“Nós o amamos a ele porque ele nos amou primeiro.” (1 João 4:19)
O amor tem como seu pai o amor de Deus derramado em nossos corações. Mas depois que ele é divinamente gerado em nosso coração deve ser DIVINAMENTE NUTRIDO. O amor é exótico. Não é uma planta que vai nutrir-se naturalmente no solo humano. O amor a Deus é uma coisa rica e rara. Ele morreria se fosse deixado para ser congelado pelas explosões frias de nosso egoísmo. E se ele não recebesse nenhum alimento, senão o que fosse tirado da rocha de nossos próprios corações duros, ele pereceria. Como o amor vem do Céu, logo, deve alimentar-se de pão celestial! Ele não pode existir neste deserto se não for alimentado de cima e alimentado por maná do Alto. De que, então, o amor se alimenta? Ora, se alimenta de amor. Aquilo que veio a produzi-lo torna-se o seu alimento. “Nós amamos porque ele nos amou primeiro”. O motivo constante e poder de sustentação do nosso amor a Deus é o Seu amor por nós! E aqui, deixe-me observar que existem diferentes tipos de alimentos neste grande celeiro do amor. Quando somos inicialmente renovados, o único alimento com que podemos viver é o leite, porque somos bebês, e assim, ainda não temos força para nos alimentar de verdades mais elevadas de Deus.
A primeira coisa, então, do que o nosso amor se alimenta, quando é apenas uma criança, é um senso de favores recebidos. Pergunte a um jovem Cristão porque ele ama a Cristo e ele lhe dirá: “Eu amo a Cristo porque Ele me comprou com o Seu sangue!”. Por que você ama a Deus, o Pai? Eu amo a Deus, o Pai, porque Ele deu Seu Filho por mim”. E por que você ama a Deus o Espírito? “Eu O amo porque Ele renovou meu coração”. Tudo isso é para dizer que amamos a Deus pelo que Ele nos deu! Nosso primeiro amor se alimenta da comida simples de uma recordação grata das misericórdias recebidas. E observe, por mais que cresçamos na graça, isto sempre constituirá uma grande parte da nutrição de nosso amor.
Mas quando o Cristão cresce e tem mais graça Divina, ele ama a Cristo por outra razão. Ele ama a Cristo, porque ele sente que Cristo merece ser amado! Confio que agora eu posso dizer que eu tenho em meu coração um amor a Deus. Os apóstolos não se limitaram a amar a Cristo pelo que Ele havia feito por eles. Você encontrará em seus sonetos e em suas letras que o motivo do amor é que Ele tinha comunhão com eles; Ele lhes mostrou as mãos e o lado! Eles haviam caminhado com Ele nas aldeias. Eles haviam permanecido com Ele em canteiros de bálsamo. Eles haviam entrado no círculo místico da comunhão. Eles sentiram que eles amavam a Cristo porque Ele era todo glorioso e era tão divinamente justo que, se todas as nações pudessem contemplá-lO, com certeza elas O amariam também!
Este, então, é o alimento do amor. Mas, quando o amor cresce rico — e isso às vezes acontece — o coração mais amoroso esfria para com Cristo. Você sabe que o único alimento que se adequa ao amor enfermo é o alimento com que ele se alimentou no início? Ouvi dizer por médicos que se um homem está doente, não há lugar tão bem adaptado para ele como o lugar onde ele nasceu. E se o amor cresce doente e frio, não há lugar tão saudável para que ele vá como o lugar onde ele nasceu, ou seja, o amor de Deus em Cristo Jesus, nosso Senhor! Onde nasceu o amor? Ele nasceu em meio ao cenário romântico e foi cuida-do com contemplações maravilhosas sobre o colo da beleza? Ah, não! Ele nasceu no escar-pado do Sinai, quando Deus veio do Sinai e o Santo do monte Parã e derreteu as monta-nhas com o toque de Seu pé e fez as pedras descerem como cera diante de Sua terrível Presença? Ah, não! Nasceu no Tabor quando o Salvador foi transfigurado e Suas vestes tornaram-se mais brancas do que a lã, mais brancas do que qualquer lavandeiro poderia fazê-lo? Ah, não, a escuridão apressou a visão de quem olhou para Ele, em seguida, e eles adormeceram, pois a glória os dominou! Deixe-me dizer-lhe onde o amor nasceu. O amor nasceu no Jardim do Getsêmani, onde Jesus suou grandes gotas de sangue. Foi alimentado no Palácio de Pilatos, onde Jesus mostrou Suas costas para o arar do chicote e deu Seu corpo para ser cuspido e açoitado. O amor foi alimentado na cruz, em meio aos gemidos de um Deus expirando, sob as gotas de Seu sangue; o amor foi nutrido ali. Sois minhas testemunhas, filhos de Deus! De onde veio o vosso nascimento, senão a partir do pé da cruz? Você já viu essa doce flor crescer em qualquer lugar, senão ao pé do Calvário? Não. Isso foi quando você viu “o amor Divino, todos os amores excedendo”, superando a si mesmo. Foi quando você viu o amor cativo de si mesmo, morrendo por Seu próprio desígnio, entregando a Sua vida, ainda que tinha poder para retê-la e tomá-la de novo. Foi ali que o seu amor nasceu. E se você quiser que o seu amor, quando ele estiver enfermo, seja resta-urado, leve o para alguns desses doces lugares! Faça-o sentar-se à sombra das oliveiras e faça-o ficar no chão, olhando quando o sangue ainda cai. Leve-o para a cruz e lance um olhar, e veja de novo o Cordeiro sangrando! E, certamente, isto tornará a sua nascente de amor de um anão em um gigante, e isso deve atiça-lo de uma faísca em uma chama.
