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Um Comentário da Confissão de Fé Batista de 1689, por Gary Marble: Capítulo 5, Sobre a Divina Providência

Um Comentário Da Confissão De Fé Batista De 1689
 

Capítulo 5*, Sobre a Divina Providência

 

 

1. Deus, o bom Criador de todas as coisas, em Seu infinito poder e sabedoria, sustenta, dirige, dispõe e governa todas as criaturas1, e coisas, desde a maior até a menor2, por Sua mui sábia e santa providência, para o fim para o qual foram criadas, segundo a Sua infalível presciência, e o livre e imutável conselho de Sua própria vontade, para o louvor da glória de Sua sabedoria, poder, justiça, infinita bondade e misericórdia.3 (1 Hebreus 1:3; Jó 38:11; Isaías 46:10-11; Salmos 135:6 • 2 Mateus 10:29-31 • 3 Efésios 1:11).

Nós passamos agora à segunda maneira pela qual Deus executa os Seus decretos: as obras da providência. A providência de Deus é um tema de profundo significado teológico que pode trazer grande consolo. Este capítulo explica como Deus realiza Seus decretos no mundo e em nossas vidas. Muitas questões intrigantes são maravilhosamente resolvidas neste Capítulo enquanto a coerência e profundidade das Escrituras é explicada. Edward Morris afirma sobre este Capítulo: “Nenhuma definição da providência tão exata e tão abrangente como esta pode ser encontrada em outro lugar do simbolismo Protestante”1. Nós vamos estudar, então, o assunto da providência Divina, sob a tutela de um completo e reflexivo corpo de doutrina — e um dos melhores em toda a Cristandade.

 

O que é providência? O Oxford English Dictionary a define como: 1) a ação de provisão; disposição, preparação, arranjo; principalmente na frase fazer providência; prover. 2) Antevisão, previsão; antecipação e preparação para o futuro; cuidados em tempo; por isso, arranjo prudente ou sábio, guia ou orientação de governo. Nestas definições, os conceitos-chave são: supervisão, previsão e provisão. Enquanto o dicionário fornece-nos um sentido geral da providência, este não é necessariamente teológico. A questão de número 14 do Catecismo Batista oferece uma sucinta definição teológica. A providência [de Deus] é “Sua santíssima, sábia e poderosa preservação e governo de todas as Suas criaturas, e de todas as suas ações”. Em suas Institutas da Religião Cristã, João Calvino disse: “Inicialmente, então, que meus leitores compreendam por providência não aquilo pelo que Deus observa de braços cruzados desde o Céu o que acontece na Terra, mas aquilo pelo que, como guardião das chaves, Ele governa todos os eventos”2. A. A. Hodge declara: “Seu controle providencial é em todos os aspectos a consistente execução de Seu propósito eterno, imutável e soberano”3. Thomas Watson afirma: “O decreto de Deus determina as coisas que ocorrerão, a providência de Deus as ordena”4. Existem basicamente duas perspectivas complementares a serem vistas nestas declarações sobre a providência. A providência é a maneira que Deus cumpre os Seus decretos5, e a providência é a provisão e cuidado de Deus em relação à criação; estes são dois lados da mesma moeda.

 

A partir dessas definições acima, observamos também que Deus está pessoalmente envolvido na providência. Deus não emite decretos e cumpre-os por algum procedimento frio, insensível, mecânico. Não, pela providência o próprio Deus ordena a maneira como Seus decretos são realizados. Efésios 1:11b declara sobre o decreto de Deus que é “o propósito daquele que faz todas as coisas, segundo o conselho da sua vontade”6. A providência é pessoal! Watson disse: “Sobre a obra da Divina providência, Cristo diz: ‘Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também’ (João 5:17). Deus descansou das obras da criação, Ele não cria qualquer nova espécie de coisas. ‘Ele descansou de todas as Suas obras’ (Gênesis 2:2); e, portanto, é necessário que se intencione as Suas obras da providência: ‘Meu Pai trabalha e Eu trabalho’. A Santíssima Trindade está pessoalmente trabalhando por meio da providência. Que maravilha e consolo isso traz para aqueles que pertencem a Deus”.

 

Comecemos agora a olhar para a definição teológica completa da providência encontrada no parágrafo 1. Ele começa assim: Deus, o bom Criador de todas as coisas. Uma vez que Deus é bom, segue-se que tanto a Sua criação e providência também são boas. Se Deus não fosse “bom” nós nos encontraríamos na mesma situação dos gregos antigos, cujos deuses, comparados aos homens, eram perversamente egoístas, inseguramente mutáveis, de acordo com os seus caprichos. Viver sob a assim chamada providência dos deuses gregos, como eles os imaginavam, deveria ser algo terrível. Mas o nosso bom Deus é o Criador de todas as boas coisas, e assim, nós encontramos que Ele é amoroso, justo e misericordioso. A. A. Hodge diz: “Uma vez que o propósito eterno de Deus relaciona e determina tudo o que vem a acontecer, e uma vez que é imutável, Seu controle providencial de todas as coisas deve estar na execução de Seu propósito. E desde que Seu propósito é infinitamente sábio, justo e benevolente, e absolutamente soberano…, sua execução providencial do decreto deve possuir as mesmas características”7. A doutrina da providência é um reflexo do caráter de Deus.

 

A Confissão de 1689 continua: Em Seu infinito poder e sabedoria, sustenta, dirige, dispõe e governa. A execução Divina de Seu decreto pela providência flui do Seu poder infinito. No livro de Jó, a pergunta é feita: “Porventura alcançarás os caminhos de Deus, ou chegarás à perfeição do Todo-Poderoso? Como as alturas dos céus é a sua sabedoria; que poderás tu fazer? E mais profunda do que o inferno, que poderás tu saber? Mais comprida é a sua medida do que a terra, e mais larga do que o mar” (Jó 11:7-9). Nós percebemos que a resposta a estas duas perguntas é um definitivo, não! Não há nenhum limite para o Todo-Poderoso, Ele é infinito em poder e sabedoria. Deus efetiva o Seu decreto pela providência através de Sua infinita sabedoria. A Escritura afirma: “Não sabes, não ouviste que o eterno Deus, o Senhor, o Criador dos fins da terra, nem se cansa nem se fatiga? É inescrutável o seu entendimento” (Isaías 40:28). O entendimento de Deus (i.e., sabedoria) é insondável (i.e., infinita). Deus, por Sua providência, ordena todas as coisas pelo Seu poder e sabedoria infinitos. Mas, o que especificamente Deus faz por meio da providência? Ele sustenta, dirige, dispõe e governa todas as coisas. Analisemos individualmente cada uma dessas ações.

 

Deus sustenta todas as coisas. A Escritura declara: “E ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem por ele” (Colossenses 1:17). E ainda: “O qual, sendo o resplendor da sua glória, e a expressa imagem da sua pessoa, e sustentando todas as coisas pela palavra do seu poder” (Hebreus 1:3). Deus dirige todas as coisas. A Escritura declara: “Falou Daniel, dizendo: Seja bendito o nome de Deus de eternidade a eternidade, porque dele são a sabedoria e a força; e ele muda os tempos e as estações; ele remove os reis e estabelece os reis; ele dá sabedoria aos sábios e conhecimento aos entendidos” (Daniel 2:20-21). Aqui nós vemos Deus como Quem dirige o tempo e as estações, e Aquele que remove os detentores do poder político e/ou os substitui. Deus faz isso pelo Seu poder e sabedoria. Deus, como Quem dirige, não está por aí reagindo aos acontecimentos à medida que eles ocorrem, como o teísta aberto afirma, mas, sim, Deus está dirigindo; todo o restante reage. Deus dispõe todas as coisas. Isso não significa que Deus “determina de forma indiferente”, mas que Ele ordena. Deus cumpre todas as coisas — tudo o que Ele ordenou. Deus governa todas as coisas. A Bíblia indica: “O Deus que fez o mundo e tudo que nele há, sendo Senhor do céu e da terra, não habita em templos feitos por mãos de homens; nem tampouco é servido por mãos de homens, como que necessitando de alguma coisa; pois ele mesmo é quem dá a todos a vida, e a respiração, e todas as coisas; e de um só sangue fez toda a geração dos homens, para habitar sobre toda a face da terra, determinando os tempos já dantes ordenados, e os limites da sua habitação” (Atos 17:24-26). E ainda: “Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu, e o principado está sobre os seus ombros, e se chamará o seu nome: Maravilhoso, Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz. Do aumento deste principado e da paz não haverá fim, sobre o trono de Davi e no seu reino, para o firmar e o fortificar com juízo e com justiça, desde agora e para sempre; o zelo do Senhor dos Exércitos fará isto” (Isaías 9:6-7). Estas passagens demonstram o soberano governo e ordenação Divinos sobre a criação. Essas quatro palavras: sustenta, dirige, dispõe e governa, envolvem todo o âmbito da providência de Deus.

 

A Confissão indica que essas ações são direcionadas a: todas as criaturas, e coisas, desde a maior até a menor. Nós devemos notar que há uma variação de classificação: maior e menor. Esta é uma classificação de todas as criaturas e todas as coisas. Por exemplo, nós podemos ver esta maior até a menor das criaturas como: arcanjos, anjos, homens, animais e plantas, até o menor micro-organismo. Se olharmos para o reino das coisas (i.e., a matéria não-viva), nós podemos ver o maior até o menor: o universo, sistemas solares, estrelas, planetas, oceanos, montanhas, rochas, até os átomos. Nós também podemos entender coisas sendo a ordenação providencial de grandes eventos na história do mundo, como o dilúvio em todo mundo, guerras mundiais, até a mais minúscula das coisas na vida. Como citado em um capítulo anterior, R. C. Sproul corretamente observa que não existem moléculas aleatórias vagueando no universo. Todas e cada uma estão sob a providência de Deus. Ezequiel Hopkins, um Puritano, escreve: “A partir disso, podemos aprender que Deus governa a mais mediana, a mais simples e desprezível ocorrência no mundo por uma providência exata e particular. Você vê mil pequenas partículas e átomos vagando para cima e para baixo em um feixe de sol? É Deus que assim que o preenche; e Ele guia os seus inumeráveis e irregulares desvios”8. Jesus disse que o cuidado providencial do Pai estende-se desde a humanidade, a maior criatura terrestre, até a mais humilde das criaturas (passarinhos): “Por isso vos digo: “Não andeis cuidadosos quanto à vossa vida, pelo que haveis de comer ou pelo que haveis de beber; nem quanto ao vosso corpo, pelo que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o mantimento, e o corpo mais do que o vestuário? Olhai para as aves do céu, que nem semeiam, nem segam, nem ajuntam em celeiros; e vosso Pai celestial as alimenta. Não tendes vós muito mais valor do que elas?” (Mateus 6:25-26). Semelhantemente, Jesus disse: “Não se vendem dois passarinhos por um ceitil? e nenhum deles cairá em terra sem a vontade de vosso Pai” (Mateus 10:29).

