“Escreve: Bem-aventurados os mortos que desde agora morrem no Senhor. Sim, diz o Espírito, para que descansem dos seus trabalhos, e as suas obras os seguem.” (Apocalipse 14:13)
Há duas coisas notáveis na maneira em que estas palavras são mostradas a nós.
I. Elas são as palavras do Pai ecoadas através do Espírito. “Eu ouvi uma voz do céu”. “Sim, diz o Espírito”. Os olhos de João haviam se fixado na visão maravilhosa mencionada no versículo 1 em que o Cordeiro estava sobre o monte Sião, e 144 mil remidos O seguiam onde quer que Ele fosse, quando de repente uma voz mansa e delicada rompeu do céu, di-zendo: “Escreve: Bem-aventurados os mortos”; e então o Espírito Santo soprou Amém, “Sim, diz o Espírito”.
Está escrito na Lei que o depoimento de duas testemunhas é verdadeiro. Agora, aqui estão duas testemunhas: o Pai de todos e do Espírito Santo, o Consolador, testemunham que é uma coisa feliz morrer no Senhor. Existe alguns de vocês, filhos de Deus, que tremem só de pensar em morrer? Será que a morte parece um monstro com um dardo terrível pronto para destruí-los? Aqui, estão duas testemunhas doces e benditas que declaram que a morte perdeu seu aguilhão, que a sepultura perdeu a sua vitória. Ouça, e a carranca desaparecerá da testa da morte, o vale será cheio de luz; o Pai e o Espírito Santo, ambos se unem, dizendo: “Bem-aventurados os mortos”.
II. “Escreve”. Tudo o que está escrito é mais durável e menos passível de ser corrompido do que aquilo que é somente falado de boca a boca. Por isso Deus deu aos Israelitas os Dez Mandamentos, escritos com o Seu próprio dedo em duas tábuas de pedra. Pela mesma razão Ele lhes ordenou, que no dia em eles passassem o Jordão, fossem erguidas grandes pedras, e escritas sobre elas todas as palavras desta Lei. Pela mesma razão, Deus ordenou aos Seus servos, os profetas, que escrevessem as Suas Profecias, e os apóstolos que escrevessem Seus Evangelhos e Epístolas, para que pudéssemos ter uma Bíblia permanente em vez de tradição flutuante. Por esta razão, Jó desejou que suas palavras fossem escritas: “Quem me dera agora, que as minhas palavras fossem escritas! Quem me dera, fossem gravadas num livro! E que, com pena de ferro, e com chumbo, para sempre fossem esculpidas na rocha. Porque eu sei que o meu Redentor vive” (Jó 19:23-25). Foi um dos seus preciosos e sempre memoráveis provérbios, que dizemos para confortar o coração de um crente caído nas horas mais escuras: “Eu sei que o meu Redentor vive”. A mesma razão fez a voz do céu dizer: “Escreve”, não ouvir o que seria dito, mas escrevê-lo, e registrá-lo em um livro, com pena de ferro, e com chumbo, que para sempre fosse esculpido na rocha.
“Bem-aventurados os mortos”. Saiba o valor deste dito. É uma declaração de ouro, há ouro em cada sílaba dela. Ela é mais doce do que o mel e o destilar dos favos; mais preciosa do que o ouro, sim, muito ouro refinado. Isso é precioso aos olhos de Deus. Escreva-o no mais íntimo de seus corações; isso vai solenizar a sua vida, e vai guarda-lo de ser levado por vãos espetáculos. Isso fará inconvenientes e fora de sintonia os barulhos de sirenes deste mundo; isso docemente o acalmará na hora da adversidade; isso retirará da morte o seu aguilhão, e da sepultura a sua vitória. Escreva, escreva-o no mais íntimo de seu coração: “Bem-aventurados os mortos que morrem no Senhor”.
Agora, considere as próprias palavras.
