinho: “O Novo está no Antigo, velado; e o Antigo está no Novo, revelado”. Nessa luz, toda a Escritura é, em última análise, sobre a revelação de Jesus Cristo para a humanidade caída e para a glória de Deus. Jesus é nosso ponto de partida e ponto final em cada sermão da Nova Aliança. Ele é o Autor e Consumador da fé. Ele é o Alfa e o Ômega, o Começo e o Fim, da revelação de Deus para o homem.

 

2. Devemos exercer a hermenêutica completa.

 

Primeiro, devemos interpretar cada texto gramaticalmente, entendendo o significado original das palavras. Em segundo lugar, devemos interpretar esse texto em seu contexto histórico-redentor, entendendo a quem Deus está falando e o que Ele está dizendo em seu contexto histórico. Mas em terceiro lugar, devemos interpretar cada texto teologicamente em termos da revelação completa de Deus para o homem. Esse é o método hermenêutico gramatical-histórico Reformado.

 

Este terceiro princípio de “interpretação teológica” é mais do que “Escritura interpretando as Escrituras” citando referências cruzadas. Envolve mostrar como cada texto bíblico se encaixa na teologia completa da Escritura. Tudo no que diz respeito à teologia exegética, à teologia bíblica e à teologia sistemática serve para a “analogia geral da fé”, a qual expôe cada texto das Escrituras à luz de “todo o conselho de Deus”. De alguma forma, cada passagem é enquadrada pela revelação completa sobre Jesus Cristo; portanto, cada passagem deve ser interpretada e proclamada à luz dEle. Nenhuma parte da Escritura pode ser interpretada plenamente sem que compreendamos sua conexão hermenêutica última com a revelação de Jesus Cristo ao homem para a glória de Deus Pai.

 


[1] Para saber mais sobre o que é “Pacto de Obras” e “Pacto da Redenção”, leia o magistral, didático e esclarecedor texto Três Pactos de Deus: Pacto de Obras, Pacto da Graça e Pacto da Redenção, por Pascal Denault, um dos melhores teólogos pactuais de nosso tempo. ‒ N.R.