 

Sabemos a partir das declarações anteriores da Confissão que Deus governa por meio de Seu poder e sabedoria infinita, mas de que forma Ele faz isso? A Confissão afirma: “por Sua mui sábia e santa providência”. A sabedoria de Deus é muito maior do que qualquer sabedoria que Suas criaturas possam possuir, e, portanto, a sabedoria de Deus aplicada à providência é mui sábia. Podemos ter certeza de que as coisas mais difíceis em nossas vidas estão sob Sua providência mais sábia. Considere os detalhes incompreensíveis envolvidos em dirigir a criação (todos os seres e coisas). Claramente, a sabedoria infinita de Deus é necessária. Você pode imaginar como o fluxograma da providência Divina pode parecer? Além disso, Sua providência é santíssima. A providência de Deus é santa em um sentido ético e moral. Deus não viola Seu caráter santo em qualquer das formas que Ele executa os Seus decretos. Assim, mesmo em providências muito sombrias, Deus é santo, moralmente perfeito. Ele não pode ser justamente acusado de ser profano em qualquer providência.

 

A providência de Deus opera para o9 fim para o qual foram criadas. O lidar providencial de Deus para com todas as coisas criadas é de acordo com o seu propósito, finalidade e natureza. A Escritura e a observação demonstram que isso é verdade. “O Senhor fez todas as coisas para atender aos seus próprios desígnios, até o ímpio para o dia do mal” (Provérbios 16:4). Deus fez as coisas de uma certa maneira, e Ele fez assim para que elas possam cumprir os Seus propósitos. Deus tem um propósito e ordem para a hierarquia da criação e Suas criaturas, e por Sua providência ordinária todas estas coisas funcionam nesse desígnio. A lua tem sua função polivalente de refletir a luz sobre a Terra, manter a Terra em sua órbita designada, e criar influenciar as marés. Nós observamos nos ecossistemas que cada espécie tem a sua função projetada dentro desse sistema, de modo a agir no ambiente designado. Cada criatura tem sua função e finalidade únicas. Normalmente, a providência de Deus usa todas as coisas dentro dessa ordem, e Ele não faz com que a criação funcione fora do seu desígnio e natureza. Se Deus decretou A, então, Ele usará criaturas ou coisas que possam realizar A dentro de seu propósito e função criada. Há exceções, no entanto, como o momento em que a jumenta de Balaão falou com ele. Nesse caso, a jumenta agiu de modo sobrenatural (i.e., supranatural, acima da natureza). Isso ocorreu fora de, e acima da natureza da ação de uma jumenta. Normalmente, se esperaria que Deus enviasse um profeta humano ou um anjo com a capacidade natural de proferir palavras. Nós vamos tocar nesse assunto novamente no parágrafo de número 3, quando a Confissão aborda exceções à providência ordinária de Deus.

 

A Confissão afirma que a providência de Deus é segundo a Sua infalível presciência, e o livre e imutável conselho de Sua própria vontade. A providência de Deus (Seu sustentar, dirigir, dispor e governar a criação) funciona de acordo com (ou por meio da) infalível presciência de Deus. Deus não olha para o futuro a fim de fazer planos e antecipar a necessidade; em vez disso, Deus ordena de antemão (preordena) o futuro e a providência garante que o decreto ocorra. Presciência significa a preordenação de Deus, como discutido no Capítulo 3. A providência também está de acordo com o livre e imutável conselho de Sua própria vontade. A providência de Deus é o fluir da vontade imutável de Deus. Tudo isso é para o louvor da glória de Sua sabedoria, poder, justiça, infinita bondade e misericórdia. O resultado é que a providência de Deus manifesta a glória de Deus, especificamente através da demonstração de Sua sabedoria, poder, justiça, bondade infinita e misericórdia. Especificamente esses atributos de Deus listados são demonstrados através de providência de Deus.

 

Este parágrafo, efetivamente, nos forneceu uma definição abrangente da providência, e os parágrafos restantes servirão para esclarecê-la e ampliá-la.

 

 

2. Embora em relação à presciência e ao decreto de Deus, a causa primeira, todas as coisas acontecem imutável e infalivelmente4, de forma que nada acontece por acaso, ou sem a Sua providência5; contudo, pela mesma providência, Ele ordena que elas aconteçam de acordo com a natureza das causas secundárias, seja necessária, livre ou contingentemente.6 (4 Atos 2:23 • 5 Provérbios 16:33 • 6 Gênesis 8:22).

 

A Confissão declara: Embora em relação à presciência e ao decreto de Deus, a causa primeira, todas as coisas acontecem imutável e infalivelmente, de forma que nada acontece por acaso, ou sem a Sua providência. Isto ensina, nas palavras de A. A. Hodge, “que, como a execução de um propósito eterno e soberano, o controle providencial de Deus está na questão de cada ser e evento certamente eficaz”10. Não é apenas que o decreto de Deus faz todas as coisas, mas que através da providência elas vêm a ocorrer imutável e infalivelmente; o decreto de Deus nunca altera seu curso (i.e., imutável), e sempre se cumpre da forma que Deus determina, sem falhar (i.e., infalivelmente).

 

O que se quer dizer por: a causa primeira? A fim de responder a essa pergunta satisfatoriamente, teremos que fazer alguma análise gramatical. Primeiro, avaliemos o contexto. O termo “causa primeira” é melhor entendido no contexto do termo “causas secundárias” utilizado posteriormente no mesmo parágrafo. A “causa primeira” é distinta das causas secundárias; uma é a primeira, e a outra posterior a essa, secundária. Como veremos, os decretos de Deus são a causa primeira, e os meios que Deus ordens para executar esses decretos são “causas secundárias”. Nós discutiremos isso por um momento. O termo “causa primeira” funciona nesta sentença como um termo apositivo. Um termo apositivo, frequentemente, quando separado em uma frase por vírgulas, segue ou um substantivo ou uma frase, fornecendo informações adicionais sobre o substantivo ou frase. Por esta regra gramatical, o termo apositivo (por exemplo, “causa primeira”) refere-se tanto ao substantivo anterior “Deus”, ou à frase maior “Decreto de Deus”11. Nós precisamos decidir entre os dois, “Deus” e o “decreto de Deus”? Os dois são tão intimamente relacionados que uma distinção tão estrita é desnecessária; no entanto, olhando para o contexto geral, a título de clareza, é razoável inferir que a “causa primeira” refere-se especificamente ao decreto de Deus.

 

Nós ainda não explicamos exatamente o que se entende pela expressão “causa primeira”. A causa de tudo o que acontece é o decreto de Deus, e por essa razão o decreto de Deus é chamado de causa primeira. É a primeira causa no sentido de que é a causa final que vem primeiro em ordem cronológica. Desde que o decreto de Deus é a causa última de tudo o que acontece, e uma vez que não há nada por trás ou antes disso em termos de causas contribuintes, ele é a primeira e última causa. Mas, há também outras causas (i.e., as causas secundárias) após ele que executam esse decreto. O decreto de Deus não é normalmente executado por simples causa e efeito. Normalmente, o decreto de Deus vem a ocorrer por meios. Estes meios são referidos como as causas secundárias; eles são os meios ou causas que executam o decreto, mas eles não são a causa final. A causa final pertence ao decreto de Deus que não somente determina a finalidade, mas também ordena os meios (causas secundárias) para alcançá-la. De certa forma, estamos nos antecipando um pouco, mas é difícil explicar a “causa primeira”, sem, pelo menos, introduzir as “causas secundárias”.

 

No gráfico abaixo (Figura 1), vemos um modelo que representa o que nós tratamos até agora, embora para o momento as causas secundárias sejam excluídas. Eu buscarei mostrar o modelo dos decretos de Deus e sua execução através de um infográfico da Confissão; este modelo expandirá à medida que continuamos através do parágrafo 2. A Figura 1 representa o decreto de Deus (a causa primeira) executado ou cumprido pela providência de Deus.

Figura 1

 

Como resultado da presciência de Deus (preordenação) e decreto de Deus, a Confissão diz: de forma que nada acontece por acaso, ou sem a Sua providência. A Confissão abrange toda a criação — tudo e todos. A providência governando todas as coisas exclui o acaso. O que é acaso? É algo que acontece, que não tem nenhuma razão, propósito e ordem, algo fora ou sem Deus. O acaso é um ateu12. O Cristão, no entanto, não é um ateu e Deus verdadeiramente governa todas as partes do universo. Como tal, o Cristão deve ser reflexivo sobre o uso de palavras como “possibilidade”, “destino” e “sorte” em um mundo que usa essas palavras para suprimir a verdade13. Desde que a Divina providência ordena todas as coisas, o acaso não tem lugar no universo de Deus.

 

A Confissão, em seguida, acrescenta: contudo, pela mesma providência, Ele ordena que elas aconteçam de acordo com a natureza das causas secundárias. Por meio de, ou através da providência o próprio Deus ordena a forma como os Seus decretos ocorrem, e eles usualmente ocorrem de acordo com a natureza das causas secundárias. Como mencionado anteriormente, a causa secundária refere-se à forma ou o meio pelo qual o decreto de Deus é cumprido (i.e., acontece). Na Figura 2, a seguir, nós adicionamos o conceito de “causas secundárias”. Olhando para a primeira caixa em nosso modelo (i.e., os decretos de Deus) e movendo-se para a direita, vemos que cada componente avança para a consumação do decreto.

Figura 2 

 

Talvez um exemplo prático deste modelo nos servirá bem neste momento. Digamos que Deus decretou na eternidade que em 12 de maio de 2015, John Smith deveria morrer. E, como esperado, quando 12 de maio de 2015 chegou, John Smith morreu. Isto é bastante simples e muito claro: Deus o decretou e isso acontece: simples causa e efeito. Mas isso não lida com qualquer um dos detalhes que levaram à execução deste decreto. John Smith não apenas morreu; houve causas que levaram à sua morte, causas secundárias ao decreto. Essas causas seguem o decreto lógica e cronologicamente (secundariamente), sendo eles próprios ordenados (preordenados) por Deus. Aqui estão as causas da morte de Smith, causas que ocorreram secundariamente ao decreto de Deus: No dia 12 de maio de 2015, John Smith estava dirigindo seu veículo na estrada 87 às 14h07min, quando uma árvore caiu sobre a pista, e seu veículo bateu nela; John morreu instantaneamente. Como constata-se, a árvore caiu sobre a pista, porque três anos antes houve uma tempestade; um raio atingiu a árvore fazendo com que a árvore morresse. A árvore então, naturalmente, começou a apodrecer até que finalmente — três anos mais tarde — caiu sobre a estrada exatamente em 12 de maio de 2015, às 14h07min. Ao conhecerem as causas que levaram à morte de John, seus entes queridos foram tomados com um senso de que a morte de John foi o resultado de mera fatalidade e acaso.

 

Teologicamente, no entanto, esses eventos são explicados da seguinte forma: pelo decreto de Deus na eternidade John Smith deveria morrer em 12 maio de 2015, às 14h07min; esse decreto foi realizado pela providência de Deus (Figura 1). Por essa mesma providência, Deus ordenou as causas secundárias (Figura 2), que começaram três anos antes. A Figura 3 mostra como cada aspecto da morte de John Smith alinha-se ao nosso modelo.