1. “Bem-aventurados os mortos”. O mundo diz: “Bem-aventurados os vivos”; mas Deus diz: “Bem-aventurados os mortos”. O mundo julga pelos seus sentidos, segundo a aparência exterior, de acordo com o juízo dos homens; Deus julga as coisas pelo que elas realmente são em si mesmas; Ele olha para as coisas em sua verdadeira cor e magnitude. O mundo diz: “Melhor é o cão vivo do que o leão morto”. O mundo olha sobre as suas famílias, surgindo como uma nova flor desabrochando na manhã, suas bochechas coradas com o florescer da saúde, seus passos firmes com a flexibilidade da juventude, riquezas e luxúrias ao seu controle, dias resplandecentes de verão diante deles. O mundo diz: “Há uma alma feliz”. Deus nos leva para a sala escura, onde alguns de Seus filhos habitaram ultimamente. Ele aponta para o rosto pálido onde a morte está entronizada, para a bochecha desfigurada por longa doença, o olho vidrado na morte, as mãos duras cruzadas sobre o peito, os amigos que estão chorando por ali, e Ele sussurra em nossos ouvidos: “Bem-aventurados os mortos”. Ah, queridos amigos, pensem um momento! Deus ou vocês sabem o que é melhor? Quem será encontrado estar certo, por fim? Infelizmente, que vaidade você demonstra ao estar andando assim! Inquieto em vão. “O homem que está em honra, e não tem entendimento, é semelhante aos animais, que perecem” [Salmos 49:20]. Mesmo os filhos de Deus às vezes dizem: “Bem-aventurados os vivos”. É uma coisa feliz viver na graça de Deus; ter paz com Deus, frequentar o trono da graça, queimar o incenso perpétuo de louvor, meditar sobre Sua Palavra, ouvir a pregação do evangelho, servir a Deus; até mesmo lutar, correr e combater em Seu serviço é algo doce. Ainda assim, Deus diz: “Bem-aventurados os mortos”. Se eles se alegram em ter o Seu sorriso aqui, quanto mais felizes eles serão quando O virem sem nenhuma nuvem! Se é doce o crescimento do milho do Senhor aqui, quanto melhor quando Ele o recolher no Seu celeiro! Se é doce ter uma âncora dentro do véu, quanto melhor será quando nós mesmos entrarmos ali, onde a tristeza não pode entrar! “Na tua presença há fartura de alegrias; à tua mão direita há delícias perpetuamente” [Salmos 16:11]. Mesmo Jesus sentiu isso, Deus atesta: “Bem-aventurados os mortos”.
2. Não todos os mortos, mas somente aqueles que “morrem no Senhor”. É realmente incrível a multidão dos que morrem. “Tu os levas como uma corrente de água” [Salmos 90:5]. Setenta mil morrem todos os dias, cerca de cinquenta a cada minuto, quase um a cada segundo, passando por cima da linha final. A vida é como uma corrente formada por seres humanos, deitados nela, e correndo para o fim, para a eternidade. Todos estes são bem-aventurados? Ah, não. “Bem-aventurados os mortos que morrem no Senhor”. De toda aquela vasta multidão sendo continuamente despejada na eternidade somente um pequeno número têm crido de maneira salvífica em Jesus. “E porque estreita é a porta, e apertado o caminho que leva à vida, e poucos há que a encontrem” [Mateus 7:14]. Não são todos os mortos que são bem-aventurados. Não há bênção para aqueles que morrem sem Cristo; eles correm para uma eternidade, não perdoados, profanos. Você pode colocar seu corpo em um caixão esplêndido; você pode gravar o seu nome em prata na tampa; você pode trazer uma companhia bem-vestida de carpideiras para o funeral em vestes com um tom solene de preto; você pode deitar o caixão lentamente na sepultura; você pode cultivar o gramado mais verde sobre a sepultura; você pode cultivar as flores mais belas sobre ele; você pode cortar uma pedra branca, e gravar um gentil epitáfio para a sua memória; ainda assim estes nada mais são senão o funeral de uma alma condenada. Você não pode escrever “bendito” onde Deus tem escrito “maldito”. “Aquele que crê será salvo; quem não crer será condenado”.
Considere o que está implícito nas palavras, “no Senhor”. 1. Que eles se juntaram ao Senhor. A união com o Senhor tem um começo. Todo aquele que é bem-aventurado na morte foi antes convertido. Você pode não gostar desta palavra, mas isso é a verdade. Eles foram despertados; começaram a clamar, a orar, a chorar, enquanto buscavam ao Senhor, seu Deus. Eles se viram perdido, arruinados, impotentes; como quem não pode ser justo perante um Deus santo. Eles se tornaram como meninos. O Senhor Jesus se aproximou, e revelou-Se a eles, dizendo: “Eu sou o pão da vida”. “O que vem a mim, de modo algum lançarei fora”. Eles creram e se tornaram bem-aventurados e regozijaram-se no Senhor Jesus; reputando tudo como perda para ganhar a Cristo. Entregaram-se ao Senhor. Este foi o início de sua existência em Cristo.