E então, quando seu amor for assim recrutado, permita-lhe exortar-lhe a dar ao seu amor pleno exercício, pois assim ele deve crescer. Você diz: “Onde devo exercitar a contempla-ção de meu amor, para fazê-lo crescer?”. Ó, sagrada pomba de amor, estique suas asas e imite a águia. Vamos venha! Abra bem os olhos e olhe plenamente o rosto do sol e voe pa-ra cima, para cima, para cima, muito acima dos patamares de criação deste mundo, para cima, até que você esteja perdido na eternidade! Lembre-se que Deus o amou desde antes da fundação do mundo. Isso não fortalece o seu amor? Ah, que ar revigorante é aquele ar da eternidade!? Quando voo para ele por um momento e penso na grande doutrina da eleição,
“Esse grande amor sem medida que desde os dias da antiguidade
Abraçou toda a semente escolhida, como ovelhas no redil.”
Faz com que as lágrimas escorram pelo meu rosto pensar que devemos ter uma participação no decreto e conselho do Todo-Poderoso Triuno, no qual todos os que seriam comprados com sangue tiveram o seu nome inscrito no livro eterno de Deus! Venha, alma, exercite suas asas um pouco e veja se isso não faz você amar a Deus! Ele pensou em você antes que você viesse à existência! Quando o sol e a lua não existiam, quando o sol, a lua e as estrelas dormiam na mente de Deus, como florestas não nascidas em uma casca de noz, quando o velho mar ainda não nascera, muito antes que este mundo infantil estivesse em seus cueiros de neblina, Deus tinha inscrito o seu nome no coração e nas mãos de Cristo, de forma indelével, de modo a permanecer para sempre! E isso não faz você amar a Deus? Não é este o doce exercício para o seu amor? Pois, aqui o meu texto chega, oferecendo, por assim dizer, a última demanda nesta doce batalha do amor — uma acusação que varre tudo diante de si: “Nós amamos a Deus porque Ele nos amou primeiro”, considerando que Ele nos amou antes dos tempos se iniciarem e quando Ele morava sozinho na eternidade.
E enquanto temos subido para trás, para a eternidade passada, eu ainda tenho um outro voo para você. Suba para trás com toda a sua própria experiência e pense no modo pelo qual o Senhor teu Deus te guiou no deserto! Pense em como Ele te alimentou e vestiu todos os dias, como Ele te suportou com os teus maus modos, como Ele Se dispôs em todas as tuas murmurações e todos os teus anseios pelas panelas de carne do Egito, como Ele fendeu a Rocha para saciar-te e alimentou-te com o maná que desceu do céu! Pense em como Sua graça tem sido suficiente para ti em todos os teus problemas, como o Seu sangue foi um perdão para ti em todos os teus pecados, como a Sua vara e Seu cajado têm te consolado!
E quando você tiver voado sobre este doce campo de amor, você pode voar mais longe e lembrar que o juramento, o Pacto, o sangue, têm algo mais neles do que no passado, pois, então “Ele nos amou primeiro”, mas isso não significa que Ele deixará de amar, pois Ele é o Alfa e o Ômega, Ele é o primeiro e será o último! E, portanto, lembre-se, quando você passar pelo vale da sombra da morte, você não precisará temer nenhum mal porque Ele estará contigo! Quando você estiver nas frias inundações do Jordão, você não precisa ter medo, pois a morte não poderá separar você de Seu amor! E quando você entrar nos mistérios da eternidade, você não precisará tremer, pois, “estou certo de que, nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir, Nem a altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor” [Romanos 8:38-39]. E agora, alma, o seu amor não foi renovado? Isso não faz você amá-lO? Um voo sobre essas planícies ilimitadas de amor não inflamou o seu coração e o compeliu a deleitar-se no Senhor seu Deus? Aqui está o alimento do amor: “Nós amamos porque ele nos amou primeiro”, e neste primeiro amor há o compromisso e a promessa de que Ele nos amará até o fim!
Excerto do Sermão “Amor” (Nº 229), pregado na manhã de Sabath, 19 de dezembro de 1858, por C. H. Spurgeon, no Music Hall, Royal Surrey Gardens.