Figura 3

 

Se alguém olhasse para os fatos da morte de John Smith, de fato, poderia parecer que uma série de eventos ao acaso o levaram à morte, mas a Bíblia instrui a família de John a ver que não há nada de aleatório, fatalista ou impessoal sobre o que aconteceu. Se isso é um conforto para a família de John ou não, depende se eles têm fé para ver essas verdades.

 

Como um ponto de esclarecimento, pode parecer lógico considerar que a tempestade que levou ao relâmpago era uma causa secundária, o relâmpago que levou à morte da árvore como a causa terciária, a morte da árvore que levou ao seu apodrecimento como uma causa quaternária, e a podridão que levou à árvore a cair como a causa quinária, mas a Confissão refere-se a tudo isso pela categoria chamada de “causas secundárias”. Independentemente de quão longe cada causa está a partir da causa secundária inicial, cada uma é chamada de causa secundária. E assim, seja pela providência Divina que ordena apenas uma causa secundária que cumpre o decreto de Deus, ou se Deus ordena que toda uma série de causas secundárias realizem o decreto, cada causa individual é classificada como causa secundária. Cada causa secundária é ordenada pela providência, mesmo se a causa secundária é contingente a muitas que a precedem.

 

O nosso modelo ainda não está completo, e por isso, seguimos adiante. Deus normalmente usa meios (i.e., causas secundárias) para realizar os Seus decretos, mas estas causas secundárias têm certas características. A Confissão afirma que pela providência Deus ordena que todas as coisas aconteçam de acordo com a natureza das causas secundárias. Isto significa que as causas secundárias são utilizadas de uma forma que é consistente com a sua natureza ou característica. Uma causa secundária será de três categorias possíveis, dependendo de sua natureza ou caráter. Edward Morris escreve: “Esta ação de Deus em e através de tais causas secundárias é descrita como operando necessária, livre ou contingentemente; em outras palavras, em plena conformidade com a natureza dessas causas, respectivamente”14. A. A. Hodge afirma sobre este parágrafo: “A maneira pela qual [Deus] controla as Suas criaturas e suas ações, e efetua Seus propósitos através delas, é em todos os casos perfeitamente consistente com a natureza da criatura e da sua ação”15. Em infinita sabedoria e poder Divino, Ele fez a criação e Suas criaturas para o exato propósito de realizar Seu decreto e, portanto, é consistente que Deus use-os de acordo com a forma como Ele os designou. Podemos ver isso de duas maneiras. Uma delas, Deus não usará uma causa secundária para além de Seu desígnio. Um cão não agirá como somente o pode um ser humano, e um ser humano não fará, digamos, o que somente um vulcão pode fazer. Todas as causas funcionam dentro de seu desígnio. Duas, de todas as várias maneiras de classificar as naturezas das causas secundárias, seja isso algo na natureza, um complexo ser humano com livre-agência, ou causas que dependem de outras, todas as causas têm uma natureza que pode ser classificada em três categorias. Morris afirma: “E os Símbolos ensinam que em cada uma dessas três esferas a providência opera igualmente, embora por métodos e agências diversificados, mas sempre opera supremamente, e em perfeita sabedoria e justiça, bem como com uma potência infinita”16. Vamos, então, discutir cada natureza das causas secundárias.

 

A natureza das causas secundárias classificadas como necessariamente tem relação com as leis fixas da natureza. Robert Shaw escreve: “Cada parte do mundo material tem uma dependência imediata sobre a vontade e o poder de Deus, em relação a cada movimento e operação, bem como em relação à existência continuada; mas Ele governa o mundo material por certas leis físicas — comumente chamadas de leis da natureza, e nas Escrituras de ordenanças dos céus [Jó 38:33] — e conformemente a essas leis, tanto quanto se refere às causas secundárias, certos efeitos uniformemente e, necessariamente, seguem algumas causas”17. Morris diz: “As agências ativas da natureza, por exemplo, trabalham sob necessidade — sem inteligência ou vontade própria, e sem escolha ou mesmo conhecimento dos resultados para o qual estão trabalhando. Toda a esfera e as operações da criação física estão sob esta lei de necessidade material; em outras palavras, esta criação é um grande mecanismo, passando pelas forças acima de si mesma para questões não escolhidas por ela mesma, sob a orientação irresistível dAquele quem a criou”.18

 

Parte do ponto de Morris aqui é que as causas secundárias que ocorrem necessariamente não devem ser vistas de uma forma deísta, como se a natureza tivesse algum legado mecânico que não tenha necessidade de Deus para dirigi-lo. A fixidez na natureza é estabelecida pelo próprio Deus, e Ele intencionalmente a concebeu como um meio de cumprir os Seus decretos, mas isso não infere deísmo; Deus não está ausente de Sua criação; somente porque Ele a usa de acordo com Seu propósito, não significa que Ele não esteja, pessoalmente, dirigindo-a. Pode parecer-nos que a fixidez no propósito é mecânica e impessoal, mas na verdade não é. Pela providência pessoal Deus faz todas as coisas que ocorrerem19. Em Puritan Theology [Teologia Puritana], Beeke e Jones escrevem: “Como a providência de Deus se relaciona com as leis da natureza? De acordo com Ames, a ordem que observamos no mundo, ‘a lei da natureza’, é prova do poder contínuo da Palavra de Deus sobre a criação (Jeremias 31:35-36; 33:20). A presença ativa de Deus também é necessária para sustentar o mundo e seus habitantes. Sedgwick observou que a Bíblia fala especificamente de Cristo ‘sustentando todas as coisas pela palavra do seu poder’ (Hebreus 1:3). Deus trabalha através de meios comuns, tais como fornecimento de alimentos, chuva e vestuário (Salmos 136:25; 147:8-9; Mateus 6:30;32). Mas Ele é o único que trabalha, embora, este esteja consumado”20. Em nosso exemplo acima, a tempestade necessariamente levou ao relâmpago; o raio necessariamente levou à morte da árvore; a morte da árvore necessariamente levou ao apodrecimento da mesma.

 

Livremente é a classificação que relaciona-se com causas secundárias que envolvem livre-agência. Shaw escreveu: “A providência de Deus também está relacionada com as volições e ações das criaturas racionais; mas Sua influência providencial não é destrutiva de sua liberdade racional, pois eles não estão sob nenhuma compulsão, mas agem livremente; e toda a liberdade que pode pertencer às criaturas racionais é a de agir de acordo com suas inclinações”21. Morris afirma: “Mas na esfera e reino da humanidade, Deus faz com que as coisas ocorram livremente em vez de necessariamente, conforme, em outras palavras, à constituição da vontade humana vista como uma causa secundária, tendo uma capacidade inerente de ação livre, e de acordo com os princípios incorporados em sua moral, como distinta do sistema material das coisas. Enquanto a vontade do homem em si não é uma causa primeira, mas secundária, e como tal deve ser empoderada mesmo em suas atividades mais livres ou mais instintivas pelo próprio Deus como a causa primeira, ainda assim, Ele dotou a vontade do homem com liberdade natural que não é forçada por qualquer absoluta necessidade da natureza determinada para o bem ou o mal. Aqui é feita uma clara distinção entre causas secundárias operando necessariamente na natureza, e a vontade como causa secundária de uma classe peculiar, operando livremente em uma região acima da natureza — a região da vida moral e ação”.22

 

Como Deus dirige homens e mulheres de acordo com a Sua providência, sem violar a sua livre-agência? John Owen indica que “testemunhos são óbvios em toda parte nas Escrituras, do agitar das vontades e mentes dos homens, da tendência e inclinação deles a diversas coisas, do governo dos pensamentos secretos e movimentos do coração, como não podendo, por qualquer meio, ser referido como uma mera permissão, com um governo das ações externas, ou da influência geral, segundo o que eles teriam o poder de fazer isto ou aquilo, ou qualquer outra coisa; no que, como alguns supõem, toda a Sua providência consiste”23. No nosso exemplo da morte de John Smith, ele livremente determinou entrar em seu veículo e pegar a estrada 87, naquele momento preciso. A providência de Deus estava dirigindo e governando John para tomar as medidas que ele tomou, contudo, John ainda agia livremente. Enquanto John agiu livremente, John não era um livre agente autônomo (i.e., livre-agência não dissuadida ou influenciado por Deus). Reconhecemos que Deus deu livre-agência ao homem, mas, contudo, Deus ainda governa “os pensamentos secretos e movimentos do coração”, e, assim, a alegação do Arminianismo que o homem é uma criatura autônoma-livre é grandemente exagerado e um erro. Abordaremos a livre-agência com mais detalhes no Capítulo 9, Sobre o Livre-Arbítrio.

 

Contingentemente é aquela natureza das causas secundárias dependente de outra cau-sa24. Shaw escreve proveitosamente: “Embora não haja evento contingente em relação a Deus, que anuncia ‘o fim desde o princípio, e desde a antiguidade as coisas que ainda não sucederam; que digo: O meu conselho será firme, e farei toda a minha vontade’ [Isaías 46:10]; ainda assim, muitos eventos são contingentes ou acidentais em relação a nós, e também com relação às causas secundárias”25. É evidente que muitas causas da classe secundária dependem de outras causas secundárias, a fim de ocorrerem. Porém, mesmo com contingentes causas secundárias — cada uma dependendo das outras — cada uma é ordenada pela providência de Deus. A providência não está ausente, mesmo nesta categoria. 

 

Morris menciona outro aspecto a ser considerado em relação a esta classe: “aqueles (realmente pertencendo à segunda classe) que induzem resultados, tais como Deus poderia ter escolhido apenas no modo de permissão, e tais como Ele deve poderosamente delimitar, se Ele completamente não os impedir”26. Em outras palavras, esses agentes livres, que normalmente pertencem à classe “livremente” são usados frequentemente como causas secundárias pecaminosas — ações pecaminosas que Deus não é o autor ou aprovador, mas permitidas para Seu próprio propósito. Estas causas secundárias são contingentes sobre as ações pecaminosas de Suas criaturas. Considere a ação pecaminosa dos irmãos de José, uma ação que Deus não foi o autor ou aprovador, mas causas secundárias que, no entanto, utilizadas para cumprir o Seu decreto. Nas palavras de José: “Vós bem intentastes mal contra mim; porém Deus o intentou para bem, para fazer como se vê neste dia, para conservar muita gente com vida” (Gênesis 50:20). Considere também esta passagem: “A este que vos foi entregue pelo determinado conselho e presciência de Deus, prendestes, crucificastes e matastes pelas mãos de injustos” (Atos 2:23). Claramente, homens injustos foram a causa contingente da crucificação de Cristo — a causa secundária de uma natureza contingente — mas o plano de Deus predeterminado (Seu decreto) e Sua presciência (predestinação) foi a causa primeira. Os homens permanecem responsáveis, uma vez que livremente escolhem agir pecaminosamente; somente porque Deus faz uso de ações pecaminosas não significa que as ações pecaminosas ficam impunes.