Queridos amigos, este começo já aconteceu com vocês? Vocês têm sido convertidos, já nasceram de novo e foram enxertados? Chame isto como vocês quiserem, mas estas coisas já aconteceram com vocês? Essa união com Cristo já ocorreu em sua história? Alguns dizem: eu não sei. Se em algum momento de sua vida você fosse salvo de um afogamento, se estivesse realmente se afogando e fosse trazido à vida novamente, você se lembraria da hora de sua “morte”. Muito mais se você tivesse sido levado a Cristo. Se você tivesse nascido cego, e por alguma operação notável seus olhos fossem abertos quando você já estivesse adulto, você esqueceria? Então, se você tivesse sido verdadeiramente enxertado em Cristo, você se lembraria facilmente. Se não, você morrerá em seus pecados. Para onde Cristo foi você não pode ir. “Se não vos arrependerdes, todos de igual modo perecereis” [Lucas 13:5].
3. A perseverança está implícita. Nem todos os que parecem, de fato são ramos da videira verdadeira. Muitos galhos caem das árvores quando os fortes ventos começam a soprar, e todos estes são ramos podres. Assim, em momentos de tentação, ou provação, ou perseguição, muitos falsos professos retrocedem. Muitos que pareciam ser crentes voltaram para trás e já não andavam com Jesus. Eles seguiam Jesus; oravam com Ele; O louvavam, mas eles voltaram para trás, e já não andavam com Ele. Assim ocorre ainda hoje. Muitos entre nós, sem dúvida, parecem ser convertidos, eles começam bem e são promissores, mas cairão quando chegar o inverno. Alguns, eu temo, já caíram; alguns mais podem ser esperados segui-los. Estes não serão bem-aventurados quando morrerem. Oh! de todos os leitos de morte, que eu seja impedido de ver o leito de morte de tal professo caído! Eu já vi isso antes, e eu espero que eu nunca venha a ver novamente. Eles não serão abençoados após a morte. Os galhos podres queimarão mais ferozmente nas chamas. Oh! Pense em que tormento será pensar que você passou sua vida fingindo ser um Cristão, e perdeu a oportunidade de se tornar um de fato! O inferno será tanto mais profundo, mais sombrio, mais quente, para aqueles que mais conheciam sobre Cristo, e estavam tão perto dEle, mas não O acharam. Bem-aventurados são aqueles que perseveram até o fim, que não se afastam de sua esperança no Evangelho; quando os outros forem embora, que digamos: “Senhor, para quem iremos?” Na prosperidade, eles seguem o Senhor totalmente; na adversidade, eles unem-se a Ele ainda mais proximamente, como árvores fincam suas raízes mais profundas durante as tempestades. É este o seu caso? Suporte até o fim. “Não vos movam da esperança do evangelho” [Colossenses 1:23]. “Porque nos tornamos participantes de Cristo, se retivermos firmemente o princípio da nossa confiança até ao fim” [Hebreus 3:14]. Mesmo no vale escuro você ainda deverá se apegar a Ele. Vamos a Ele como nós fomos pela primeira vez, como uma criatura culpada, agarrando-se ao Senhor, nossa Justiça. Tu carregaste o meu pecado. Isto é morrer no Senhor, e isso é ser bem-aventurado.