 

Morris traz mais clareza às causas classificadas como contingentes: “A concepção das causas secundárias operando nem necessária nem livremente, mas de forma contingente, é, sem dúvida, feita para fornecer uma explicação sobre a introdução e a permissão do pecado. Enquanto nada pode ser visto como acidental na administração Divina, — desde que até mesmo o pecado deve ser dito, por um lado, permitido por Deus, mas por outro lado, poderosamente delimitado e restringido por Ele, contudo os Símbolos cuidadosamente negam que Deus é ou pode ser o autor ou aprovador do pecado; a entrada desta horrenda tragédia sendo em algum verdadeiro sentido contingente em Seu propósito — contingente, mas não fortuito ou irresistível à Sua vista. Diz-se, com justiça, que não há nenhum evento contingente ou dificuldade para com Deus; ainda assim, em sua Palavra muitas vezes Ele parece conduzir eventos a contingências especificas, e mesmo Seu decreto a respeito da irrupção do pecado em nosso mundo deve ser visto como dependente de um abuso da liberdade e escolha humanas; abuso este que Ele nem ordenou, nem aprovou, em qualquer pleno sentido destas palavras. A contingência implica claramente algo mais do que possibilidade: implica tanto um conhecimento prévio do evento contingente introduzido, quanto uma certa medida de força causal com relação a isso. Mas essa força causal difere radicalmente daquela que regula a ocorrência das estações do ano, e também da que orienta e auxilia a alma no caminho da santidade, — Deus parecendo em Sua soberania ficar à parte e sofrer a vontade humana como uma causa secundária para operar resultados que Ele nunca foi o propósito de sua criação produzir, e para cujo efeito Ele o considera para uma prestação de contas rigorosa diante dEle”.27

 

O parágrafo 4 ainda aborda a providência de Deus sobre a Queda e as ações pecaminosas de Suas criaturas, e por isso não comentarei mais aqui. Nosso modelo, então, em sua forma completa, evidencia-se na Figura 4:

 Figura 4

 

Em nossa ilustração sobre a morte de John Smith, a árvore caindo dependia do apodrecimento da árvore, e o apodrecimento estava condicionado à morte da árvore por um raio, o raio estava condicionado à tempestade. Cada causa secundária unida pela providência efetivou o decreto de Deus.

 

Morris resume todas as três classes da seguinte maneira: “A providência é assim apresentada como um grande esquema em que uma multidão de forças e ações subordinadas são aparentes, cada uma operando sua específica classe de resultados em harmonia com sua própria natureza, enquanto todos se combinam no desenvolvimento de uma abrangente questão preconcebida”28. A Confissão não fornece um modelo de causa e efeito simplista, antes, oferece uma resposta completamente bíblica — uma resposta sofisticada. Este modelo bíblico fornece uma grande porção de conforto, especialmente quando acontecem coisas que parecem aleatórias, uma questão de oportunidade. Às vezes, a causa que leva a um trágico acidente parece tão minúscula ou mesmo incidental. Deus pode até parecer ausente, porque é tão pequena. Talvez o mecânico da companhia aérea esqueceu de apertar um parafuso exatamente como especificado, o que levou a um fatal acidente de avião. Podemos recitar e imaginar mil exemplos de causas secundárias aparentemente insignificantes que levam a eventos mui significativos. Essas coisas podem levar a uma crise da fé, mas se a nossa teologia é bíblica, podemos ver que não há incidentes minúsculos para com Deus. Sua providência é abrangente até a menor causa secundária, e está mesmo sobre a ação mais pecaminosa do homem — coisas que eram intencionadas para o mal, mas Deus as intencionou para o bem (Gênesis 50:20; Romanos 8:28). O santo e justo Deus ordena tudo por Sua boa e amorosa providência; tanto a providência feliz quanto a sombria.

 

3. Deus, em Sua providência ordinária, faz o uso de meios7, ainda assim, é livre para operar sem8, acima9 e contra eles10, como Lhe aprouver (7 Atos 27:31, 44; Isaías 55:10-11 • 8 Oséias 1:7 • 9 Romanos 4:19-21 • 10 Daniel 3:27).

 

É justo que este parágrafo siga o anterior. Ele serve para mostrar que, embora seja verdade que as obras habituais de Deus são por Sua providência ordinária, Deus ordena as causas secundárias para cumprir a Sua vontade decretiva; há, no entanto, exceções. Essas exceções são descritas como sem meios, acima dos meios ou contra meios. A. A. Hodge declara: “Que Deus possui o poder de realizar o Seu fim imediato, sem a intervenção de causas secundárias, é autoevidente; e que, por vezes, em Sua vontade soberana Ele exerce este poder, é uma questão de evidência clara e satisfatória”29. Além disso, Hodge indica que: “O poder de Deus, de fato, opera em todos os processos de natureza ordinária, e Sua vontade é expressa no que se chama lei natural; mas isso não quer dizer que o poder todo está esgotado nesses processos, nem o todo de Sua vontade se expressa nessas leis. Deus permanece infinitamente maior que as Suas obras, na execução de Seus eternos propósitos imutáveis, usando o sistema de causas secundárias como Seu instrumento constante, de seu tipo, e, entrementes, manifestando Suas transcendentes prerrogativas e poderes pelo livre exercício de Seus poderes e declarações de Sua vontade”30.

 

Há muitos exemplos de exceções à providência ordinária encontrados nas Escrituras. O nascimento virginal de Cristo é um exemplo de sem meios. Deus operou sem meio de relações sexuais como o meio de concepção. “E, respondendo o anjo, disse-lhe: Descerá sobre ti o Espírito Santo, e a virtude do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra; por isso também o Santo, que de ti há de nascer, será chamado Filho de Deus” (Lucas 1:35). Deus usa o sobrenatural para passar por meios ordinários. Acima dos meios refere-se ao uso do sobrenatural de Deus (i.e., supranatural) para ir acima ou além da natureza de uma causa secundária. Por exemplo, o nascimento milagroso de Isaque à Sara e Abraão. Aqui Deus ainda usa meios, mas Ele vai acima dos meios ordinários. Sara ainda concebeu através de relações sexuais com Abraão, mas Deus sobrenaturalmente a levou a conceber apesar de sua condição estéril e idade. “Disse Deus mais a Abraão: A Sarai tua mulher não chamarás mais pelo nome de Sarai, mas Sara será o seu nome. Porque eu a hei de abençoar, e te darei dela um filho; e a abençoarei, e será mãe das nações; reis de povos sairão dela. Então caiu Abraão sobre o seu rosto, e riu-se, e disse no seu coração: A um homem de cem anos há de nascer um filho? E dará à luz Sara da idade de noventa anos? E disse Abraão a Deus: Quem dera que viva Ismael diante de teu rosto! E disse Deus: Na verdade, Sara, tua mulher, te dará um filho, e chamarás o seu nome Isaque, e com ele estabelecerei a minha aliança, por aliança perpétua para a sua descendência depois dele” (Gênesis 17:15-19). Contra os meios refere-se a Deus agindo contra a função designada de uma causa secundária. Por exemplo, Deus foi contra Seus meios ordinários da gravidade e fez com que um machado flutuasse na água. “E sucedeu que, derrubando um deles uma viga, o ferro caiu na água; e clamou, e disse: Ai, meu senhor! ele era emprestado. E disse o homem de Deus: Onde caiu? E mostrando-lhe ele o lugar, cortou um pau, e o lançou ali, e fez flutuar o ferro. E disse: Levanta-o. Então ele estendeu a sua mão e o tomou” (2 Reis 6:5-7).31

A providência ordinária faz uso de meios (i.e., causas secundárias), mas se Deus quiser operar sem, acima ou contra esses meios providenciais comuns, Ele é livre para fazê-lo. Este parágrafo mostra que o modelo Reformado da providência não é antissobrenatural, nem deísta. Deus ainda é mui livre para agir de forma sobrenatural acima da providência ordinária, e Ele não Se afastou deixando a criação funcionar puramente pelas leis da natureza. Sua providência está em toda parte, é pessoal, e não está limitada pelas leis fixas da natureza. Deus governa livremente sobre a criação, sustentando todas as coisas pela palavra do Seu poder.

 

 

4. A onipotência, a sabedoria inescrutável e a infinita bondade de Deus, tanto manifestam-se em Sua providência, na qual Seu conselho determinado se estende mesmo até a primeira Queda, e a todas as outras ações pecaminosas tanto de anjos quanto de homens11; e não por meio de mera permissão, os quais Ele também, mui sábia e poderosamente delimita, e de forma variada ordena e governa12 em uma multiforme dispensação, para os Seus próprios santos fins13; ainda assim, de forma que a pecaminosidade desses atos procede apenas da criatura, e não de Deus; que sendo santíssimo e justíssimo, não é, nem pode ser o autor ou aprovador do pecado.14 (11 Romanos 11:32-34; 2 Samuel 24:1; 1 Crônicas 21:1 • 12 2 Reis 19:28; Salmos 76:10 • 13 Gênesis 1:20; Isaías 10:6, 7, 12 • 14 Salmos 1; 21; 1 João 2:16).

 

A Confissão afirma: A onipotência, a sabedoria inescrutável e a infinita bondade de Deus, tanto manifestam-se em Sua providência, na qual Seu conselho determinado se estende mesmo até a primeira Queda, e a todas as outras ações pecaminosas tanto de anjos quanto de homens. Como podemos lembrar, a Confissão diz no parágrafo 1 que “Deus, o bom Criador de todas as coisas, em Seu infinito poder e sabedoria, sustenta, dirige, dispõe e governa todas as criaturas, e coisas”. Nós vemos muito do parágrafo 1 reiterado aqui, mas agora isso é aqui aplicado, mesmo à Queda e a todas as ações pecaminosas de anjos e homens. O determinado conselho de Deus se estende tão longe — a providência executando esse conselho — a ponto de abranger até mesmo tais ações pecaminosas. Esta é uma declaração notável — uma com a probabilidade de invocar uma forte oposição por muitos. No entanto, quais são as alternativas? Ou Deus é soberano sobre todas as coisas, incluindo a Queda e as ações pecaminosas de anjos e homens, ou Ele não é soberano em absoluto.

 

A soberania e providência de Deus sobre as ações pecaminosas das criaturas não são por meio de mera permissão. Em outras palavras, o governo de Deus sobre as ações pecaminosas de anjos e homens não lhes permite agir pecaminosamente de forma irrestrita ou completamente aberta (i.e., por mera permissão), como se Deus tivesse dado a anjos e homens livre-agência autônoma. É verdade que Deus deu livre-agência aos anjos e aos homens, mas esta não é autônoma. Mesmo as ações pecaminosas de criaturas agentes livres estão sujeitas ao decreto e providência de Deus. Assim, aqueles que acreditam que Deus deu aos Seus agentes livres mera permissão — livre-arbítrio irrestrito para fazerem o que quiserem — deixam de reconhecer que os soberanos decretos e providência Deus governam mesmo sobre as ações pecaminosas. O fato de que o pecado acontece significa que Deus o permitiu, embora não por uma mera permissão, mas, então, que tipo de permissão é?

 

A providência sobre ações pecaminosas mui sábia e poderosamente delimita, e de forma variada ordena e governa em uma multiforme dispensação, para os Seus próprios santos fins. Sua sabedoria e poder caracterizam a forma como Ele age delimitando, ordenando e governando. Esta permissão varia em grau de acordo com os propósitos de Deus. Talvez isso ocorre sem ser dito, mas a permissão que Deus dá não deve ser entendida como a permissão para uma criatura pecar sem culpabilidade, mas sim refere-se ao propósito de Deus permitir que a criatura peque. Posteriormente, veremos que Deus não está de forma alguma autorizando, ou seja, criando o pecado ou fazendo com que alguém peque. A providência concede permissão para ações pecaminosas, mas coloca delimitações (limites) sobre elas. A permissão do pecado é ordenada, o que significa que ela tem estrutura e orientação sobre as ações de homens e de anjos pecaminosos. A providência permite ações pecaminosas, mas elas são governadas, ou seja, essa permissão tem uma regra sobre essa permissão. As ações pecaminosas pertencem à criatura somente, mas na mesma, Deus limita, ordena e governa. Esta permissão limitada é aplicável aos anjos e aos homens. Satanás teve que obter permissão antes que ele pudesse tocar em Jó. Satanás não tem mera permissão? Não, a ele foi dado certos limites, os quais não podia ultrapassar. Balaão foi delimitado no propósito pecaminoso para o qual ele foi determinado. “E a ira de Deus acendeu-se, porque ele [Balaão] se ia; e o anjo do Senhor pôs-se-lhe no caminho por adversário” (Números 22:22). A. A. Hodge afirma: “Deus não somente permite atos pecaminosos, mas Ele os dirige e controla para a determinação de Seus próprios propósitos”.32 A providência é talvez mais ativa em restringir o pecado do que em permiti-lo. A providência restringe o pecado, mesmo em sua permissão, tudo para Sua glória e bem maior!

 

Deus limita, ordena e governa as ações pecaminosas de agentes livres em uma multiforme dispensação. A permissão de Deus é dada de várias formas em momentos diferentes. O que permite que um lugar, Ele restringe em outro. O que restringe, é aumentado em um período, mas pode ser admitido em outro. Tudo isso, Deus faz para Seus próprios santos fins. R. C. Sproul escreve: “Ainda assim, o fato de que o mal exista em um universo governado por um Deus perfeitamente santo deve significar que Ele tem um bom propósito em mente. Nós vemos isso na resposta de Deus à maldade dos irmãos de José: os irmãos intencionavam a sua ação para o mal, e isso era terrivelmente mal, mas Deus o intencionou em bem e trouxe muito bem disso”33. Thomas Watson disse muito bem: “Deus permitiu o pecado deles, o que Ele nunca faria, se Ele não operasse bem a partir disso”34. Paul Helm sustenta: “Deus poderia ter criado homens e mulheres que livremente… fizessem apenas o que era moralmente correto”, Deus não o fez por uma razão importante: “que do mal um bem maior viesse, um bem que não poderia ter vindo, ou não poderia ter sido tão grande, se não houvesse o mal”35. Assim, vemos novamente o argumento do bem maior36. As finalidades de Deus são santas; Deus permanece santo, mesmo nos meios que Ele usa para Seus fins. 

 

Isso nos conduz à nossa próxima porção da Confissão: ainda assim, de forma que a pecaminosidade desses atos procede apenas da criatura, e não de Deus; que sendo santíssimo e justíssimo, não é, nem pode ser o autor ou aprovador do pecado. Isso já foi apontado na primeira parte do parágrafo onde foi indicado que as ações pecaminosas procediam de anjos e homens. Aqui, isso é afirmado claramente. Na providência de Deus sobre o pecado, o pecado procede apenas da criatura (veja Romanos 9:14; Tiago 1:13-15, 17; 1 João 2:16). A providência de Deus não tem limites, assim todas as coisas acontecem exatamente como Ele ordenou, e ainda assim, sem pecado da parte de Deus. Citarei novamente Stephen Charnock:

 

Deus nunca desejou o pecado por Sua vontade preceptiva. O pecado nunca foi fundado sobre ou produzido por qualquer palavra Sua, como a criação foi [feita por Sua palavra]. Ele nunca disse: “Haja pecado debaixo dos céus”, como Ele disse: “Haja uma expansão no meio das águas”. Nem Ele quis o pecado através da infusão de qualquer hábito, ou incitando as inclinações a ele; não, “Deus a ninguém tenta” (Tiago 1:13). Nem Ele deseja o pecado por Sua vontade aprovativa; o pecado é detestável para Ele, nem alguma vez Ele pode ser de outra mente. [Ainda assim] a vontade de Deus é de algum tipo concorrente com o pecado. Ele não propriamente o deseja, contudo Ele não desejou impedi-lo. Desejar o pecado como o pecado seria uma incontestável blasfêmia a Deus. Mas, desejar permiti-lo para o bem é a glória da Sua sabedoria. [O pecado] nunca teria erguido a sua cabeça, a menos que tivesse havido algum decreto de Deus ao seu respeito. E não haveria nenhum decreto relativo a ele se Deus não pretendesse trazer o bem e glória a partir dele. Deus deseja a permissão do pecado. Ele, positivamente, não deseja o pecado, mas Ele, positivamente, deseja permiti-lo. E embora Ele não aprove o pecado, ainda assim, Ele aprova esse ato de Sua vontade pelo qual Ele o permite. Embora Deus odiou o pecado, como sendo contra a Sua santidade, ainda assim Ele não odiou a permissão do pecado, como sendo subserviente à imensidão da Sua sabedoria para a Sua própria glória.37

 

 

5. O Deus mui sábio, justo e gracioso, frequentemente deixa, por algum tempo, Seus próprios filhos em diversas tentações e na corrupção dos seus próprios corações, para castigá-los pelos seus pecados anteriores ou fazer-lhes conhecer o poder oculto da corrupção e engano de seus corações, para que eles sejam humilhados; e para elevá-los a uma dependência mais íntima e constante de Seu próprio auxílio, e para torná-los mais vigilantes contra todas as futuras ocasiões de pecado, e para outros santos e justos fins15. De forma que seja o que for que ocorra com todos os Seus eleitos é por Sua designação, para a Sua glória e para o bem deles.16 (15 2 Crônicas 32:25, 26, 31; 2 Coríntios 12:7-9 • 16 Romanos 8:28).

 

Como o último parágrafo falou da providência de Deus sobre as ações pecaminosas de anjos e homens, aqui, vemos a providência de Deus sobre as ações pecaminosas de Seus filhos. Neste ponto, vemos que Deus usa tentação de antigos pecados para os Seus santos fins, e para o bem de Seu povo. Eu acho que parte da implicação é que se a boa providência de Deus usa até mesmo os pecados anteriores para o nosso bem, certamente Ele usará todo o restante para o nosso bem.

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A Confissão afirma: O Deus mui sábio, justo e gracioso, frequentemente deixa, por algum tempo, Seus próprios filhos em diversas tentações e na corrupção dos seus próprios corações, para castigá-los pelos seus pecados anteriores. Deus nesta providência sobre o pecado de Seu povo é mui sábio, mui justo e mui gracioso. Ele não deixa os Seus filhos à tentação e à mercê de sua corrupção sem a Sua sabedoria; Ele não os deixa de tal forma que Deus esteja tentando-os; e embora Ele possa fazer isso é mui gracioso, pois é a forma como Ele lida com os Seus próprios: com sabedoria, justiça e graça. Isso será apenas por algum tempo. É importante lembrar-se, quando em tal momento, que este não é para sempre. Essas tentações podem ser diversas, ou seja, variadas e talvez muitas. Com esses três atributos de Deus em mente (i.e., sabedoria, justiça e graça), a Confissão indica que Ele os deixa em múltiplas tentações para castigá-los, ou seja, para discipliná-los. Vemos nas Escrituras que a disciplina de Deus vem “para não sermos condenados com o mundo” (1 Coríntios 11:32). Assim, Deus nos disciplina para que depois produza “um fruto pacífico de justiça nos exercitados por ela” (Hebreus 12:11). Isso não é um castigo, por si só; Ele tem um propósito de exercício para o bem de Seus filhos.

 

Qual é a fonte dessa tentação e corrupção? É o pecado anterior deles. Deus castiga-os por seus pecados anteriores. A natureza corruptora do pecado é tal que, mesmo quando uma pessoa é convertida, eles ainda lutam contra o pecado. Eles vão lutar contra o pecado em um sentido geral, mas particular e especificamente eles podem lutar com antigos pecados pelos quais foram uma vez escravizados. Esta é uma razão importante tanto para jovens e adultos evitarem o pecado, pois, as sementes semeadas em tempos passados podem procurar crescimento novamente e retomar a terra em tempos posteriores, mesmo nos crentes. É verdade que em Cristo somos novas criaturas, não mais escravos do pecado, mas ainda há corrupção remanescente que pode buscar nos escravizar. Deus pode castigar pelo pecado anterior, mas isso ocorrerá com o propósito de santificação, não com o propósito do juízo eterno. Enquanto há um alerta aqui, há também um tremendo incentivo para aqueles que lutam contra o pecado. Deus está trabalhando naqueles que são Seus próprios para santificá-los. Olhem para os fins específicos do castigo na Confissão: 1) fazer-lhes conhecer o poder oculto da corrupção e engano de seus corações, para que eles sejam humilhados e 2) para elevá-los a uma dependência mais íntima e constante de Seu próprio auxílio; e 3) para torná-los mais vigilantes contra todas as futuras ocasiões de pecado, e 4) para outros santos e justos fins.

 

Primeiro, Deus os castiga para fazer-lhes conhecer o poder oculto da corrupção e engano de seus corações, para que eles sejam humilhados. Podemos nos tornar orgulhosos e achar que temos crescido além do ponto da tentação dos pecados antigos; como diz Escrituras: “Aquele, pois, que cuida estar em pé, olhe não caia” (1 Coríntios 10:12). Nossos corações ainda têm dentro deles corrupção e engano escondidos. Mesmo tendo em consideração os nossos corações regenerados, ainda assim, o nosso coração permanece desesperadamente corrupto; quem o conhecerá (Jeremias 17:9)? Quando descobrimos corrupção e dolo ocultos (i.e., desconhecidos para nós) somos muito humilhados. Podemos ter caminhado com o Senhor por trinta anos e, de repente, a corrupção oculta é descoberta; se tivermos nos tornado orgulhosos, ao invés de introspectivos, isso pode ser especialmente surpreendente e humilhante.

 

A segunda razão pela qual Deus castigará é para elevá-los a uma dependência mais íntima e constante de Seu próprio auxílio. Quando múltiplas tentações e desejos pelo pecado veem em nossa direção, só temos um lugar para fugir e este é para o Senhor; corremos para Ele e isso nos leva para mais perto dEle, e nos faz depender dEle em tais momentos. Reconhecemos que só podemos suportar a tentação, se estivermos constantemente dependendo dEle para o nosso auxílio (força). Pode ser que nos tornamos negligentes com o nosso tempo na Palavra e relaxamos quanto ao tempo que passamos em oração. Quando a tentação vem, qualquer negligência nos lembra que precisamos daquela proximidade constantemente. Tal temporada da tentação é a hora de nos aproximarmos de Deus e aumentarmos a dependência dEle. Muitas vezes, em tais momentos, nos sentimos mais longe de Deus, e esse sentimento de alienação pode nos levar para longe do Senhor; que é o que o acusador dos irmãos desejaria, mas o plano de Deus é que nos aproximemos e permaneçamos constantes nisso. Idealmente essas estações são apenas momentos de tentação resistida. Se nós cairmos em tentação, o que não é uma questão sem importância, devemos lembrar daquela esperança do Evangelho, bem como o comando para caminharmos de um modo que seja digno de nossa vocação. O apóstolo João disse: “Meus filhinhos, estas coisas vos escrevo, para que não pequeis; e, se alguém pecar, temos um Advogado para com o Pai, Jesus Cristo, o justo” (1 João 2:1).