III. Razões pelas quais eles são abençoados.
1. Por causa do tempo, “desde agora”. O tempo das perseguições do Papado foi chegando. Ele estava consumindo os santos do Altíssimo; ele venceu e matou os seguidores do Cordeiro. Bem-aventurados são aqueles que são retirados do mal por vir. Perece o justo, e não há quem considere isso em seu coração. Os homens piedosos são recolhidos, sem que alguém considere que o justo é levado antes do mal [Isaías 57:1]. Esta é uma das razões por que é melhor estar com Cristo. Perseguições e problemas não são fáceis de suportar estando em carne e osso. Se em nossos dias, fôssemos chamados a estes, nós teríamos que suportá-los corajosamente, sabendo que uma boa recompensa é fornecida para aqueles que superam estas coisas: Veja Apocalipse 2:3: “E sofreste, e tens paciência; e trabalhaste pelo meu nome, e não te cansaste”. Mas se for a vontade de Deus recolher-nos antes que o dia do julgamento chegue, temos que dizer: “Bem-aventurados os mortos que desde agora morrem no Senhor”. Não haverá perseguições ali. Todos são amigos de Jesus ali, cada um tendo coroas que lançaram aos Seus pés, para exaltá-lO em seu mais alto louvor. Não há discórdia. Ninguém repreenderá os nossos cânticos ali.
2. Eles descansam dos seus trabalhos. O que faz com que tudo seja trabalhoso aqui é o pecado; a oposição de Satanás e do mundo, e a inclinação de nossa velha natureza. Alguns crentes têm uma luta constante com Satanás. Ele está em pé à sua mão direita, para resistir a eles; ele está constantemente distraindo-os em oração, arremessando dardos inflamados em sua alma, tentando com o pecado mais horrendo. Toda a sua vida é um trabalho. Mas quando morremos no Senhor, vamos descansar deste trabalho. A obra de Satanás será finalmente arruinada. O acusador dos irmãos não mais incomodará. Nenhum leão estará ali, nem qualquer animal feroz, mas somente os remidos andarão por ali. Mas acima de tudo, também não estarão ali o coração perverso, o velho homem, o corpo do pecado, que torna esta vida um trabalho terrível. Quando acordamos de manhã, encontramos como que um peso sobre nós. Quando corremos no caminho dos mandamentos de Deus, algo como que nos arrasta para trás. Quando queremos voar, algo nos puxa para baixo. Quando nós oramos, a nossa boca se enche com outras coisas. “Miserável homem que eu sou”. Mas partir e estar com Cristo, é ficar livre destas coisas. Vamos deixar este corpo de pecado completamente. Não haverá mais algo carnal, seremos completamente espirituais, novos homens; não haverá mais qualquer peso ou inclinação má; vamos descansar de nossos labores. Oh, isto é o que faz a morte no Senhor ser uma bem-aventurança. Vamos descansar de todo o trabalho; seremos como os anjos de Deus; vamos assistir de dia e de noite no Seu templo. Não vamos descansar de nossa obra, mas de nosso enfado. Ali não haverá labuta, nem dor em nosso trabalho. Vamos descansar em nosso trabalho. Oh, que isso faça com que você anele por partir, e faça a morte parecer agradável, e o céu um lar. “Vamos descansar de nosso trabalho”. Este é o mundo do amor santo, onde daremos livre, completa, espontânea e incansável expressão ao nosso amor para sempre.
3. Suas obras os seguem. Nossas boas obras feitas em nome de Jesus serão recompensadas. Primeiro, observem, que elas não vão adiante da alma. Não é por causa delas que seremos aceitos. Devemos ser aceitos, primeira e completamente por causa dAquele em Quem estamos. Segundo, nossas más obras serão esquecidas, enterradas nas profundezas do mar, esquecidas, não mais mencionadas. Terceiro, tudo o que temos feito por amor a Jesus, será, então, recompensado. Podemos esquecê-los, e dizer a Jesus: “Quando te vimos enfermo, ou na prisão, e fomos visitar-te?” Mas Ele não vai esquecê-los: “Em verdade vos digo que quando o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes” [Mateus 25:40]. Um copo de água fria não ficará sem recompensa. Olhem para o galardão, queridos amigos, e Ele retirará o aguilhão da morte.
IV. O que se seguiu. O Senhor Jesus “lançou a Sua foice, e segou”. Veja os versículos 14 e 15 de Apocalipse 14.
1. Saiba que o Senhor Jesus reúne os Seus molhos antes de uma tempestade, assim como os agricultores o fazem; então, quando você vê os santos maduros sendo reunidos, não se esqueça de que uma tempestade se aproxima.
2. Saiba que Jesus reúne os Seus santos em amor. Quando Jesus reúne os Seus, Ele o faz com amor. Não chorem por eles como aqueles que não têm esperança. Jesus reuniu-os em Seu seio. Eles brilharão como o sol.
Janeiro 1843.