 

Em terceiro lugar, Deus castiga para torná-los mais vigilantes contra todas as futuras ocasiões de pecado. Precisamos aprender com as coisas que podem ter desencadeado temporadas de tentação e pecado; caso contrário, vamos nos encontrar novamente caindo pelas mesmas razões. A Confissão nos exorta a estar atentos que tal tentação e pecado não volte a acontecer. A pessoa que luta com a embriaguez deve evitar as coisas que provocam tais tentações. Aqueles que lutam contra a cobiça devem se tornar vigilantes em relação às coisas que provocam desejo carnal e evitá-las. O Cristão deve temer a tentação, e assim fugir dela. Alguém que foi, repetidas vezes, tentado pela mesma situação e que não está buscando erradicar esta situação, é como ele tivesse mergulhando de cabeça num penhasco — conscientemente. Deus espera que exercitemos a sabedoria e sejamos mais vigilantes contra a tentação no futuro, uma vez que “cada um é tentado, quando atraído e engodado pela sua própria concupiscência” (Tiago 1:14). Por causa de nossos desejos pecaminosos, devemos vigiar nossos passos: “Pondera a vereda de teus pés, e todos os teus caminhos sejam bem ordenados!” (Provérbios 4:26). “Portanto, vede prudentemente como andais, não como néscios, mas como sábios, remindo o tempo; porquanto os dias são maus. Por isso não sejais insensatos, mas entendei qual seja a vontade do Senhor” (Efésios 5:15-17).

 

Em quarto lugar, Deus vai castigá-los para outros santos e justos fins. Isto abrange todos os outros motivos pelos quais Deus castiga, e sejam quais forem estes fins, eles são fins justos; eles são fins santos. O castigo de Deus é justo. Nós nunca somos punidos por coisas que nós não tenhamos feito. O castigo de Deus tem um fim santo. Deus não é o autor do pecado, e Ele nunca nos tenta. “Ninguém, sendo tentado, diga: De Deus sou tentado; porque Deus não pode ser tentado pelo mal, e a ninguém tenta. Mas cada um é tentado, quando atraído e engodado pela sua própria concupiscência” (Tiago 1:13-14). No final, Deus está trabalhando para o nosso bem (Romanos 8:28) e, ao mesmo tempo, somos chamados a manter nossos olhos no prêmio (Filipenses 3:14; Hebreus 12:1) e corremos de tal de forma a alcançar o prêmio (1 Coríntios 9:24-27).

 

 

6. Quanto àqueles homens perversos e ímpios, a quem Deus, como o justo Juiz, por pecados anteriores, cega e endurece17; deles, Ele não apenas retém a Sua graça, pela qual eles poderiam ser iluminados em seus entendimentos e forjados em seus cora-ções18; mas às vezes também lhes retira os dons que eles tinham19; e os expõe a situações de forma que a corrupção deles se torna em ocasiões de pecado20; e, além disso, entrega-lhes às suas próprias concupiscências, às tentações do mundo e ao poder de Satanás21; de maneira que eles se endurecem, sob aqueles meios que Deus usa para quebrantar os outros.22 (17 Romanos 1:24-26, 28, 11:7-8 • 18 Deuteronômio 29:4 • 19 Mateus 13:12 • 20 Deuteronômio 2:30; 2 Reis 8:12-13 • 21 Salmos 81:11-12; 2 Tessalonicenses 2:10-12 • 22 Êxodo 8:15, 32; Isaías 6:9-10; 1 Pedro 2:7-8).

 

O último parágrafo se concentrou sobre a providência de Deus sobre o pecado em Seus filhos, mas aqui a Confissão aborda a providência de Deus em relação ao pecado naqueles que não são Seus filhos, referidos como perversos e ímpios. Quanto aos Seus próprios filhos, vemos os atributos da sabedoria, justiça e graça de Deus em destaque, mas aqui nós vemos somente Deus como justo Juiz. A palavra justiça aqui tem relação com a justiça de Deus. Quando a Escritura diz que Deus é um justo Juiz, isso significa que Ele não é parcial ou injusto, mas um justo Juiz. Deus lida com os perversos e ímpios com equidade, de acordo com a Sua perfeita justiça. Deus castiga os eleitos pelo pecado anterior segundo a Sua justiça, mas a graça está incluída. Os perversos e ímpios são julgados por seu pecado anterior de acordo com a justiça, mas a graça e a misericórdia são excluídas. O apóstolo Paulo disse: “Que diremos pois? que há injustiça da parte de Deus? De maneira nenhuma. Pois diz a Moisés: Compadecer-me-ei de quem me compadecer, e terei misericórdia de quem eu tiver misericórdia” (Romanos 9:14-15). Deus mostra misericórdia e compaixão para com os Seus eleitos, mas a graça passa sobre os réprobos. Esta livre e distintiva escolha demonstra a gloriosa misericórdia e justiça de Deus (CFB1689 3:3). Para aqueles Deus não mostra misericórdia para que recebam a Sua justiça; os perversos e ímpios receberão algo terrível.

 

Deus, pelo pecado anterior, cega e endurece aos perversos e ímpios. Este é um correto (justo) julgamento por seu pecado anterior. O que significa cega? Isso significa dizer que alguém é incapaz de compreender a verdade espiritual. O que significa que Deus endurece? Isso significa dizer que o coração espiritual não é flexível, sensível ou inclinado em direção a Deus, à Sua lei ou ao Evangelho. É ter um coração de pedra, que é duro, em vez de um coração de carne que é quebrantado. Ser cegado e endurecido por Deus é uma coisa muito terrível. Nós vemos várias passagens que falam sobre a cegueira e endurecimento por Deus — algumas foram abordadas no Capítulo 3. Em Romanos 1, Paulo fala sobre como a rejeição de Deus por parte de homens e mulheres levou Deus a entregar-lhes à vaidade e obscurecimento de mente (Romanos 1:24-28). Vemos também que Deus diz explicitamente que Ele cegará e endurecerá as pessoas. “…Eu lhe [de Faraó] endurecerei o coração, para que não deixe ir o povo” (Êxodo 4:21). Ou: “Porém não vos tem dado o Senhor um coração para entender, nem olhos para ver, nem ouvidos para ouvir, até ao dia de hoje” (Deuteronômio 29:4). E, “Pois quê? O que Israel buscava não o alcançou; mas os eleitos o alcançaram, e os outros foram endurecidos. Como está escrito: Deus lhes deu espírito de profundo sono, olhos para não verem, e ouvidos para não ouvirem, até ao dia de hoje. E Davi diz: Torne-se-lhes a sua mesa em laço, e em armadilha, e em tropeço, por sua retribuição; escureçam-se-lhes os olhos para não verem, e encurvem-se-lhes continuamente as costas” (Romanos 11:7-10). Que Deus faz isso é incontestável; como Ele faz isso é importante compreender, pois Deus não é o autor do mal (veja a CFB1689 3:3).

 

A Confissão explica quatro maneiras pelas quais Deus cega e endurece. Observe o oposto paralelo no parágrafo 5, relativo ao pecado no povo de Deus. Consideraremos um de cada vez. Em primeiro lugar, deles, Ele não apenas retém a Sua graça, pela qual eles poderiam ser iluminados em seus entendimentos e forjados em seus corações. Nós lembramos a partir do Comentário do Capítulo 3 que Deus não cria ativamente o mal em um coração, a fim de cegar ou endurecer, antes, Ele faz isso passivamente removendo a graça comum que restringe o pecado, e sem a qual eles livremente (de sua própria livre-agência não-regenerada) tornam-se cegos e endurecidos pelo seu próprio pecado. Sproul expressa: “Não é que Deus coloque Sua mão sobre eles [os réprobos] para criar diretamente o mal em seus corações; Ele simplesmente remove a Sua santa mão de contenção deles e deixa-os fazer sua própria vontade”.38 A maldade e impiedade que disso resulta, é a partir da criatura somente. Deus não considera culpabilidade por uma mera questão técnica. Não, os pecadores amam genuinamente o mal e o perseguem livremente; é somente pela contenção ativa de Deus — por meio da graça comum — que eles não pecam mais. Deus continua sendo justíssimo se Ele opta por remover essa graça comum; eles não mereciam essa graça, em primeiro lugar, e uma vez que eles não usaram essa graça para arrepender-se (Romanos 2:4), então, Deus é perfeitamente justo ao removê-la e entregá-los ao pecado.

 

Aqui a Confissão parece apenas estar falando de “graça” em termos gerais, mas especificamente do endurecimento e cegueira ser um resultado da remoção da graça comum em conjunto com a busca do pecador pelo pecado; é a graça especial que teria iluminado a compreensão deles, e operado positivamente em seus corações trazendo-os ao arrependimento e à fé. Esta graça especial será discutida no Capítulo 10, Sobre o Chamado Eficaz. Esta graça seria forjada em seus corações. Em outras palavras, ela teria aberto os olhos e quebrantado o coração deles. Somos lembrados aqui que, se Deus não intervém por Sua graça para iniciar a salvação, nenhum pecador jamais se arrependeria e viria a Cristo (João 6:44). Deus dá gratuitamente esta graça ou a retém. Ele a concederá aos Seus eleitos no seu tempo, mas nunca a dará ao réprobo sobre quem Ele passa (CFB1689 3:3).

 

A segunda maneira pela qual Deus cega e endurece os perversos e ímpios pelo pecado anterior é que, às vezes também lhes retira os dons que eles tinham. A Escritura declara: “Porque àquele que tem, se dará, e terá em abundância; mas àquele que não tem, até aquilo que tem lhe será tirado. Por isso lhes falo por parábolas; porque eles, vendo, não veem; e, ouvindo, não ouvem nem compreendem” (Mateus 13:12-13). Jesus indica aqui que aqueles a quem Ele dá a Sua graça especial receberão uma abundância de graças. Mas, aqueles a quem Deus não estende a Sua graça especial, Deus, às vezes, remove até mesmo as graças comuns que eles tinham. As graças comuns dadas a eles — para que se arrependam — são justamente removidas porque eles não se arrependeram. A Confissão prefacia isso dizendo: às vezes, o que significa que Deus nem sempre remove esses dons da graça comum. Deus faz isso ou não o faz de acordo com os Seus próprios propósitos.

 

Em terceiro lugar, Deus cega e endurece ao expô-los a situações de forma que a corrupção deles se torna em ocasiões de pecado; e, além disso, entrega-lhes às suas próprias concupiscências. Isso parece difícil no começo porque pode parecer que Deus está tentando-os, expondo-os a situações que levam ao pecado. Precisamos reconhecer que a graça comum de Deus, muitas vezes serve ao propósito de restringir as pessoas de serem tão más quanto elas podem ser. A doutrina da depravação total não ensina que cada pecador é tão mau como poderia ser; antes, que o pecado invadiu cada parte do seu ser. A Divina graça restritiva comum é uma graça; não é merecida. Assim, se Deus remove esta graça imerecida, Ele é perfeitamente justo ao fazê-lo. E assim, por Deus não expô-los a coisas que levam ao pecado Ele está concedendo a graça comum, e assim por retê-la Ele permanece justo. Quando Deus retém Sua graça restritiva isso pode significar que os perversos e ímpios não mais serão protegidos, e, portanto, eles ficam expostos a coisas das quais a sua natureza pecaminosa tirará proveito. Lembre-se, isso é por pecados anteriores; assim é, em parte, um juízo. Somos lembrados a partir do parágrafo 5 que, quando Deus “deixa, por algum tempo, Seus próprios filhos em diversas tentações e na corrupção dos seus próprios corações”, Ele o faz em última instância, para o bem deles, mas aqui, esse objetivo não existe, mas somente julgamento adicional.

 

Deus, por pecados anteriores, entregará os perversos e ímpios a um sentimento reprovado (Romanos 1:28). Mas o que nós não queremos esquecer é que a corrupção deles se torna em ocasiões de pecado. Não é Deus que implanta a corrupção no coração do pecador levando-os a pecar; eles fazem isso livre e abundantemente a partir de sua própria vontade. Eles veem a ocasião (i.e., a oportunidade) para o pecado e precipitam-se nele. Como resultado, Deus, além disso, entrega-lhes às suas próprias concupiscências, às tentações do mundo. Deus havia graciosamente lhes repreendido, mas agora remove a restrição. Isto lembra-nos o que está escrito: “Mas cada um é tentado, quando atraído e engodado pela sua própria concupiscência” (Tiago 1:14). “Mas o meu povo não quis ouvir a minha voz, e Israel não me quis. Portanto eu os entreguei aos desejos dos seus corações, e andaram nos seus próprios conselhos” (Salmos 81:11-12). “E por isso Deus lhes enviará a operação do erro, para que creiam a mentira; para que sejam julgados todos os que não creram a verdade, antes tiveram prazer na iniquidade” (2 Tessalonicenses 2:11-12). Aqui há um sério alerta que o pecado, e uma falta de arrependimento pelo mesmo, vem com um preço pesado. Poderíamos dizer que o pecado cria ocasião para mais pecado, e um pecado leva a outro, a não ser que o poder redentor de Deus, por meio do Evangelho de Cristo, intervenha para regenerar e santificar.

 

Em quarto lugar, Deus também entrega-os… ao poder de Satanás. Este é talvez o julgamento mais preocupante pelos pecados anteriores. Nas Escrituras, vemos esta passagem: “E entre esses foram Himeneu e Alexandre, os quais entreguei a Satanás, para que aprendam a não blasfemar” (1 Timóteo 1:20). Este é um julgamento mais severo. Sem dúvida, a Confissão está ecoando, em parte, Efésios 2:2-3: “Em que noutro tempo andastes segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe das potestades do ar, do espírito que agora opera nos filhos da desobediência; entre os quais todos nós também antes andávamos nos desejos da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos; e éramos por natureza filhos da ira, como os outros também”.

 

A Confissão afirma: de maneira que eles se endurecem, sob aqueles meios que Deus usa para quebrantar os outros. Como diz o ditado: “o mesmo sol que derrete a cera endurece o barro”. O meio que Deus usa para quebrantar os Seus, endurece os perversos e ímpios. O parágrafo 5 declarou: “Deus… frequentemente deixa, por algum tempo, Seus próprios filhos em diversas tentações e na corrupção dos seus próprios corações, para castigá-los pelos seus pecados anteriores”. Ali, o resultado é para o bem deles, mas aqui no parágrafo 6, o castigo pelos pecados anteriores não é para o bem dos perversos e ímpios.

 

 

7. Assim como a providência de Deus, em geral, atinge todas as criaturas, assim também, de uma forma mui especial, Ele cuida de Sua Igreja, e dispõe de todas as coisas para o bem dela.23 (23 1 Timóteo 4:10; Amós 9:8-9; Isaías 43:3-5).

 

A Confissão já pontuou que a Providência se estende a todas as criaturas, mas uma questão adicional é tratada aqui. A providência atinge todas as criaturas, mas ela é aplicada de uma maneira especial à Igreja. Como esta providência especial mostrar-se para a igreja? Assegurando que a disposição, ou seja, o cumprimento de todas as coisas é para o bem da Igreja. Deus cuida de Sua igreja de uma maneira especial! Isto aplica-se a toda a Igreja e cada membro da Igreja. Romanos 8:28 diz: “E sabemos que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito”. O termo, todas as coisas, na Confissão ecoa de “todas as coisas” em Romanos 8:28. Além disso, vemos outras passagens importantes: “Porque para isto trabalhamos e somos injuriados, pois esperamos no Deus vivo, que é o Salvador de todos os homens, principalmente dos fiéis” (1 Timóteo 4:10). E: “Porque eu sou o Senhor teu Deus, o Santo de Israel, o teu Salvador; dei o Egito por teu resgate, a Etiópia e a Seba em teu lugar. 4 Visto que foste precioso aos meus olhos, também foste honrado, e eu te amei, assim dei os homens por ti, e os povos pela tua vida. 5 Não temas, pois, porque estou contigo; trarei a tua descendência desde o oriente, e te ajuntarei desde o ocidente” (Isaías 43:3-5).

 

Thomas Watson maravilhosamente disse: “Veja aqui, aquilo que pode fazer-nos anelar pelo tempo quando o grande mistério da providência de Deus será plenamente desvelado para nós. Agora nós escassamente sabemos o que faz a providência de Deus, e estamos prontos a censurar o que não entendemos; mas no Céu, veremos como todas as Suas providências (doença, perdas, sofrimento) contribuíram para a nossa salvação. Aqui vemos apenas algumas partes obscuras da providência de Deus, e é impossível julgar as Suas obras pelas partes; mas quando chegarmos ao Céu, e veremos o todo e retrato de Sua providência expresso em suas cores vivas, será glorioso contemplá-lo. Então, veremos como todas as providências de Deus cooperaram para cumprir as Suas promessas. Não há nenhuma providência, senão aquelas nas quais identificamos um milagre ou uma misericórdia nela”39. E Thomas Boston disse: “Deus tem propósitos retos para providências tortas”40. Desde que de uma maneira especial “Deus, o bom Criador de todas as coisas, em Seu infinito poder e sabedoria, sustenta, dirige, dispõe e governa”41 a igreja; ela é, então, a mais bendita insti-tuição e família a pertencer.

 

Caminhamos através de um outro Capítulo longo, mas a riqueza que adquirimos nos ajudará muito em nossa peregrinação Cristã, dando-nos grande conforto e confiança em nosso Deus. Este Capítulo tem nos mostrado o agir de Deus neste mundo, na igreja e em nossas próprias vidas. Não tratamos de toda a questão, mas lidamos com o aspecto mais difícil da providência em relação ao pecado. O que aprendemos sobre a providência de Deus — como ela se estende até mesmo à Queda e a todas as ações pecaminosas de criaturas com livre-agência — será especialmente importante enquanto nos dirigimos para o próximo Capítulo que lida com a Queda da humanidade. A Confissão constrói preceito sobre preceito, e assim tudo o que aprendemos até agora é necessário para compreender os próximos Capítulos. Eu penso ser adequado terminarmos este Capítulo com um precioso hino sobre a Providência.

 

Deus age de maneira misteriosa

Para Suas maravilhas realizar;

Ele planta Seus passos no mar,

E cavalga sobre a tempestade.

 

Como profundas minas insondáveis

Sua habilidade nunca falha,

Ele realiza os Seus desígnios brilhantes

E opera a Sua vontade soberana.

 

Vós santos temerosos, recebam coragem e vigor,

As nuvens que tanto temeis

Estão cheias de misericórdia, e se romperão

Em bênçãos sobre as suas cabeças.

 

Não julgue o Senhor com débil entendimento,

Mas confie nEle por Sua graça;

Por trás de uma providência carrancuda

Ele esconde um sorriso na face.

 

Seu propósito amadurecerá rapidamente,

Desdobrando a cada hora;

O broto pode ter um amargor,

Mas doce será a flor.

 

A incredulidade cega certamente errará,

Ela vê a obra Divina em vão:

Deus é o seu próprio intérprete,

E Ele irá torná-la clara. Amém!42

 

[William Cowper]

 

 


* Para ler o Primeiro Capitulo e a Introdução deste Comentário acesse oEstandarteDeCristo.com.

[1] Edward D. Morris, Theology of The Westminster Symbols: A Commentary Historical, Doctrinal, Practical [Teologia dos Símbolos de Westminster: Um Comentário Histórico, Doutrinal, Prático] (Columbus, Oh.: The Champlin Press, 1900), 216.

[2] João Calvino, Institutes of the Christian Religion [Institutas da Religião Cristã], The Library of Christian Classics, vol. XX (Louisville, Ky.: John Knox Press, 1960) Livro II, Cap. II, Seção 16, 201-202.

[3] A.A. Hodge, The Westminster Confession: A Commentary [A Confissão de Westminster: Um Comentário] (1869; reimpresso, Carlisle, Pa.: Banner of Truth Trust, 2002), 91. Semelhantemente Hodge afirma: “Uma vez que o propósito eterno e imutável de Deus tem certamente predeterminado tudo o que acontece, segue-se que Ele executará o Seu próprio propósito não somente nas obras da criação, mas da mesma forma em Seu controle contínuo de todas as Suas criaturas e todas as suas ações”. Veja A. A. Hodge, A Confissão de Westminster: Um Comentário (1869; reimpresso, Carlisle, Pa.: Banner of Truth Trust, 2002), 91.

[4] Thomas Watson, A Body of Divinity [Um Corpo de Teologia] (1692, reimpresso, Edimburgo, The Banner of Truth Trust, 1997), 119.

[5] Em Isaías 46:9-11, vemos uma clara ligação com a emissão de um decreto e a execução do mesmo. Citarei apenas o versículo 11b: “porque assim o disse, e assim o farei vir; eu o formei, e também o farei”. Os decretos são emitidos, e providência os executa. A profecia ilustra ainda mais a conexão decreto-providência à medida que a profecia prediz o decreto antes que a providência o execute: “Proclamarei o decreto: o Senhor me disse: Tu és meu Filho, eu hoje te gerei” (Salmos 2:7).

[6] Efésios 1:11 parece ser uma alusão ou eco de Isaías 46:9-11.

[7] A.A. Hodge, A Confissão de Westminster: Um Comentário (1869; reimpresso, Carlisle, Pa.: Banner of Truth Trust, 2002), pg. 95.

[8] Ezequiel Hopkins, An Exposition on the Lord’s Prayer…[and] Sermons on Providence, and the Excellent Advantages of Reading and Studying Holy Scriptures [Uma Exposição Sobre a Oração do Senhor… [e] Sermões Sobre a Providencia, e as Excelentes Vantagens de Ler e Estudar as Sagradas Escrituras] (London: para Nathanael Ranew, 1692), 267 como citado a partir de Joel R. Beeke e Mark Jones, Puritan Theology [Teologia Puritana], Edição Kindle (Grand Rapids: Reformation Heritage Books, 2012), Loc. 6559.

[9] O artigo definido “o” parece fora de lugar aqui, pelo menos de acordo com o uso do Inglês moderno. Eu observo que toda a seção “para o fim para o qual foram criados” não está presente na Confissão de Westminster nem na Declaração de Savoy. Os autores da Confissão de 1689 adicionaram este a partir da Primeira Confissão de Londres de 1646, mas, curiosamente, o artigo definido está ausente ali. Presumivelmente, havia um propósito para os autores 1689 adicionarem o artigo definido. Minha fonte de texto crítico para a Confissão é True Confessions [Verdadeiras Confissões] de James Renihan. Eu também verifiquei outras três fontes impressas que tenho, e todas elas têm o artigo definido presente. Curiosamente, eu verifiquei a minha edição impressa do The Charleston Confession [A Confissão de Charleston] (uma versão da Confissão de 1689 usada no sul dos Estados Unidos), e o artigo definido está ausente. Por fim, eu presumo que o uso era apropriado trezentos anos atrás, e eu não estou preparado para dizer que isso importe doutrinariamente. Mas é importante para, pelo menos, investigar essas questões, tanto quanto somos capazes, por vezes, desde que o significado doutrinal pode mudar pelo uso de apenas uma palavra-chave.

[10] A. A. Hodge, A Confissão de Westminster: Um Comentário (1869; reimpresso, Carlisle, Pa.: Banner of Truth Trust, 2002), 95.

[11] Também poderia ser argumentado que “causa primeira” refere-se à frase anterior, que inclui “presciência”. Vamos lembrar a partir do Capítulo 3, que presciência significa, essencialmente, predestinação na Escritura (veja Atos 2:23). Para simplificar, vou referir-me à “causa primeira”, como o decreto de Deus, ao invés de tratar presciência e decreto de Deus como termos distintos separados.

[12] Possibilidade tem um nome relacionado, “Destino”. Sobre o Destino, Calvino diz: “Ainda que não estamos dispostos a brigar por palavras, ainda assim, não admitimos a palavra “destino”, tanto porque é uma das palavras cuja profana inovação Paulo nos ensina a evitar [1 Timóteo 6:20], e porque os homens tentam pelo ódio que isso incorre, oprimir a verdade de Deus”. João Calvino, Institutas da Religião Cristã, The Library of Christian Classics, vol. XX (Louisville, Ky.: John Knox Press, 1960) Livro I, Cap. XVI, Seção 8, 207. Calvino também diz: “E então? Você pergunta, será que nada acontece por acaso, nada por contingência? Eu respondo: Basílio, o Grande em verdade disse que “fortuna” e “chance” são termos pagãos, com cujo significado as mentes dos piedosos não deveriam ser ocupadas”. Basil, Homilias Nos Salmos, Sl. 32:4 (MPG 29. 329 f.). Citado por João Calvino, Institutas da Religião Cristã, The Library of Christian Classics, vol. XX (Louisville, Ky.: John Knox Press, 1960) Livro I, Cap. XVI, Seção 8, 207.

[13] Eu não quero dizer que o crente nunca deve usar tais palavras, mas que tais palavras podem comunicar conceitos antibíblicos. Calvino menciona a tristeza de Agostinho quando este usou a palavra “sorte” em, Against Academics [Contra Acadêmicos] — mesmo que o uso de Agostinho tenha sido adequado. Veja João Calvino, Institutas da Religião Cristã, The Library of Christian Classics, vol. XX (Louisville, Ky.: John Knox Press, 1960) Livro I, Cap. XVI, Seção 8, 207.

[14] Edward D. Morris, Teologia dos Símbolos de Westminster: Um Comentário Histórico, Doutrinal, Prático (Columbus, Oh.: The Champlin Press, 1900), 191.

[15] A. A. Hodge, A Confissão de Westminster: Um Comentário (1869; reimpresso, Carlisle, Pa.: Banner of Truth Trust, 2002), 95.

[16] Edward D. Morris, Teologia dos Símbolos de Westminster: Um Comentário Histórico, Doutrinal, Prático (Columbus, Oh.: The Champlin Press, 1900), 221.

[17] Robert Shaw, The Reformed Faith: An Exposition of the Westminster Confession of Faith [A Fé Reformada: Uma Exposição da Confissão de Fé de Westminster] (1845; http://www.reformed.org/documents/shaw/), capítulo 5.

[18] Edward D. Morris, Teologia dos Símbolos de Westminster: Um Comentário Histórico, Doutrinal, Prático (Columbus, Oh.: The Champlin Press, 1900), 191.

[19] Calvino declara: “Assim, quando lemos que pela oração de Josué o sol se deteve em um grau por dois dias [Josué10:13], e que a sua sombra voltou dez graus por causa do rei Ezequias [2 Reis 20:11 ou Isaías 38:8], Deus testemunhou por aqueles poucos milagres que o sol não nasce diariamente e se põe por um instinto cego da natureza, mas que Ele mesmo — para renovar a nossa lembrança de Seu favor paternal em relação a nós — governa o seu curso. Nada é mais natural do que a primavera vir logo após o inverno; o verão seguir a primavera; e o outono, o verão, cada um a seu tempo. Ainda assim, nesta sequência se vê tal diversidade grandiosa e desigual que prontamente aparece que cada ano, mês e dia é regido por uma nova e especial providência de Deus”. João Calvino, Institutas da Religião Cristã, The Library of Christian Classics, vol. XX (Louisville, Ky.: John Knox Press, 1960) Livro I, Cap. XVI, Seção 2, 199.

[20] Ames, Marrow [Medula (da Teologia)], 1.9.10. Sedgwick, Providence Handled Practically [Lidando com a Providência de Maneira Praticamente], 11. Citado a partir de Joel R. Beeke e Mark Jones, Teologia Puritana, Edição Kindle (Grand Rapids: Reformation Heritage Books, 2012), Loc. 6556.

[21] Robert Shaw, A Fé Reformada: Uma Exposição da Confissão de Fé de Westminster (1845; http://www.reformed.org/documents/shaw/), Capítulo 5.

[22] Edward D. Morris, Teologia dos Símbolos de Westminster: Um Comentário Histórico, Doutrinal, Prático (Columbus, Oh.: The Champlin Press, 1900), 191. Os itálicos são originais. Os algarismos romanos referem-se aos capítulos e parágrafos da Confissão de Westminster.

[23] John Owen, A Display of Arminianism [Uma Demonstração do Arminianismo], em Obras, 10:36 como citado a partir de Joel R. Beeke e Mark Jones, Teologia Puritana, Edição Kindle (Grand Rapids: Reformation Heritage Books, 2012), Loc. 6637.

[24] A palavra “contingente” é usada no Capítulo 2, parágrafo 2, para mostrar que Deus não é dependente de qualquer coisa para cumprir o Seu propósito. No capítulo 3, parágrafo 1, a Confissão afirma: “Deus decretou em Si mesmo, desde toda a eternidade, pelo mui sábio e santo conselho de Sua própria vontade, livre e imutavelmente todas as coisas, seja o que for que venha a acontecer; ainda assim, de modo que nem Deus é o autor do pecado, nem tem comunhão com algo nisso; nem é violentada a vontade da criatura, nem ainda é eliminada a liberdade ou contingência das causas secundárias, antes estabelecidas”. Em ambos os lugares, ela está relacionada com o decreto de Deus, e em um a causas secundárias. Ambas as passagens relacionam-se com coisas que são dependentes de outra, a fim de acontecer.

[25] Robert Shaw, A Fé Reformada: Uma Exposição da Confissão de Fé de Westminster (1845; http://www.reformed.org/documents/shaw/), Capítulo 5.

[26] Edward D. Morris, Teologia dos Símbolos de Westminster: Um Comentário Histórico, Doutrinal, Prático (Columbus, Oh.: The Champlin Press, 1900), 221.

[27] Edward D. Morris, Teologia dos Símbolos de Westminster: Um Comentário Histórico, Doutrinal, Prático (Columbus, Oh.: The Champlin Press, 1900), 191-192.

[28] Edward D. Morris, Teologia dos Símbolos de Westminster: Um Comentário Histórico, Doutrinal, Prático (Columbus, Oh.: The Champlin Press, 1900), 221.

[29] A. A. Hodge, A Confissão de Westminster: Um Comentário (1869; reimpresso, Carlisle, Pa.: Banner of Truth Trust, 2002), 98.

[30] A. A. Hodge, A Confissão de Westminster: Um Comentário (1869; reimpresso, Carlisle, Pa.: Banner of Truth Trust, 2002), 98.

[31] Estes exemplos bíblicos eu credito a Samuel E. Waldron, 1689 Baptist Confession of Faith: A Modern Exposition [A Confissão de Fé Batista de 1689: Uma Exposição Moderna], 3ª ed. (Webster, Ny.: Evangelical Press, 1999), 91.

[32] A. A. Hodge, A Confissão de Westminster: Um Comentário (1869; reimpresso, Carlisle, Pa.: Banner of Truth Trust, 2002), 100.

[33] R.C. Sproul, Truths We Confess: A Layman’s Guide to the Westminster Confession of Faith [Verdades Que Nós Confessamos: Guia De Um Leigo para a Confissão de Fé de Westminster], vol. I, The Triune God [O Deus Triuno] (Phillipsburg, Nj.: P&R Publishing, 2006), 157.

[34] Thomas Watson, Um Corpo de Teologia (1692, reimpresso, Edimburgo, The Banner of Truth Trust, 1997), 122.

[35] Paul Helm, The Providence of God, Contours of Christian Theology [A Providência de Deus, Contornos de Teologia Cristã] (Downers Grove, Il.: InterVarsity, 1993), 67. Citado a partir de Gregg R. Allison, Historical Theology: An Introduction to Christian Doctrine [História Teológica: Uma Introdução à Doutrina Cristã] (Grand Rapids: Zondervan, 2011), 295.

[36] Veja o Comentário da Confissão de 1689, Capítulo 4, parágrafo 2, para saber mais sobre argumento do bem maior.

[37] Stephen Charnock, The Existence and Attributes of God [A Existência e Atributos de Deus], vol. II (1853; reprint, Grand Rapids: Baker Book House, 1986), 147-149. Parênteses meus.

[38] R. C. Sproul, Verdades Que Nós Confessamos: Guia De Um Leigo para a Confissão de Fé de Westminster, vol. I, O Deus Triuno (Phillipsburg, Nj.: P&R Publishing, 2006), 145.

[39] Thomas Watson, Um Corpo de Teologia (1692, reimpresso, Edimburgo, The Banner of Truth Trust, 1997), 127.

[40] Thomas Boston, The Crook in Lot [A Tortuosidade na Porção], em Obras, 3:511-16. Citado em Beeke e Jones, Teologia Puritana (Reformation Heritage Books, 2012), Providence, Kindle, localização 7136.

[41] Confissão de 1689, Capítulo 5, parágrafo 1.

[42] Trinity Hymnal [Hinário Trinitariano] (Philadelphia: Great Commissions Publishing, 1961), hino 21. “Deus Se Move de Uma Forma Misteriosa”.